CAPÍTULO 4

Desde que me separei, minha filha tem conseguido dificultar ainda mais a minha vida. É como se ela me culpasse pela separação. Em algum momento, eu perdi a sincronia com ela; e nós não conseguimos mais nos entender. Às vezes, eu só gostaria que ela se parecesse mais comigo. Pelo menos, na personalidade. Nem que fosse um pouquinho. Assim, eu conseguiria lidar melhor com ela. Mas ela é tudo o que eu nunca fui: destemida, decidida, teimosa, linda e muito rebelde.

— O que foi agora? — pergunto, já impaciente. Respiro fundo e espero ela falar. Ter que sair agora do trabalho, depois de ter chegado atrasada, não fica bem para minha imagem.

Se bem que seria de bom grado ter que ficar longe de um certo curioso ao meu lado, que percebo estar prestando atenção em mim enquanto falo com a diretora da escola.

— Sua filha teve que ser levada para a enfermaria da escola, Dona Melissa. No entanto, o problema dela não poderá ser tratado aqui e precisamos que a senhora compareça para que possamos...

— O quê? Enfermaria? Estou a caminho! — Não consigo nem deixar que ela termine de falar.

Todos os sinais de pânico foram despertados em mim agora. Uma remota lembrança de algo parecido com isso me afeta. Há uns seis meses atrás, Sophia, em uma de suas crises de adolescente rebelde, cortou a si mesma com um estilete. Para ser mais específica, constataram que foi uma tentativa de suicídio, o que não fez muito sentido por um bom tempo.  Mas as atitudes de minha filha só têm piorado a cada dia.

Devo ser uma péssima mãe. A pior das piores de todas as mães. Nunca sei como conversar com ela, que tem o terrível hábito de criticar tudo o que eu faço, assim como o pai dela. E, ultimamente, estou cogitando seriamente a ideia de deixar ela morar com o pai, o que só faz eu me sentir muito pior.

— Problemas? — Ouço a voz do infeliz ao meu lado assim que me levanto e pego minha bolsa. Ignoro a pergunta e saio andando como um trem desgovernado, sem nem ao menos avisar a Richard que estou saindo.

Não me importo se irei levar uma bronca ou advertência, só quero chegar logo na bendita escola. O que será que houve dessa vez? Por Deus, que não seja nada grave. Rezo dentro do carro enquanto dirijo feito louca pelas ruas da Califórnia.

Alguns minutos depois, consigo chegar à escola e saio correndo do carro em direção a entrada da mesma, notando que algumas pessoas olham para mim como se eu fosse uma louca.

Paro subitamente assim que entro na escola e avisto a Diretora conversando com Daniel. E ao seu lado, ninguém menos que sua mais nova noiva.

Sério isso!? Além de estar tudo péssimo, ainda preciso encarar essa mulher?

Tento manter a compostura e volto a andar em direção a diretora, que ainda não me viu. Infelizmente, a lambisgoia agarrada ao braço de Daniel é a primeira a me avistar. Logo depois, meu ex-marido e a diretora olham em minha direção também. Eu só queria sumir agora! O olhar de Daniel para minha camiseta chega a ser assediante.

Por Deus homem, você já viu muito mais do isso e ainda está com uma mulher ao seu lado.

— Diretora Margot, o que houve com a minha filha? — falo diretamente com a diretora assim que me aproximo o bastante, ignorando completamente as duas pessoas ao seu lado.

— Estávamos aguardando a senhora. Por favor, Dona Melissa e Senhor Daniel, me sigam até minha sala.

Chego a sentir um grande alívio por ela frisar meu nome e de Daniel apenas. Hoje não estou no meu normal e acho que perderia a cabeça facilmente se essa mulher tivesse que participar de algo que só diz respeito aos pais da minha filha, que no caso, sou eu e o homem que ela está agarrando como se corresse o risco de ele fugir a qualquer momento.

— Mas, e eu, amor? Vou ter que ficar esperando aqui? — A criatura ainda tem o desplante de usar uma voz nauseante. Fico tentada a revirar os olhos e viro a cara para não ver a cena.

— Sim, a senhora terá que esperar... afinal, é um assunto que só diz respeito aos pais da aluna. — A diretora da escola, minha heroína, fala de modo educado e autoritário ao mesmo tempo, sem deixar chance nenhuma para Daniel, ou qualquer outra pessoa, falar algo.

— Por favor. Dona Melissa, Senhor Daniel... — A diretora começa a andar em direção a sua sala e eu a sigo sem pestanejar. Ainda escuto o estalar do que parece ser um beijo entre Daniel e a tal mulher.

Deus, que dia!

Entramos na sala da diretora e logo ela nos pede para nos sentarmos. Não sei o que é pior, ter que esperar para saber o que houve com minha filha ou perceber o olhar de pena da tal diretora na minha direção.

— Bom, vou direto ao assunto... vocês sabiam que a filha de vocês estava grávida?

As palavras me atingem como um soco no estômago, minha respiração fica presa, e sinto como se as coisas ao meu redor começassem a girar. Só posso estar em um pesadelo. É a única explicação.

— O quê?! — Ouço a voz surpresa de Daniel.

— Eu não sabia... nem imaginava — respondo, com uma voz tão baixa que chega a ser ridícula. Grávida? Minha filha, que nem completou quinze anos ainda, está grávida?

— COMO ASSIM, GRÁVIDA?!? — Daniel praticamente grita, assustando a mim e a diretora. Sinto minha visão começar a ficar turva.

E só agora me lembro que não comi nada desde a hora que acordei.

Afinal, o meu café da manhã me deu um banho por culpa de um troglodita com visão de toupeira. Que droga! Não consigo expressar nada e nem mesmo ouvir o que Daniel e a diretora estão discutindo. Sinto a tontura piorando a cada segundo. Então, vejo o olhar preocupado de Daniel em minha direção, antes de tudo se tornar escuro e silencioso.

— Melissa!... Mel!... Acorda!

Abro os olhos e vejo o rosto de Daniel e de uma mulher com trajes de enfermeira. Estou deitada e não demoro muito a perceber que é no sofá da sala da diretora

— Você comeu alguma coisa hoje? — Daniel inquire.

— Não — respondo fracamente, tentando me levantar e Daniel me ajuda. Logo vejo que a diretora não está na sala.

— Caramba Melissa! Você quer morrer? Sabe que não pode ficar sem comer. Sua hipoglicemia...

— Eu sei bem dos meus problemas, Daniel, não enche! Não consegui comer, caso não tenha percebido, o meu dia hoje não está sendo nada fácil.

Vejo-o passar a mão nos cabelos em sinal de frustação e percebo que meu tom de voz o aborreceu. Ele faz menção de falar algo, mas para assim que vê a diretora entrando na sala.

— Dona Melissa, está melhor?

— Foi uma crise de hipoglicemia, mas agora estabilizou. Coma algo, dona Melissa, o quanto antes... Estou voltando para a enfermaria. Qualquer coisa, e só me chamar, Senhora Margot. — A enfermeira responde rapidamente, de modo educado e simpático, e sai logo em seguida, sem me dar tempo de agradecê-la.

Meus pensamentos se voltam todos para o que eu ouvi sobre minha filha. A diretora Margot fica em pé próximo a mim e percebo que perdi toda a conversa que ela deve ter tido com Daniel.

— Você disse que minha filha estava... grávida? Como assim, estava?

Ouço o suspiro de Daniel, mas olho diretamente para a diretora, que me encara de modo sério.

— Sim! Estava... ela passou mal e, assim que a levamos para a enfermaria, percebemos que se tratava de um aborto.

Respiro fundo novamente a fim de digerir o que acabei de ouvir. E eu achando que meu dia já estava difícil o bastante.

— Aborto... gravidez... que tipo de mãe eu sou para não perceber uma coisa dessas em minha própria filha? Eu nem sabia que ela andava tendo relações. — Falo mais para mim mesma do que para qualquer outra pessoa.

— Sophia é uma menina difícil, dona Melissa. Não a culpamos. Mas vamos ter que encaminhar a menina para um hospital. Eu conversei tudo o que podia com o senhor Daniel. Sua filha ficará suspensa das aulas até se recuperar do aborto, e depois, ela poderá voltar às aulas normalmente. Se quiser, é claro.

Apenas assinto, não sei o que dizer. Minha filha, grávida. Grávida! Como eu não percebi algo assim!? Que tipo de mãe eu sou? Tem como esse dia ficar pior? Eu sei que já fiz essa pergunta hoje, mas, por favor, alguém me diga que não.

— Tome isso! — Vejo a diretora me estender um copo de suco, que só agora percebi que estava em sua mão. Sem dizer nada, eu pego o mesmo e o bebo rapidamente. Logo depois, ela nos encaminha até onde minha filha está. Que, por sinal, já é dentro da ambulância, do lado de fora da enfermaria.

— Mãe! — Sophia fala com uma voz receosa. E percebo que ela andou chorando. Não sei o que dizer, então, fico calada e simplesmente me coloco ao lado dela, assim que os enfermeiros terminam de ajeitá-la dentro da ambulância.

— Vou no meu carro, encontro vocês no hospital. — Ouço Daniel dizer, antes de fecharem a porta. E não consigo esboçar qualquer reação.

O veículo começa a andar e eu ainda continuo calada. Eu e minha filha ficamos nos encarando pelo que parece ser uma eternidade, até que ela suspira e começa a falar.

— Vou ficar de castigo? — Ela pergunta, de modo irônico. Me mantenho calada. — Eu... não tive coragem de... contar para você, mãe. Me desculpa. — Finalmente, ela parece deixar seu ar de menina rebelde de lado e sua voz soa baixa e arrependida.

— Iria esconder até quando, Sophia?

— Meus planos era fazer um aborto antes da senhora desconfiar.

— O quê? — Fico horrorizada pelo que acabei de ouvir. O que eu criei aqui? Um monstro?

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Comments

Bernadete Lopes

Bernadete Lopes

Coitada da Melissa, será que ela não tem direito de ser pelo menos um pouquinho feliz? Não teve sorte com homens, e pelo andar da carruagem a filha só piora, que é a pior dor do mundo.

2023-10-22

3

Josi Gomes

Josi Gomes

ACHO QUE O THOMAS NÃO FOI PARAR AÍ POR COINCIDÊNCIA, ELE SABIA QUE A MELISSA TRABALHAVA NESSA EMPRESA, E FOI ATRÁS DELA

2023-10-07

2

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