A claridade do Sol já ultrapassava as cortinas de tecido bege do pequeno quarto do apartamento alugado de Karol. Ao seu lado, Seth ainda dormia tranquilamente depois deles terem acordado de madrugada para fazer amor mais uma vez. Ela poderia se acostumar com os dias com o soldado ao seu lado, mas ela sabia que ele jamais deixaria a farda para ficar ao lado dela.
Ela sentou na cama e observou o jovem que dormia tranquilamente. Ele parecia estar em paz ali, tão diferente de quando ela o encontrava nos corredores do quartel ou quando ele estava em suas missões. Com cuidado, ela o beijou no rosto e se levantou para iniciar o dia. Como era fim de semana, ela não tinha aulas e também havia pedido uma folga no trabalho para passar o dia com Seth até a hora de sua partida.
Após tomar mais uma ducha e de cuidar dos cabelos e da pele, ela se vestiu com uma roupa confortável e foi providenciar algo para eles comerem. O bom de trabalhar em uma cafeteria é que ela aprendeu a fazer várias coisas e com isso ela estava se virando bem sozinha. Ainda bem que ela nunca foi uma pessoa que se acomodou com o fato de ter uma família rica, e também seu pai sempre fez questão de que ela e o irmão soubessem o básico para a sobrevivência fora da riqueza.
Ela acabou rindo ao imaginar como seu irmão iria se virar se em algum momento tivesse que ser um civil:
— Gostaria de saber o motivo desse sorriso.
A voz de Seth ecoou na cozinha chamando a atenção dela:
— Pensando se meu irmão consegue viver um dia longe dos empregados. - Ela respondeu ainda sorrindo.
— Acho que sobrevive sim. Ele é um cara bem inteligente. - Ele se aproximou e a beijou no rosto. - Bom dia.
— Bom dia, já estou terminando aqui.
— Tem alguma coisa marcada para hoje?
— Não, hoje tirei o dia só para você.
— Entendo. - Seth suspirou. - Hoje eu tenho que voltar.
— Não quer voltar? - Karol perguntou curiosa enquanto colocava uma cesta com pães no balcão que ficava perto da janela da cozinha.
— Eu ponderei em não voltar, mas seu eu fizer isso eu posso te colocar em risco. Por hora eu só posso te visitar e espero que eles não tenham desconfiado de eu vir até aqui do nada.
Enquanto isso, Ritchie observava a caixa de correio vazia. Ele havia descoberto o endereço de Karol e havia enviado um telegrama para ela para saber se estava bem e se precisava de algo. Já tinha se passado alguns meses e seu pai enganava a todos dizendo haver enviado a filha para fazer um treinamento mais rigoroso para se preparar para o casamento.
Nicolas sempre o confrontava perguntando se tinha notícias para ele de Karol, e como sempre, Ritchie mentia dizendo que ela não estava tendo contato externo por enquanto. Algumas fofocas estavam rolando na sociedade, algumas diziam que Karol havia sido morta, outra que estava grávida e que até mesmo tinha fugido com algum amante. Parecia que ele estava no meio de um escândalo de uma época medieval e não em uma sociedade moderna.
Ele fechou a caixa de correio sentindo - se preocupado, talvez ele devesse ir até o local onde ela estava, mas assim acabaria chamado a atenção, por hora ele só poderia contar com os informantes que a encontraram. Desgostoso, ele saiu do prédio onde ele havia alugado um quarto para ter o endereço falso e caminhou para o estacionamento onde havia deixado o carro alugado. Assim que se aproximou, ele pode ver uma mulher encostada na lataria:
— Tenho notícias. - A mulher falou direta.
— Diga. - Ritchie destravou o carro e entrou no veículo junto da mulher.
— Ela está bem, mudou a aparência, esta estudando em uma escola pública e trabalha em um café.
— Isso me deixa mais tranquilo, mas você não viria até aqui para me contar o que me notificou por mensagem. - O loiro observou a mulher.
— Seth passou os últimos dias com ela e se eles se encontrarem novamente vão levantar suspeitas.
— Não acredito… - Ritchie passou as mãos no rosto nervoso. - Eu desconfiava, mas agora tenho certeza. Bem, vou ter que alertar aqueles dois de alguma forma.
— Posso passar a informação se quiser.
— Por favor, Perla, peça para alguém pedir para a Karol entrar em contato comigo.
— Sim senhor.
Ritchie abriu o porta-luvas do carro e pegou um envelope e entregou a Perla:
— Um pequeno adiantamento para os seus serviços, depois quero te encontrar com calma para poder fecharmos um pacote.
— Não se preocupe muito com isso, eu gosto da sua irmãzinha. - Ela sorriu e ajeitou os longos cabelos castanhos.
— Você é a única que posso contar para manter o contato com a Karol, pelo menos enquanto penso em um plano para poder anular os Wesker.
— Fique tranquilo, meu marido está de olho nela, assim como o pessoal dele. Se achar conveniente eu posso adotá - la.
— Mantê - la no submundo não seria uma ideia ruim, assim ela não se destacaria e poderia viver mais alguns anos em anonimato.
— Viu só, não é tão ruim trabalhar comigo.
— Nunca foi. - Foi a vez de Ritchie sorrir. - Agora me arranje uma boa garota para poder me fazer companhia, afinal eu não posso ter um forte argumento sem um álibi.
— Já tenho uma jovem preparada para entrar aqui assim que eu sair desse carro. Quando precisar de mim sabe onde me encontrar.
Perla abriu a porta do carona e saiu do carro. Assim como ela havia dito, uma jovem morena com cabelos chanel entrou no carro, ocupando o lugar da chefe. A jovem usava um blusão de tricô vinho e meias grossas pretas, dando um look despojado:
— Olá! - Ritchie cumprimentou.
— Olá, senhor Ritchie, meu nome é Clear e estou sob seus cuidados.
— Eu já não te vi em algum lugar? - Ele deu a partida no carro.
— Estou no terceiro período do curso de moda da mesma faculdade que o senhor frequenta.
— Por isso você me é familiar, se for uma boa menina poderá me acompanhar mais algumas vezes.
— Pode ficar tranquilo senhor Ritchie, eu preciso do valor que estão me pagando então vou me comportar bem.
Ritchie ligou o carro e saiu do estacionamento. Em minutos ele estava no estacionamento do campus da faculdade, onde desembarcou do veículo com Clear. Logo ele notou seus seguranças se aproximarem preocupados. Como ele estava com a moça ao lado, a desculpa é que ele havia saído para poder ficar com ela, o bom que Clear estava se comportando muito bem, como se realmente estivesse tendo algo entre eles.
Mais tarde daquele dia ele teve uma reunião com o pai, que ainda estava nervoso querendo notícias da própria filha. O homem mais velho andava de um lado a outro do escritório:
— Me pergunto porque a sua irmã tinha de ser tão rebelde. Eu dei tudo para aquela garota, por que ela fugiu?
— Pai, por acaso você se esqueceu que praticamente vendeu a sua filha para seus concorrentes? - Ritchie respondeu com desdém.
— Eu não vendi, só estou pensando no futuro de vocês dois. E não pense que você como herdeiro direto também não vai ter que se casar com alguém com status.
— Melhor não se preocupar com isso, temos que dar conta de encontrar a Karol. Mas vai ser difícil se não divulgarmos o sumiço dela.
— Não podemos. Se os Wesker descobrirem que ela desapareceu, o nosso acordo já era.
— Um acordo comercial é mais importante que a vida da minha irmã?
— Ela é uma mulher, que outro valor teria?
Ouvir aquilo irritou Ritchie profundamente. O preconceito do seu pai contra mulheres e homossexuais o irritava:
— Ela é uma mulher, mas é sua filha! Ela não é apenas uma moeda de troca e objeto de desejo de qualquer homem.
— É a minha filha e tem que me servir! - O senhor Seifer gritou com o filho. - Assim como você tem que se colocar em seu lugar, seu moleque insolente!
De repente, o chefe da segurança entrou na sala apressado:
— Senhor Seifer, acho que encontramos sua filha. - O homem que usava um terno preto falou.
— Diga logo Wagner, onde esta a minha filha!
— As notícias não são boas. - Wagner tinha uma expressão complicada no rosto. - Foi achado um cadáver já em decomposição em uma das tubulações de ventilação das favelas. Pelas características, pode ser a senhorita Karol.
O senhor Seifer ficou paralisado com a notícia. Ele segurou a beirada da escrivania luxuosa e sentiu - se mal:
— Wagner, verifique se esse cadáver é mesmo da minha filha, o mais rápido possível.
— Sim senhor!
Wagner saiu apressado da sala e em seguida o senhor Seifer desabou em sua poltrona com uma expressão de dor. Nunca que ele poderia imaginar que a sua princesa poderia ser morta por alguém, não com tanta segurança e com os treinamentos que ela possuía. Não poderia ser a sua Karol, ou poderia?
Ritchie observava a dor do pai com satisfação. Talvez assim aquele homem pudesse valorizar um pouco a existência da filha. Pelo jeito Perla realmente sabia trabalhar e ele não precisava se preocupar com a segurança de sua amada irmã, agora ele só precisava alertar Seth.
Seth mantinha Karol em seus braços. Ele sentia o perfume dos longos cabelos negros dela, um doce aroma de baunilha com rosas que o acalmava. Por ele, largaria tudo e viveria ali com ela, mas era arriscado demais, a essa altura Ritchie e Nicolas deveriam estar movendo céus e terras para encontrá - la. O jovem abraçou sua amada mais forte e a viu se aconchegar mais em seus braços:
— Eu tenho que ir, já está na hora de embarcar.
— Tem mesmo que ir? - Karol o encarou com seus lindos olhos azuis, a pedido dele, ela havia deixado as lentes de lado.
— Você sabe que eu tenho que ir. - Seth sentia seu coração se apertar. - Lembre - se de pegar o dinheiro que vou te enviar para poder se manter, não fique só dependendo do dinheiro das lutas ou vai chamar atenção.
— Sim senhor!
— Não esqueça de me enviar noticias ocasionalmente.
— Você também, por favor, se mantenha em segurança até nosso próximo encontro.
— Eu prometo me manter.
Um aviso sonoro indicou que o navio já iria zarpar:
— Eu te amo Seth.
— Eu também te amo Karol.
Seth a beijou rapidamente e sentindo uma parte sua se desprendendo de sua alma, ele a deixou. Sua última visão foi os olhos azuis marejados de lágrimas. Assim que ele cruzou a ponte, a porta de embarque foi fechada. Uma dor alucinante estourou em seu peito, foi uma dor pior do que a que ele havia sentido quando soube que ela havia fugido. Nunca ele havia sentido aquilo em toda a sua vida, então aquilo era a dor da separação que seus colegas tanto falavam.
Karol ficou na plataforma com as outras pessoas que vieram se despedir dos seus entes queridos. Ela observou o navio começar a se mover pelas águas em direção ao mar aberto. Seth não surgiu na ponte para se despedir dela e ela já imaginava o quanto ele deveria estar tão quebrado quanto ela pela separação. Ele era um homem grande, forte e letal, mas ela mais do que ninguém sabia o quanto ele era sentimental.
Seu coração também estava em pedaços, os dias ao lado dele escureceram todos os problemas que ela estava tendo durante todos aqueles meses. Não estava sendo fácil, ela que tinha tudo ao seu alcance agora tinha que se virar para garantir sua moradia e sustento, tendo que aprender a maioria das coisas na marra por não poder contar com ninguém. Um suspiro involuntário saiu dos seus lábios e ela sabia que era hora de voltar para realidade.
Por todo o caminho de volta para casa ela pensou no que faria nos próximos meses, ela tinha que traçar um bom plano para se manter longe dos olhares do pai e da família Wesker. Após ter passado em um mercado para comprar alguma coisa para jantar, a jovem voltou para casa. Como era fim de semana o senhor Domênico não ficava direto na portaria, geralmente ele tirava os fins de semana para descansar e como ele morava no primeiro andar, sempre estava atento se alguém estranho surgisse, o que era raro, pois naquele prédio morava apenas ele com a esposa, seu neto, que era vizinho de porta de Karol e mais alguns amigos do neto dele, todos que moravam ali eram boas pessoas.
Desanimada, ela subiu as escadas até o quarto andar, onde abriu a porta do seu apartamento e entrou. O lugar parecia tão vazio sem Seth ali sentado no sofá com sua inseparável tigela de salgadinhos. Tinha menos de uma hora que ele havia saído, mas parecia uma vida. Tudo parecia tão morto sem o som da TV ligada e ele xingando por bater o dedinho do pé em algum móvel ou qualquer outra coisa que seu jeito desengonçado o fizesse se machucar.
Ela depositou a chave no aparador e só então viu os envelopes de correspondência que estava ali a algum tempo. Com cuidado ela pegou os envelopes e analisou, dois eram de propagandas colocados aleatoriamente em sua caixa de correio, o terceiro era um telegrama. Ela abriu o envelope rapidamente e leu seu conteúdo que ela logo identificou sendo do irmão. Ritchie parecia bem preocupado com ela, então ela teria de enviar uma resposta mais breve possível, só assim ela também iria saber se estava segura.
Talvez com ela desaparecida o pai dela tivesse mudado de pensamento e tivesse retrocedido em sua decisão, se fosse isso ela logo voltaria e faria de tudo para que ele pudesse aceitar Seth como seu companheiro. Esse seria um pensamento muito otimista, afinal ela conhecia bem o pai, se não fosse o Nicolas, seria outro herdeiro bilionário que entraria em sua vida.
Ritchie havia ouvido de Perla que havia conseguido o corpo de uma jovem com as mesmas características de Karol e ela havia o pedido para providenciar algumas roupas e acessórios que Karol utilizava para vestir o cadáver. De início ele ficou horrorizado com a ideia, mas depois de muito analisar, ele aceitou, afinal ele tinha que se livrar de Nicolas, a qual ele fez questão que ficasse sabendo da notícia.
Não demorou muito para o ruivo surgir na sala de estudos da faculdade onde Ritchie costumava ficar. Nicolas tinha um olhar preocupado e Ritchie logo assumiu uma expressão de tristeza e abatimento:
— Me diga que isso não é verdade, Seifer. - Nicolas falou sério.
— Sobre o cadáver encontrado?
— Sim.
— Como sabe a minha irmã desapareceu no dia do seu aniversário, desde então estamos efetuando buscas… - Ritchie suspirou. - Encontraram um cadáver de uma jovem com características da minha irmã, mas ainda não podemos dizer que é ela porque o corpo já estava em adiantado estado de decomposição. Só reconhecemos as roupas e as joias que a moça usava.
— Não pode ser… a minha doce noiva… quem seria capaz de tamanha maldade? - Nicolas estava surpreso com a notícia.
— Já iniciamos uma investigação conjunta com a polícia e o exame de DNA vai sair em algumas semanas.
— Espero que seja um engano e a Karol esteja viva. - Nicolas levou uma mão até o ombro de Ritchie. - Se tiver qualquer novidade me conte.
— Pode ficar tranquilo que você será um dos primeiros a saber.
Nicolas saiu da sala e logo Ritchie sorriu com sua pequena vitória. Logo o Wesker contaria para os pais e os mesmos iriam pressionar o pai dele por notícias e com isso o acordo poderia ser desmanchado, assim que tudo estivesse feito ele poderia trazer Karol de volta e eles iriam derrubar o pai deles da presidência da empresa.
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Atualizado até capítulo 80
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