Assuntos particulares

— Oi tia. Oi pai.

— Boa noite filho. O Sebastian veio aqui hoje.

— Ele não te encontrou no caminho? — Disse Hebe.

— Sim. Eu falei com ele.

— Mas vocês dois não estavam sem se falar?

— Também tia. Mas acho que os pais dele deram uma bronca nele sobre isso. Certamente nada mudará na escola.

Meu pai me olhava querendo falar algo, mas quando ia abrir a boca, ele recuava.

— Quer falar alguma coisa, pai?

— Ele quer saber sobre o encontro.

— Tia! — Olhei para ela que fez uma cara de desentendida. — Foi legal, mas estávamos numa festa e curtimos a festa. Foi isso! — Fui subindo as escadas sem dar tempo a eles, mas:

— Vem cá, Jonathan. Senta aqui um pouco.

Fazia umas quatro semanas que eu não sentava naquele sofá diante de meu pai e Hebe tricotando umas das várias roupinhas que fazia para Nick, sua gata de estimação. Ela jogou um olhar de desconfiança e desceu seus lábios para o lado direto. Era um aviso de que aquele assunto não era confortável. Pensei na minha mãe, no que Genna ou Preston poderiam ter dito a ele na oficina, porém estava quase certo que seria sobre sexualidade.

— Eu sei que deveria ter falado sobre esse assunto, mas sua condição, não me dava...

— Por que sou gay?

— Isso. Não sai com garotas, não sabe se...

Dava para ver meu pai engasgado com o fato e com a ideia de falar sobre ativo ou passivo, ou coisa do mundo LGBTQIA+. Eu já havia me informando sobre tudo, mas era cedo em pensar em sexo com alguém. Me deu pena em ver meu pai falando de algo que não entendia, se entendia, não queria reconhecer que eu poderia praticar. Precisei ser mais maduro do que ele para me deixar subir e esquecer aquele momento constrangedor.

— Pai, olha! Eu sei que sou novo, mas já pesquisei tudo sobre o assunto e acho que não estou preparado e sem contar que não é uma questão essencial na vida agora.

— Mas, eu fico com medo de alguém se aproveitar de você, ou te forçar a fazer algo que ainda não tem ideia.

— Eu tenho ideia do que é um homem ativo ou passivo, ou controlador fazem. Não farei nada que eu não queria.

— Promete que vai se cuidar? Eu nunca te vi tão aéreo quanto hoje de manhã. Cantando alto ainda! Eu tenho medo que você se decepcione.

— Eu não posso garantir que não me decepcionarei, mas sou pé no chão. Sei exatamente onde quero chegar e estar esperançoso por ter alguém, um par na minha vida não quer dizer que casarei a manhã, ou seita o quê. Entendo de ISTs.

— Eu queria que você pensasse nos estudos, não vai querer ficar a vida inteira naquela cafeteria. Poderia pensar no seu futuro. Eu não gostaria que você se transformasse numa drag queen sem futuro nessa cidades grandes e até se envolver no submundo de prostituição... Eu gostaria que você fosse um homem capaz de entender que existe outros lugares além Virgínia Lake e você pode sonhar em ter uma profissão. Jamais ouvi de você alguma coisa que gostaria de fazer, que gostaria de tentar.

Vi meu pai colocando para fora suas dúvidas e o que achava sobre o fato de ser um homossexual assumido. Porém gostei de vê-lo preocupado comigo e há tempos ele tentava se expressar e nada. Na questão da profissão, eu realmente não sabia o que pensar, eu queria começar a ter interesse em achar uma profissão adequada. Não tinha passado nem vinte o quatro horas que eu e Travis tínhamos nos conhecido e minha vida mudou tanto — até às pessoas que me ignoravam passaram e me cumprimentar como Ondine e Sebastian — isso significa que não desapareci e estava ali, sendo analisado, visto...

— Robert, prometo buscar na escola mais sobre profissões e, aliás, eu não sei se tenho alguém de fato na minha vida. Estamos nos conhecendo.

— Ok.

— Vai tomar seu banho, filho.

— Está bem, tia.

Não poderia continuar sem um futuro, isso era fato. Travis me deu um ânimo, o fôlego jovial e interesse que faltava. Senti a água inundar meu corpo e nela uma eletricidade rara de possibilidade. Foi uma surpresa Sebastian parecer, mas ele ficará onde ele deveria estar desde o início: longe do meu coração.

 

*

*

*

Sebastian

Pensei em voltar para casa, tocar meu violoncelo, estudar algumas partituras, porém estava inquieto. Se tinha uma coisa que me chamava atenção em Jonathan, eram seus olhos e eles me mostraram uma certa repulsa, certa mágoa. Quando ele não fala é porque, por dentro, ele queria me colocar contra parece e também quer dizer que, para ele, eu não importava mais.

— Para de me ligar!

— Meu filho veio aqui. Disse que você estava com minha blusa, queria encontrá-la. Mas disse que tinha deixado na lavanderia falei que é uma blusa comum, mas ele acredita que você não teve acesso a essa moda. Meu filho é bem detalhista.

— Eu te devolvo na escola, Antony.

— Por que não vem aqui?

— Não estou afim. Como já disse, isso terá que acabar em breve, trará problemas para mim e para você.

— Você é maior de idade. A gente pode tentar uma coisa nova. Eu posso te levar para jantar em Newport. A gente pode curtir um passeio, sem sexo. Acho eu te assustei um pouco. Quer conversar?

Minha vida na cidade de Virgínia Lake estava afundando, chegar em casa e ter que ver Claire apaixonada por Brendan e minha mãe querendo que eu faça sala para ele e sua mãe, não era o que eu queria.

— Está bem. Eu vou, mas estou de carro.

— Deixa ele na garagem do motel. Peço para o Charles guardar junto com os deles. Vamos no meu.

— Certo!

Não estava arrumado, peguei meu casaco de capuz e entrei no carro de Antony. Na cidade, de algum modo, todo mundo se conhecia, mas os podres de cada um era exclusividade de poucos.

— Você não acha que esse garoto é muito novo para você? — Charles me encara pela janela do carro.

Ele conhecia meu pai, minha família e apesar dele me observar entrando e saindo do quarto de Antony, talvez ainda tinha dúvidas sobre minha identidade.

— Eu tenho dezoito anos. — Disse o encarando e desviando o olhar em seguida.

Charles joga sem olhar de reprovação para Antony e o mesmo retribui.

— Toma conta da sua vida, Charles. Aqui ninguém é criança e eu te pago muito bem e em dia.

— Toma cuidado. Pode me arrumar problemas.

Foi só Antony arrancar com o carro para eu explodir com ele. Fiquei puto, com a insistência, com os furos que estávamos dando pela cidade.

— Você acha que eu estou bem? Você é uma garoto mimado. Foi você que começou esse jogo.

— Para o carro, eu vou descer.

— Para! A gente vai para Newport, vamos comer num lugar legal e você, cala a boca!

Odiava ficar dependente de alguém, ainda mais o professor Antony Wright. Como ele era babaca quando queria. Entrei naquela balsa, sai do carro e deixei o vento bater, era uma viagem de máximo quarenta minutos e havia muita gente conhecida para ele se atrever a falar comigo ou me abraçar. Eu me meto em cada situação que não entendo quais são os reais motivos para isso. Coisas ruins aconteceram comigo desde que assumir ser homossexual. Apesar de não parecer, eu ainda enfrentava resistência de alguns familiares, antigos amigos que seriam amigos para vida inteira caso não saísse do armário. Isso machuca, parece que deixamos de ter sentimentos e o sarcasmo, ataques de raiva e estrelismo eram que garantiam que eu fosse respeitado. E eu já estava cansado dessa relação de ser um gay com dinheiro e branco, ou seja, tolerável. Cansado desse meu jeito de me blindar de olhares como de Jojo mais cedo — não querendo assumir, mas assumindo — talvez qualquer pessoa poderia me maltratar, me evitar, mas Jonathan destruiu algo em mim que jamais esperei que ele seguisse e eu não entendo o porquê, me parece que ao mesmo tempo que quero ele longe, nada na minha vida faz sentido se ele não tiver nela.

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