Após toda a comoção, o responsável pelo atentado contra o marquês e a marquesa Davelli foi julgado e executado em praça pública. A justiça imperial foi rápida e implacável. No mesmo dia, o imperador declarou que o marquesado ficaria sob responsabilidade do grão-duque Cezar — meu pai — até que o herdeiro, Amel Davelli, completasse vinte e três anos. Um voto de confiança absoluto ao homem que venceu guerras e recusou uma coroa.
No fim daquela tarde, vi meu pai entrar nos salões com um menino pequeno adormecido em seus braços. O cabelo castanho de Amel caía levemente sobre o rosto, e sua expressão, mesmo dormindo, era tensa, como se não conseguisse encontrar paz nem no sono.
— Este é Amel — ele disse com voz firme, mas baixa, como se estivesse anunciando um segredo ao vento.
Já sabia quem ele era. Por isso, apenas voltei à minha leitura — estava reorganizando pergaminhos de mana pura e tentando convencer a babá de que eu definitivamente sabia conjurar uma runa de proteção básica. Tinha só oito meses, sim, mas minha mente... não era mais tão nova.
Com o cair da noite, meu corpo infantil começou a ceder ao cansaço, e, mesmo lutando contra o sono, minhas pálpebras pesaram. Após um banho quente, minha mãe me envolveu numa manta com cheirinho de flores de jasmim e mel, e me ninou suavemente. O calor do colo dela, misturado ao aroma do leite recém-servido, me levou ao sono.
Pelo menos até os gritos recomeçarem.
Acordei sobressaltada.
O som vinha do quarto ao lado — gritos desesperados, palavras embaralhadas. O coração acelerou, e a adrenalina me despiu do sono de forma brusca. Saí da cama em silêncio e segui pelo corredor escuro com meus passinhos ainda desajeitados, tentando não fazer barulho.
Empurrei a porta com cuidado... e congelei.
Amel se contorcia na cama, os lençóis enrolados em seus braços, e as unhas fincadas na própria pele. Seu corpo tremia, e ele murmurava com desespero:
— Mamãe... mamãe... não me deixe... por favor... mamãe... escuro...
O grito preso em minha garganta se partiu em mil fragmentos de compaixão. Corri até ele. Minhas mãos pequenas tentaram segurar seus ombros, mas ele se debatia com força surpreendente. Levei quase um tombo, mas não desisti. Eu o abracei.
— Shh... você não está sozinho — sussurrei.
Ele agarrou meu corpo pequeno como se eu fosse o último fio de esperança. O calor de sua testa pressionou meu ombro, e eu senti lágrimas escorrerem e mancharem minha camisola. Ele chorava no sono. Murmurava como um filhote ferido.
E eu... simplesmente fiquei. Até que, sem perceber, adormeci ali mesmo, abraçada a ele.
---
Na manhã seguinte...
— AAAAAAAAAHHH!!!
As criadas entraram em pânico. Meu quarto estava vazio. A comoção foi imediata.
— Vasculhem toda a propriedade! — ouvi minha mãe gritar de longe. — Encontrem minha filha! Agora!
Logo em seguida, outro grito:
— AAAAAAAAAHHHH!!!
Desta vez, vindo do quarto de Amel.
A multidão correu até lá. A porta se escancarou, e todos pararam — olhos arregalados, bocas entreabertas, uma mistura de choque e surpresa.
Amel estava no chão, assustado, e eu... deitada em sua cama, dormindo profundamente.
Mamãe riu ao invés de surtar, e se aproximou de Amel, acalmando-o com carinho. Depois, me pegou nos braços e tocou suavemente meu rosto.
— Meu amor... por que me acorda tão cedo? — resmunguei, esfregando os olhos com as costas da mão.
— Porque você assustou nosso convidado, minha flor — ela respondeu rindo. — Não estava no seu quarto.
Mais tarde, sentou-se comigo no jardim para conversar. O aroma de lavanda no vento e o som suave das fontes enchiam o ar com uma paz quase mágica.
— Ária, por que você não estava em seu quarto esta manhã?
Suspirei.
— Mamãe... ele estava chorando, e eu acordei. Ele estava... tendo um pesadelo e se machucando com as próprias mãos. Então eu pulei em cima dele para fazê-lo parar.
Ela arregalou os olhos.
— Pulou?
— Sim! Como você faz comigo! — falei, séria.
Mamãe riu, e então seu sorriso se desfez lentamente.
— Meu amor... os pais de Amel não voltarão mais. Ele perdeu tudo. Agora somos nós — eu, você, e papai — que temos que ensiná-lo a sorrir de novo.
Assenti, sentindo um nó crescer no peito.
Mais tarde, enquanto brincava no jardim entre as flores e borboletas douradas, ouvi um chorinho baixo vindo do lago. Corri com minha babá até lá, e encontrei Amel sentado na beirada, os joelhos encolhidos, os olhos cheios de lágrimas.
— Por que você está chorando, neném? — perguntei, agachando-me ao seu lado.
Ele fungou.
— Sinto falta da minha casa... da minha mamãe...
Toquei seu rosto com carinho.
— Minha mamãe disse que a sua virou um anjo. E que agora ela pode te proteger de onde estiver.
Ele me olhou, os olhos brilhando com lágrimas.
— Você quer uma nova família, neném?
— Quero...
— Então eu posso ser sua irmãzinha. Você quer ser meu irmão?
Ele assentiu devagar, com um sorrisinho tímido.
Naquele instante, eu soube: Amel Davelli era meu irmão. Não de sangue. Mas da alma.
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Duas semanas depois, acordei mais cedo que o normal. Antes que mamãe percebesse, corri até o quarto de Amel, pulei em cima dele com cuidado e sussurrei:
— Shh... a mamãe vai acordar! Vamos logo!
Hoje era o dia da nossa ida secreta à Floresta Sagrada.
A floresta onde as bestas lendárias dos herdeiros reais se revelam. Onde os familiares de sangue despertam.
A Ária da novel ignorou esse lugar... mas eu não sou ela.
A floresta era escura, envolta numa névoa prateada. Deixei Amel esperando do lado de fora e entrei sozinha. O cheiro era diferente — antigo, denso, como terra molhada misturada com poder.
— Quem traz crianças até aqui...? — uma voz ecoou. — Ah... a criança da profecia.
O mundo ao redor mudou. As árvores, antes negras, tornaram-se prata viva, pulsando com mana. Animais se erguiam à distância, observando.
Segui a voz até encontrar uma menina... ou melhor, uma ninfa. Gardênia, guardiã da floresta. Olhos translúcidos, pele brilhante. Centenária. Majestosa.
— Quem é você, pequena? — ela perguntou.
— Sou Ária. A criança da profecia. E vim buscar meu familiar.
— Você é apenas um bebê.
— Façamos uma aposta então. Se eu conseguir domar o lobo mais difícil que tiver... você fará um contrato comigo.
Ela gargalhou.
— Muito bem. O último lobo híbrido da linhagem infernal... nenhum de seus antecessores conseguiu.
Chegamos ao campo ritualístico. O filhote estava coberto de feridas, exalando mana negra e selvagem. Um monstro.
Droga... isso é um filhote? Parece o próprio inferno em quatro patas!
O lobo avançou. Senti a morte roçar minha pele. Levantei o braço num gesto instintivo.
Mas foi então que algo explodiu de dentro de mim.
Meus olhos brilharam como esmeraldas líquidas. Meus cabelos se tornaram prata celestial. Uma barreira luminosa me envolveu. E o lobo... parou.
Ajoelhou-se.
Me reconheceu.
Gardênia estava boquiaberta.
— Quando eu fizer treze anos, você cumprirá sua promessa?
— Sim... sim, criança. A Deusa te escolheu.
Voltei da floresta com Amel ao meu lado e um filhote de lobo infernal caminhando atrás de mim como um guarda-costas. Meu pai caiu em choque.
— Filha... isso é um... um híbrido?
— A ninfa disse que sim.
Horas depois, meu pai já estava em contato com o palácio, relatando que sua filha de oito meses havia domado um familiar sagrado que nenhum outro havia conseguido.
E esse... é só o começo.
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Atualizado até capítulo 25
Comments
Edna César
sério??? as vezes é irritante quando tem uma história dentro da história
2025-02-12
0
Marcia Ramalho Mecias
amando ler
2023-07-08
0
Anne C
oiiii
2021-07-09
1