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Não sei exatamente quando percebi que estava à frente do tempo… talvez tenha sido no terceiro mês, quando formei minha primeira frase com clareza ou no sexto, quando comecei a andar com a firmeza de quem já havia vivido isso antes — em outra vida. Agora, aos oito meses, falo com fluidez, leio com facilidade e reconheço mais expressões no rosto dos adultos do que gostaria.
O que choca as pessoas, no entanto, não é apenas minha precocidade. É a consciência. O olhar que pesa, que avalia, que entende. Eu vejo isso neles — nas sobrancelhas arqueadas, nos olhos arregalados, nas mãos que tremem discretamente ao me tocarem. Vejo no próprio imperador Raphael, meu tio, que tenta disfarçar o desconcerto com um sorriso protocolar.
Minha mãe, Catherine, me levou hoje para conhecer o palácio e minha tia Thalia, a imperatriz. O ar aqui dentro é mais denso, impregnado com o cheiro doce de flores imperiais misturado ao incenso queimando nos corredores de pedra clara. O piso de mármore reluz sob nossos pés, e o som dos nossos passos ecoa como se o próprio castelo nos observasse.
Ao entrarmos, minha mãe me coloca no chão com delicadeza. Meus pés pequenos tocam a superfície fria e lisa, e eu sinto a vibração da sala como se fosse uma extensão do meu corpo. À minha frente, engatinha o primeiro príncipe Asher — duas semanas mais novo que eu. Seu olhar âmbar me encara com a inocência típica de um bebê. Ele balbucia e tenta me entregar um brinquedo de madeira.
“Obrigada,” respondo com naturalidade.
Ele apenas ri, encantado, e balança os bracinhos.
Enquanto finjo brincar, concentro minha atenção na conversa entre minha mãe e a imperatriz. Suas vozes ecoam suaves, porém carregadas de emoção.
— Sua filha já sabe falar, andar… e ler? — Thalia exclama, o tom entre a admiração e a inveja. — Meu Deus, Catherine… Que sorte a sua.
— Sorte? — minha mãe murmura, a voz embargada. — Eu a amo mais do que tudo, mas… ela fala como se tivesse oito anos, com apenas oito meses. Não chora. Não faz birra. Parece... uma pequena adulta. Eu não vou ter tempo de aproveitá-la como bebê...
Seus olhos marejam. Eu sinto o peso da culpa me esmagando mesmo sem querer. O ar parece ficar mais pesado dentro do meu peito.
“Não se preocupe, mamãe”, penso. “Eu não vou morrer. E não vou me casar. Nem quero. E nem preciso.” Não como a Ária da novel, que trouxe vergonha para a família. Essa não sou eu. Eu sou outra. Uma que carrega memórias demais, peso demais, segredos demais.
Pouco depois, fomos chamados até a sala do trono. Minha mãe me carregou nos braços até me pôr no chão mais uma vez. Eu caminhei sozinha — o som delicado dos meus pés descalços ecoando no mármore polido. Quando empurrei as portas da sala do trono, os olhares recaíram sobre mim como lanças.
Meu pai estava ali, conversando com a sumo sacerdotisa, o general Caius e o mago da torre — que também é meu tio Ains. As expressões em seus rostos mudaram em uníssono, congeladas pela visão de uma criança tão pequena caminhando com firmeza.
— Essa é minha princesinha, Ária Lyana — disse meu pai, sorrindo orgulhoso enquanto me ergueu nos braços. O calor da sua mão grande e calejada contra minhas costas me reconfortou.
A sacerdotisa se aproximou, os olhos límpidos percorrendo meu corpo com uma curiosidade reverente. Ela ergueu a mão e pronunciou a prece sagrada. Eu nada senti. Nenhum calor, nenhum arrepio. Apenas... o silêncio. Um silêncio puro, imaculado.
— Vossa alteza imperial — disse, a voz vacilante —, consegue ver os fios prateados?
Ergui minha pequena mão e toquei um deles no ar, como se fosse um fio de cabelo solto. Leve, flutuante. Os olhos da sacerdotisa se arregalaram.
— Grão-duque Cezar... — ela se voltou para meu pai, visivelmente impactada — esta criança nasceu com a dádiva de ver os fios sagrados. Ela tem afinidade com o poder divino. Isso é raríssimo, ainda mais em alguém tão jovem. Leve-a ao templo. Ela precisa receber a bênção da Deusa.
O silêncio se instalou como uma tempestade que antecede o trovão. Todos estavam estagnados.
Ainda nos braços de meu pai, me curvei levemente para o imperador. Os olhos de todos se voltaram para mim com espanto. Eu podia ouvir os murmúrios se espalhando pelas laterais da sala.
— Oito meses, disseram?
— Isso é impossível.
— Um monstro... ou um anjo?
— Olhe para aquele cabelo! É prateado! Ela é marcada pela Deusa...
O peso de tantos olhares queimava minha pele. Senti o calor subir do pescoço até as orelhas. Não queria ser venerada. Só queria... entender. E sobreviver.
Mas o momento de tensão foi interrompido pela chegada de um guarda, ofegante, coberto de sangue e poeira.
— Vossa Majestade! O marquesado de Davelli foi atacado. O marquês e a marquesa... estão mortos.
O impacto foi imediato. Meus pulmões travaram por um instante. Meu corpo gelou. Um fio invisível se esticou dentro de mim, tenso, prestes a se romper.
Não. Isso não é certo. Isso não era para acontecer agora.
Na história, o pequeno Amel Davelli — herdeiro do marquesado — deveria perder os pais apenas aos seis anos. Agora, ele tem apenas um.
Minha mente girava como um redemoinho. Senti meu coração acelerar, pequeno e forte dentro do meu peito infantil. Cada batida ecoava no meu crânio.
“O que está acontecendo com esse mundo? O que está sendo mudado? E… quem está mexendo nas peças desse tabuleiro além de mim?”
Talvez... eu não seja a única que lembra.
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Atualizado até capítulo 25
Comments
Marcia Ramalho Mecias
que isso gente
2023-07-08
0
nine
"que palhaçada tá acontecendo" pensamentos da prota
2021-04-26
10
misaki da fanfic
a espera de mais
2021-04-11
5