A mansão do vampiro Adrien Duvall em Ashbourne era antiga, imponente. Cada corredor ecoava memórias de séculos de existência, mas naquela noite, ele estava perdido em pensamentos que o atormentavam.
Adrien apoiou a mão no vidro frio da janela, observando a escuridão que se estendia pela pequena cidade de Iowa. O vento agitava os galhos das árvores, e ele podia ouvir, lá ao longe, o murmúrio de algum animal noturno. Mas nada disso conseguia tirar de sua mente a lembrança de Elizabeth… sua noiva de outrora, morta de maneira cruel e injusta.
ADRIEN: Elizabeth… se ao menos eu pudesse mudar o passado…
Um frio percorreu sua espinha, não pelo vento, mas pela presença súbita de alguém atrás dele. Adrien se virou sem surpresa. Era Catarina, sua amiga e confidente de séculos, cujo olhar profundo escondia tanto segredos quanto advertências.
CATARINA: Você ainda está preso a ela, Adrien.
Adrien voltou a encarar a escuridão da janela, mas agora com a presença de Catarina ao lado, sentiu a familiar sensação de que não estava sozinho.
ADRIEN: Por que você escolheu esse lugar Catarina?
CATARINA: É mais tranquilo e Londres já não dava mais para nós três.
Adrien fechou os olhos por um instante, sentindo o peso da eternidade em seus ombros. Trêscentos e sessenta e sete anos de vida, mas o destino ainda conseguia surpreendê-lo.
A lua iluminou seu rosto pálido, revelando a intensidade de seus olhos azuis que, por trás da beleza eterna, guardavam séculos de dor, amor e um desejo que agora não poderia mais ser contido.
CATARINA: Adrien… você pode se abrir comigo. Sempre. Sabe disso, não sabe?
Ele permaneceu imóvel, ignorando as palavras dela como se fossem apenas mais um sopro do vento que rondava a noite. Seu olhar não se desviava da escuridão lá fora.
Catarina, porém, não se deixou abalar. Aproximou-se, os passos suaves ecoando sobre o piso antigo.
CATARINA: Eu nunca lhe agradeci como deveria… por ter me transformado. A mim e ao meu irmão, César.
Adrien não respondeu, mas ela continuou, a voz carregada de lembranças.
CATARINA: Minha vida humana… era um pesadelo. Eu vivia acorrentada ao medo, à dor, à miséria. Mas você… você me libertou. Você nos deu uma eternidade que não conhecíamos nem em sonhos.
Ela o olhou com intensidade, como se esperasse um mínimo de reconhecimento. Mas Adrien permaneceu calado, a expressão fria, perdida no passado.
ADRIEN: Não me agradeça por condená-los. A eternidade não é libertação, Catarina… é prisão.
Os olhos dela brilharam por um instante, uma mistura de reverência e dor.
CATARINA: Para você pode ser prisão, Adrien. Para mim, foi salvação. Se tivesse permanecido humana, já estaria morta há muito tempo… ou pior.
Adrien desviou o olhar dela, retornando ao manto de sombras além da janela. Ele não queria carregar gratidão, tampouco culpa. Seu coração ainda pertencia a memórias de séculos atrás — memórias que nem o tempo, nem o sangue, nem a escuridão conseguiam apagar.
ADRIEN: Não fale de salvação, Catarina. Não existe salvação para nós. Apenas sobrevivência.
Adrien se afastou lentamente da janela, o manto negro de sua presença se dissolvendo pelos corredores da mansão. Sem uma palavra, passou por Catarina e deixou a sala, a madeira do assoalho rangendo sob seus passos firmes.
Catarina ficou sozinha, os olhos fixos no vazio que ele havia deixado. Um silêncio quase sufocante dominou o lugar, até que uma nova figura surgiu pela porta: César, seu irmão, alto, de traços marcantes, com a mesma frieza nos olhos imortais.
Ele entrou sem cerimônia, as mãos cruzadas atrás das costas, olhando para o ambiente escuro.
CÉSAR: Não sei por que insiste em ficar aqui, Catarina. Londres era melhor. Lá tínhamos poder, influência… e sangue em abundância. Aqui, nesta cidade esquecida em Iowa, estamos perdendo tempo.
Catarina se voltou para ele, erguendo o queixo com firmeza.
CATARINA: O destino me diz que vamos ser felizes aqui.
César riu baixo, um som seco e incrédulo.
CÉSAR: Destino? Você fala como se ainda acreditasse nessas tolices humanas. Nós não temos destino, Catarina. Apenas noites intermináveis, sangue e escuridão.
CATARINA: Está errado irmão.
César estreitou os olhos, desconfiado, mas curioso.
No outro dia, era praticamente fim de tarde quando Valentina resolveu ir na casa de Estela. O vento entrava pela janela aberta do carro, fazendo os cabelos ruivos de Valentina Sinclair dançarem levemente. Ela dirigia com um sorriso no rosto, os olhos brilhando de entusiasmo.
VALENTINA (pensando):
Em três semanas… eu estarei casada. Tudo vai ser perfeito.
Enquanto acelerava pela estrada ladeada por árvores altas, sua mente viajava pelos detalhes do casamento. O vestido branco, as flores no altar, o sorriso de Lucas à sua espera. Estava feliz, animada, sonhando acordada com cada instante daquele futuro tão próximo.
De vez em quando, ela falava sozinha, como se Estela já estivesse ao seu lado.
VALENTINA: Estela vai amar a ideia das flores brancas na entrada… e talvez o vestido das madrinhas precise de um tom diferente. Ah, eu preciso mostrar isso a ela!
O rádio tocava uma melodia suave, preenchendo o carro com uma atmosfera de otimismo.
Valentina sorria, imersa nos planos do casamento, cantarolando junto à música que tocava no rádio. O vestido, as flores, o futuro… tudo parecia perfeito.
Mas, distraída em seus devaneios, ela não percebeu as luzes de um carro vindo em alta velocidade na curva estreita da estrada.
Valentina tentou desviar mas perdeu o controle do carro.
O mundo girou. O carro de Valentina foi lançado para fora da pista, chocando-se contra uma árvore com violência. O vidro se estilhaçou, o som metálico da lataria retorcendo ecoou na estrada deserta.
A dor atravessou seu corpo em ondas. O gosto de sangue preencheu sua boca, e sua respiração se tornou difícil, frágil. Os olhos de Valentina, turvos pelas lágrimas e pelo choque, tentavam permanecer abertos.
VALENTINA (pensando):
Não… não pode acabar assim…
O rádio ainda tocava baixinho, ironicamente suave, enquanto a escuridão começava a tomá-la.
Adrien Duvall se ergueu de súbito em sua mansão. Seus olhos azuis se iluminaram com um brilho intenso, como se um chamado invisível tivesse atravessado os séculos e o atingido.
Ele sentiu a dor dela. O medo. O coração prestes a se apagar.
O príncipe das trevas jamais havia sentido algo assim. Uma ligação súbita, ardente, que queimava sua alma imortal. Ele sabia apenas uma coisa: não podia ignorar.
O sangue escorria pela testa de Valentina, seus olhos já semicerrados lutando contra a escuridão. Cada respiração era um esforço doloroso. O mundo ao seu redor parecia distante, abafado.
VALENTINA (pensando, com a mente turva):
Eu… não quero morrer… Lucas… mamãe…
Uma lágrima solitária escorreu por sua face pálida. Então, tudo se apagou. Seu corpo cedeu ao desmaio.
Na mansão, Adrien Duvall já não conseguia conter o impulso que rasgava sua alma. Ele atravessou os corredores como uma sombra veloz, e em poucos instantes estava na estrada, guiado não pelos olhos, mas pelo chamado no sangue.
O cheiro metálico de ferro e fumaça o atingiu primeiro. O carro retorcido estava encostado a uma árvore, a noite já se adensando ao redor da cena. Adrien se aproximou, seus passos silenciosos, até ver através do vidro estilhaçado…
Uma jovem. O rosto delicado, os cabelos ruivos manchados pelo sangue, a respiração fraca. A beleza dela brilhou mesmo na morte iminente, e os séculos de dor de Adrien pareceram tremer em um único instante.
Ele se ajoelhou ao lado do carro, a mão pálida pousando levemente sobre a porta retorcida, como se tivesse medo de quebrar o frágil corpo que repousava ali. Seus olhos azuis ardiam.
Com um movimento sobrenatural, ele arrancou a porta destruída como se fosse de papel, inclinando-se sobre Valentina. O coração dela batia fraco, cada compasso ecoando dentro dele como se fossem um só.
Por um momento, Adrien hesitou. Ele nunca acreditou que sentiria isso novamente, aquela ligação feroz, inescapável, que unia sua eternidade à mortalidade de alguém. Mas ali, diante dele, Valentina parecia mais que uma jovem humana. Ela era destino.
ADRIEN: Não vou deixar você morrer.
Ele afastou os cabelos ensanguentados de sua testa, contemplando-a como se já a conhecesse há séculos. Seu instinto clamava pelo sangue, mas algo mais forte o mantinha: um juramento silencioso, nascido naquele instante, de protegê-la.
Adrien inclinou-se sobre ela. O peito de Valentina subia e descia com esforço, cada batida do coração um som frágil, quase imperceptível. Ele a olhava com intensidade, como se pudesse gravar cada detalhe de seu rosto antes que a morte a roubasse.
Seu instinto de predador gritava para cravar os dentes e sugar o sangue quente, mas Adrien o conteve. Não… não seria para matar. Seria para salvar.
Ele ergueu o punho até a boca e, com uma pressão de suas presas, abriu um corte. O sangue escarlate começou a escorrer, brilhando sob a luz fraca da lua.
Adrien aproximou-se, tocando suavemente os lábios inconscientes de Valentina com o sangue que pulsava dele.
ADRIEN: Beba… apenas o suficiente para você viver.
Por reflexo, mesmo desacordada, Valentina moveu levemente os lábios, recebendo a essência dele. O laço se formou no mesmo instante: invisível, ardente, poderoso. Adrien sentiu a conexão atravessar sua alma imortal como fogo e gelo ao mesmo tempo.
O coração dela acelerou por alguns instantes, respondendo ao sangue do príncipe das trevas. Ele fechou os olhos, absorvendo a intensidade daquele vínculo novo.
Mas logo recuou, interrompendo o fluxo.
Ele a tomou nos braços com delicadeza, como se fosse feita de vidro. A noite envolvia ambos em silêncio, e Adrien sabia que nada seria como antes.
Catarina e César, que se aproximavam pela estrada após sentirem a perturbação no ar, pararam à distância, observando.
Adrien, porém, só enxergava Valentina. A mortal que carregava, agora ligada a ele pelo sangue.
O corpo de Valentina repousava nos braços de Adrien, agora com o coração um pouco mais estável graças ao vínculo de sangue. Os olhos dela tremiam sob as pálpebras, prestes a despertar. Adrien sabia que não podia permitir que a jovem lembrasse o que havia acontecido.
Ele ergueu a mão e pousou dois dedos na têmpora dela. Sua voz saiu baixa, profunda, carregada de um poder antigo que hipnotizava até a própria noite.
ADRIEN: Esqueça, pequena estrela… nada aconteceu aqui. Você não se feriu. Apenas dirigia, e saiu ilesa do acidente
Um leve brilho azulado atravessou os olhos de Valentina, selando a nova lembrança implantada. O acidente, o sangue, a dor — tudo se apagava, substituído por uma memória tranquila.
Adrien ajeitou-a cuidadosamente de volta no banco do carro, deixando-a em posição segura, como se tivesse apenas adormecido por alguns instantes.
Então, pegou o celular dela. A tela brilhou com a foto de Valentina e a mãe sorrindo juntas. Por um instante, Adrien sentiu um peso no peito, algo tão humano que o incomodava. Mas, sem hesitar, digitou:
"Mãe, estou bem. Só que o carro bateu em uma árvore na estrada, venha me pegar."
Ele enviou a mensagem e deixou o aparelho ao lado dela.
Em seguida, verificou os arredores com os sentidos aguçados. Adrien não poderia ser visto.
Com um último olhar para Valentina tão frágil e tão essencial ao mesmo tempo, ele recuou para a escuridão da floresta ao lado da estrada. Seus olhos brilharam em azul intenso antes de desaparecer completamente na noite.
Catarina e César, que observavam de longe, trocaram olhares.
CÉSAR: Ele a marcou.
CATARINA: Sim…
A noite voltou a se encher apenas do som distante do vento. Valentina respirava tranquila, sem nunca imaginar que sua vida já estava entrelaçada à do príncipe das trevas.
ADRIEN DUVALL (VAMPIRO) 367 ANOS
CATARINA CLAU (VAMPIRA TRANSFORMADA POR ADRIEN) 173 ANOS
CÉSAR CLAU (VAMPIRO TRANSFORMADO POR ADRIEN) 173 ANOS
( As imagens acima foram retiradas da internet.)
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Atualizado até capítulo 23
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