Passaram-se quinze anos desde que deixei o Brasil. Quinze anos de distância, de ausência, de solidão e de raiva contida. No começo, foi um tormento: a cada lembrança de Milena, meu peito se apertava. Um mês depois de me mudar para a Grécia, consegui enviar uma carta para ela, com as mãos trêmulas, as palavras cheias de esperança e desespero. Dizia que a amava e que faria de tudo para voltar e ficar ao seu lado.
Quando a resposta chegou semanas depois, a realidade me atingiu como um soco no estômago: Milena estava com outro rapaz e se mudaria para São Paulo, onde sua mãe agora trabalhava. Era a letra dela, eu conhecia muito bem. A raiva, a decepção, o desgosto… tudo se misturou em uma fúria silenciosa. Foi naquele momento que prometi a mim mesmo: nunca mais deixaria meu coração ser quebrado. Nunca mais.
E cumpri essa promessa. Quinze anos depois, aos trinta anos, havia me tornado o homem que sempre jurara ser: frio, calculista, distante. Um homem que não se permitia fraquezas, que escondia qualquer vestígio de sentimento sob uma fachada impenetrável. As relações humanas eram estratégicas, e a vida amorosa, um campo minado do qual me mantinha cuidadosamente afastado… até conhecer Catarina Fox, minha noiva e futura esposa.
Um casamento arranjado, é claro. Nossos pais haviam combinado tudo assim que cheguei a Grécia. O pai de Catarina era um antigo amigo de faculdade do meu pai, eram parceiros de negócios. Ela, apesar de não ter sangue grego como meus avós sempre quiseram, era a parceira de negócios perfeita para o que meus pais queriam, unificar o grupo Caligari e o Fox.
Ela era diferente. Intrigante. E, de alguma forma, irresistível. Um ano se passou desde que nos casamos,eu e Catarina vivíamos como um casal perfeito. Práticos, bonitos, ricos. Mas dentro de casa, éramos como completos estranhos.
Ela nunca quis se casar comigo, queria viajar o mundo, livre, esbanjando o dinheiro da família. Mas era filha única e foi obrigada. Vombinamos então de fazermos aquilo para termos a liberdade que gostávamos de ter. Eu não interferia na vida dela, nem ela na minha. Seria um casamento de aparências. Dormíamos em quartos separados, nunca tivemos relação sexual . Eramos discretos, tínhamos nossas aventuras fora do casamento com muita cautela para que aquela fachada que mantínhamos, seguisse intacta. Nossos pais nem imaginavam, que nós fazíamos aquilo.
Aprendi a controlar o que eu sentia — nunca o suficiente para me expor, sempre o bastante para manter o jogo sob meu controle.
Agora, voltávamos ao Brasil. Finalmente. Meus pais estavam se aposentando, e eu assumiria oficialmente o controle do grupo Caligari. Uma responsabilidade que carregava desde a adolescência, preparada pelos meus avós, e agora consolidada pelo meu próprio mérito. Eu não sentia nostalgia do país que deixei para trás; sentia a antecipação do poder que me esperava, da autoridade que me pertencia por direito.
Enquanto o avião sobrevoava o litoral brasileiro, observei a costa do meu país natal com olhos analíticos, calculando estratégias, prevendo movimentos. O passado existia apenas como uma sombra distante, um lembrete das feridas que me moldaram. Niko Caligari não era mais o menino apaixonado e impotente que chorou por Milena. Niko Caligari era um homem de trinta anos, casado e ao mesmo tempo livre de sentimentos , poderoso, e absolutamente determinado a nunca deixar ninguém quebrar seu coração de novo.
A mansão que comprei no bairro mais caro do Rio de Janeiro era exatamente como eu queria: imponente, estratégica, perfeita para alguém que não desejava ser incomodado, mas ainda assim precisava mostrar poder. Mas foi Catarina quem deu vida ao espaço. Mandou o melhor decorador do país transformar cada cômodo em um reflexo da modernidade e do luxo que nos rodeava.
Paredes de vidro do chão ao teto permitiam que a vista da cidade e do mar entrasse em cada canto, mas de um jeito calculado: intimidade sem perder a imponência. Portas gigantescas davam a sensação de amplitude e grandiosidade, enquanto a piscina de borda infinita parecia se fundir com o horizonte, como se a própria cidade se curvasse diante de nós. Academia, sauna, espaços de lazer… tudo pensado para eficiência, conforto e estética impecável. Uma mansão moderna, automatizada, onde cada detalhe parecia obedecer ao toque de um botão — e, de certa forma, obedecia.
Catarina escolheu cada membro da equipe de funcionários com a precisão de alguém que sabia o que queria. A única exceção era o mordomo, Senhor Pierre. Ele não precisava de apresentação: um antigo funcionário da família, leal, discreto e experiente. Convenci meus pais a permitir sua transferência para minha casa, e ele agora me acompanharia de perto, garantindo que tudo funcionasse exatamente como planejado. Pierre era mais do que um mordomo; era a extensão silenciosa do meu controle sobre aquela casa e sobre minha própria vida.
Enquanto caminhava pelos corredores amplos, sentindo o chão frio sob os pés, pensava na ironia de tudo aquilo. Quinze anos atrás, um menino com o coração partido, sem poder, sem controle sobre seu destino. Agora, um homem no auge de seu poder, casado, dono de uma mansão que parecia desafiar o céu, cercado por pessoas que obedeciam apenas ao que eu decidisse.
E ainda assim, havia uma parte de mim que não podia ser domada. Uma parte que lembrava de Milena, da primeira vez que senti algo verdadeiro e que me foi arrancado. Mas ela estava distante — ou, pelo menos, era isso que eu repetia para mim mesmo. Niko Caligari não podia se dar ao luxo de fraqueza.
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Atualizado até capítulo 102
Comments
Pati 🎀
espero que a mulher do Niko não seja problema em nenhum momento 🤭
2025-10-04
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