O amanhecer de Ravaryn não veio com serenidade. O sol mal surgira por trás das montanhas quando o cheiro de fumaça e sangue já impregnava cada rua estreita da vila. As criaturas que atacaram na noite anterior ainda rondavam os arredores, mas havia algo diferente: a presença do príncipe Kaelron e seus cavaleiros havia transformado o caos em uma resistência organizada.
Eu me escondia atrás de uma carroça tombada, o coração martelando no peito. Arlen estava ao meu lado, pálido e tremendo, segurando uma adaga que mal sabia como usar.
— Lyra… — ele sussurrou, os olhos fixos nos portões que se agitavam com o barulho de cascos e gritos. — Não olhe agora, mas eles vêm de novo.
Eu sabia que precisava olhar. Sempre soube que não podia fugir da realidade. Então virei o rosto devagar.
As criaturas avançavam em ondas, como se fossem alimentadas pelo próprio ódio. Lobos deformados, homens sombrios e figuras que eu mal podia distinguir se moviam com velocidade sobrenatural. Mas à frente deles vinha Kaelron.
O príncipe estava impecável em sua armadura prateada, os cabelos negros presos em um nó simples, e os olhos de aço varriam a praça com precisão cirúrgica. Cada movimento dele era calculado, cada golpe certeiro. Um monstro tentava derrubar um guarda, e Kaelron cortou-o ao meio com um giro de espada que parecia desafiar a gravidade.
— Peguem as crianças! — gritou ele para os homens ao redor, dando ordens como se tivesse feito aquilo toda a vida. — Protejam as saídas!
Eu senti um arrepio. Não era só a coragem dele, era algo mais… como se sua presença impusesse ordem ao caos, e até as criaturas hesitassem diante de sua força.
— Lyra! — Arlen me puxou para trás novamente. — Vamos ajudar a proteger os aldeões!
Seguindo-o, ajudei a empurrar mulheres e crianças para dentro de casas que não haviam sido destruídas, tentando manter a calma enquanto a batalha rugia ao redor. O som de aço contra aço, gritos e uivos preenchia cada espaço, cada sombra. Eu podia sentir o medo de todos, mas também uma faísca de esperança.
Um rugido particularmente alto me fez congelar. Um monstro enorme, quase do tamanho de um cavalo, avançava contra Kaelron. Ele ergueu a espada e atacou com precisão, mas o monstro desviou com velocidade sobrenatural e golpeou o cavalo do príncipe, derrubando-o com um estrondo que fez meu peito doer.
— Kaelron! — alguém gritou.
O príncipe rolou pelo chão, levantando-se rapidamente, espada em punho. Antes que pudesse reagir, uma das criaturas saltou sobre ele, presas brilhando sob a luz das tochas. Mas ele não hesitou: girou o corpo, golpeando com força e derrubando o inimigo.
Eu senti uma estranha pressão no peito, uma mistura de medo e algo que não conseguia explicar. Era como se meu corpo quisesse reagir sozinho, mas eu não conseguia controlar. Era apenas uma sensação, um aviso.
— Arlen… — murmurei, minha voz quase inaudível. — Eu… sinto algo.
Ele olhou para mim, preocupado.
— Lyra, não… Não agora!
Mas não havia tempo para explicações. O ataque continuava. Outras criaturas chegaram pela rua do mercado, quebrando barracas, derrubando caixas e espalhando o caos. Aldeões gritavam, tentando fugir, mas muitos foram empurrados ou derrubados.
Eu não sabia para onde olhar. Cada vez que olhava, Kaelron estava no centro da batalha, lutando como se fosse imbatível. Sua espada brilhava, mas não apenas com luz — havia algo na maneira como ele atacava, quase como se sentisse cada movimento das criaturas antes delas acontecerem.
— Lyra! — Arlen gritou, puxando-me para um canto mais seguro, próximo a uma casa parcialmente destruída. — Fique aqui! Não faça nada!
Olhei para ele, a garganta seca, enquanto uma das criaturas passava a poucos metros de nós, uivando em fúria. Eu queria correr, gritar, fazer algo… mas estava paralisada, apenas observando Kaelron cortar, empurrar e esquivar com perfeição sobrenatural.
De repente, algo diferente aconteceu. Uma das criaturas mais fracas, que havia me encarado por um instante, recuou. Olhou para mim. E então desapareceu como sombra ao vento. Eu não entendi, mas senti algo estranho dentro de mim, uma conexão silenciosa que me deixou assustada. Não era poder, ainda não… apenas um aviso, uma semente de algo que viria.
A batalha durou horas. Eu não sei como o tempo passou tão rápido, mas quando os últimos monstros caíram, o sol já havia surgido completamente no horizonte. Ravaryn estava em ruínas, casas destruídas, mercadorias espalhadas e aldeões feridos, mas vivos.
Kaelron estava no centro da praça, respirando fundo, a espada ainda erguida. Seus olhos varreram a vila e, finalmente, pousaram em mim. Por um instante, o mundo parou.
— vocês estão bem? - disse com a voz firme, mas com algo que eu não conseguia decifrar.
Não soube o que responder. Só sabia que, por alguma razão que ainda não compreendia, minha vida acabara de mudar para sempre.
E algo me dizia que aquela batalha era apenas o começo.
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Atualizado até capítulo 36
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