Quando finalmente acordei, meu corpo doía de maneira constante, cada músculo lembrando da noite anterior. Meu violino estava no chão, encostado na parede, e o quarto estava em silêncio, exceto pelo som fraco da minha própria respiração.
Olhei para meu corpo e não pude evitar notar as marcas e cicatrizes que se acumulavam ao longo dos anos - cada uma uma lembrança da dor que meu pai impunha, da pressão insuportável, da perfeição exigida. Ele nunca batia no meu rosto, para que ninguém descobrisse, mas cada golpe no corpo deixava sua própria memória, invisível aos olhos de todos, mas insuportável para mim.
Enquanto tentava me recompor, minha mente voltou ao passado, a lembranças dolorosas que nunca se apagaram. Pensei no meu irmão, que se fora anos atrás, também com a mesma doença que eu carrego. Ele morreu jovem, frágil e silencioso, e depois de sua morte, meus pais mudaram para sempre.
Eles não aceitaram a ideia de ter outro filho frágil e fraco. Cada gesto meu, cada batida acelerada do meu coração, cada passo hesitante era visto por eles como uma falha, uma decepção que precisava ser corrigida. A raiva e a frustração que não puderam direcionar ao meu irmão agora eram descarregadas em mim, de forma cruel e incessante.
A doença que carregamos, meu irmão e eu, é traiçoeira. Meu coração não suporta esforços prolongados ou emoções intensas sem que o ritmo dispare perigosamente. Cada movimento, cada pressão física ou emocional, pode acelerar os batimentos a ponto de colocar minha vida em risco. Por isso, preciso tomar remédios diários, que regulam o ritmo cardíaco e tentam impedir que qualquer esforço excessivo cause um colapso.
Existem pontos positivos e negativos. O lado positivo é que, com os remédios, consigo sobreviver, mesmo em meio à pressão constante do corpo e da mente. Cada dose é como um escudo invisível que me permite continuar, tocar, viver - por enquanto. Mas o lado negativo é cruel: meu coração, fraco desde o nascimento, não aguenta por muito tempo. Mesmo com os remédios, ele tem um limite natural. O tempo de vida é incerto, mas a estimativa cruel da medicina é de uns oito meses a um ano, depois de muito avançada. Não há milagre que prolongue além disso; o corpo insiste em ser frágil, e cada esforço, cada batida acelerada, me aproxima do fim.
O peito doía, não só fisicamente, mas também emocionalmente. A sensação de solidão, de ser pequeno e vulnerável diante da violência e do desprezo, era esmagadora. Cada marca e cicatriz no meu corpo contava essa história, lembrando-me do peso de ser o "substituto" de alguém que eles não puderam proteger, mas que agora queriam moldar com brutalidade.
Meu corpo ainda reclamava, cada movimento lembrava a dor, mas no meio desse silêncio opressor, tudo que eu podia fazer era permanecer ali, tentando respirar e sobreviver. Cada dia carregaria as marcas físicas e emocionais daquela casa, lembrando-me de quem eu era e do quão frágil o mundo podia ser.
A manhã passou devagar, cada gesto exigindo cuidado extremo. Cada movimento era medido, cada passo controlado. Meu coração, mesmo com os remédios, batia acelerado, lembrando-me de que minha fragilidade era constante. Sobreviver era um ato de atenção incessante, e cada acorde tocado no violino era um pequeno triunfo sobre a dor e o medo.
Enquanto me recomponho, minhas mãos seguram o cartão que Dom Blake me entregou no café. As palavras dele ecoam na minha mente, uma melodia diferente das notas que saem do violino: "Você toca muito bem... quero te contratar..."
O coração aperta, mas de uma forma estranha, quase suave. Por um instante, sinto um pouco de alívio, como se aquela lembrança me desse força silenciosa. É estranho: ele é um desconhecido, mas ainda assim, há algo naquelas palavras que aquece meu peito e me permite continuar.
Ao entardecer, o dia ainda não havia terminado. O jantar em família se aproximava, e com ele, a tensão habitual. Sentar à mesa era quase tão doloroso quanto qualquer chicotada. Meu pai já esperava, olhos penetrantes e amargos, como se cada segundo que eu demorasse fosse um crime imperdoável. Minha mãe permanecia à distância, uma sombra silenciosa, observando com frieza absoluta.
- Você acha que pode se sentar aqui como se fosse alguém? - ele começou, a voz firme e cortante, sem qualquer compaixão. - Cada movimento seu é uma decepção, uma vergonha! Fraco, inútil, patético!
A cada palavra, meu peito apertava, e meu corpo tremia. As cicatrizes e marcas pareciam arder sob o peso da humilhação verbal. Eu segurava a faca com força, os dedos brancos, tentando não chorar ou tremer, mas a vergonha e o medo eram esmagadores.
- Olhe para sua mãe e aprenda como se faz! - continuava ele, rindo baixo de forma cruel. - Mas claro... ela nunca vai te defender, porque você é fraco demais para merecer proteção.
Minha mãe permaneceu imóvel, fria e distante, como se cada palavra dele fosse apenas música de fundo. Nenhum gesto, nenhum olhar de compaixão. Só a sombra fria de quem observa sem se importar.
O jantar prosseguia, cada garfada um esforço para respirar e não desabar. As palavras sujas e abusivas de meu pai queimavam na minha mente, enquanto eu sentia o coração acelerar perigosamente, lembrando-me mais uma vez de minha fragilidade. Cada olhar, cada suspiro, cada movimento meu era fiscalizado, criticado, punido com sarcasmo e desprezo.
E, ainda assim, o cartão de Dom Blake permanecia em minhas mãos, um lembrete silencioso de algo diferente, quase caloroso, no meio de toda a opressão. Por um breve momento, senti que talvez eu ainda pudesse respirar, mesmo que só um pouco, mesmo que por segundos.
E quando a refeição finalmente terminou, a tensão não havia diminuído. Eu sabia que aquele clima familiar tóxico não se desfaria facilmente. Meu corpo reclamava, meu coração ainda pulsava rápido, e a sensação de impotência permanecia, lembrando-me de que, mesmo em meio a remédios e cuidados, eu ainda era vulnerável, frágil... e sozinho.
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Atualizado até capítulo 24
Comments
Yaky De la rosa
Arrebatador! 😭
2025-08-21
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