Claro que eu não acreditaria. Quem acreditaria? Seria loucura demais pensar que um desejo tão absurdo poderia se realizar.
Fugir… ir embora daquele inferno que eu chamava de casa… sumir da minha família para sempre. Tantos anos desejando sair de lá. Tantos anos implorando para que o universo me tirasse daquele lugar.
E então, de repente, eu senti.
O colar, frio até então, começou a esquentar contra minha pele. Não era um calor qualquer. Era como se algo vivesse dentro dele, pulsando. A pedra brilhou — e não era uma luz suave. Era um azul incandescente, tão intenso que iluminou minhas mãos e o chão ao meu redor.
— Mas o que…? — comecei a falar, mas o ar sumiu dos meus pulmões.
Uma pressão me empurrou para baixo, como se alguém tivesse colocado todo o peso do mundo sobre meus ombros. Caí de joelhos, sentindo o chão tremer sob mim. O quarto, a rua, a cidade… tudo começou a girar.
— Merda… — foi a última coisa que consegui dizer antes de sentir o estômago revirar.
O calor virou vertigem, a vertigem virou escuridão. E então… nada.
Quando abri os olhos, a primeira coisa que senti foi dor.
— Ai… minha cabeça… — gemi, levando a mão à têmpora.
O chão sob mim não era o piso frio da calçada. Era… terra. Terra úmida. Cheiro de mato, de folhas molhadas, de vida.
Pisquei várias vezes. O céu… o céu era diferente. Um azul limpo, como eu nunca tinha visto na minha cidade. O ar parecia mais… puro. Mais fresco.
Me levantei devagar, sentindo os músculos protestarem. Meu corpo ainda estava pesado, como se tivesse corrido uma maratona.
Foi aí que percebi.
— Não… não pode ser…
Olhei ao redor. Eu estava no meio de uma floresta densa. Árvores enormes, troncos grossos, copas tão altas que parecia impossível ver onde terminavam. A luz do sol filtrava por entre as folhas, criando manchas douradas no chão. O som distante de água correndo chegava aos meus ouvidos, misturado com o canto de pássaros que eu nunca tinha ouvido antes.
O cheiro era intenso, fresco, quase doce. Não tinha nada a ver com o ar poluído da cidade.
E então… o enjoo veio.
Segurei o estômago, mas não deu. Virei para o lado e vomitei tudo o que tinha.
— Que droga… — limpei a boca com as costas da mão, tentando recuperar o fôlego.
Meus olhos ainda estavam se adaptando à claridade. Respirei fundo e comecei a andar. As botas — graças a Deus por ter escolhido elas — afundavam um pouco na terra, mas me davam firmeza.
Meu coração batia rápido. Eu não sabia onde estava, não sabia se era real… mas cada passo confirmava que não estava mais no meu mundo.
Peguei um pedaço de madeira no chão. Era grosso, resistente. Um pedaço de galho caído. Não era muito, mas era melhor do que nada caso algum animal aparecesse.
— Calma, Joyce… respira… — falei para mim mesma, como se isso fosse resolver alguma coisa.
Continuei andando, tentando seguir um caminho imaginário entre as árvores. Foi então que ouvi.
Passos.
No começo, achei que era só minha mente pregando peças. Mas o som ficou mais forte. Rápido. E pesado.
Virei na direção do barulho, apertando mais o galho na mão.
E então eu vi.
Um homem surgiu por entre as árvores. Alto, muito alto. Ombros largos, músculos definidos mesmo sob a camisa escura. O cabelo era comprido, castanho-escuro, preso parcialmente para trás, balançando enquanto ele se movia com precisão.
E… asas. Asas enormes, negras, abertas como se se preparassem para decolar.
Meu cérebro travou.
Atrás dele, outro homem. E este… não parecia seguir as regras da realidade.
As sombras se moviam ao redor dele, rodopiando pela cintura, subindo pelos braços, vivas, como criaturas obedecendo a um mestre invisível. Ele tinha um porte igualmente imponente, mas o que mais chamava atenção eram aqueles olhos atentos, intensos, que pareciam analisar tudo.
Meu corpo inteiro gelou.
— Puta merda… — sussurrei, recuando um passo. — Eu morri… ou isso é um sonho muito real.
O primeiro homem se virou para o outro, trocando algumas palavras que eu não entendi — não era português. Mas a forma como falavam… havia algo de afiado, de alerta.
Apertei mais o galho. Parte de mim queria gritar, outra queria correr, e uma terceira… queria chegar mais perto para ter certeza do que via.
O homem das sombras inclinou a cabeça, como se tivesse me sentido ali. Meu coração disparou. As sombras se agitaram ao redor dele, como se tivessem vida própria, e eu senti um arrepio subir pela espinha.
"Não é possível…", pensei. "Eu… não… não pode ser…"
Mas tudo em mim dizia que sim.
Eu estava lá. No lugar que sempre sonhei, mas que nunca acreditei que poderia tocar.
Só que… eles não pareciam felizes em me ver.
E eu não sabia se, naquele momento, isso era mais assustador ou emocionante.
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Atualizado até capítulo 123
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