Laura caminhava sem destino pelas ruas do centro, a bolsa cruzada no peito e o casaco aberto, apesar do vento frio que soprava entre os prédios. O céu ainda estava nublado desde o dia anterior, e havia algo naquela penumbra natural que combinava com o que sentia por dentro: uma espécie de crepúsculo emocional, em que nada parecia claro — mas tudo parecia prestes a mudar.
Sentou-se num banco da praça que ficava em frente à antiga biblioteca municipal. Era um lugar onde costumava ir na adolescência, quando ainda acreditava que as histórias do mundo real podiam ser tão coerentes quanto as dos livros. Agora, era o oposto. Sua vida parecia um romance mal escrito — cheio de incoerências, personagens dúbios e um enredo que ela não havia escolhido.
Ela permaneceu ali por longos minutos, observando as pessoas passarem. Sentia-se invisível. E talvez, naquele momento, desejasse realmente ser.
— Desculpa — disse uma voz masculina, tirando-a dos pensamentos.
Laura levantou os olhos. Um homem elegante, de terno azul escuro e pasta de couro nas mãos, parava diante dela com um sorriso constrangido.
— Esse banco… tem uma tomada logo ali atrás, e meu notebook tá prestes a morrer. Você se importaria se eu sentasse um pouco?
Ela hesitou, depois fez um gesto com a mão.
— Claro, pode sentar.
Ele agradeceu e acomodou-se na outra ponta do banco, mantendo uma distância respeitosa. Ligou o notebook com rapidez, conectou o cabo, e depois de alguns segundos, relaxou os ombros.
— Salvo pelo banco da praça — brincou, sem esperar resposta.
Laura não riu, mas esboçou um sorriso leve.
— Ele é útil… às vezes.
— Você vem aqui sempre?
— Só quando a vida me aperta — respondeu, olhando à frente.
— Então a vida deve estar apertando bastante hoje. Você tem um olhar… pesado.
Ela virou lentamente o rosto para ele. Não era o tipo de comentário que se espera de um desconhecido. Mas havia algo na voz dele — firme, mas gentil — que não soava invasivo. Era como se ele apenas tivesse dito o que viu, sem segundas intenções.
— E você? — devolveu a pergunta. — Corre por trabalho ou por fuga?
— Um pouco dos dois. Trabalho como advogado. Escritório aqui perto. Às vezes, quando o clima está tenso, venho respirar fora das paredes brancas.
Laura assentiu.
— Faz sentido.
— Daniel — ele disse, estendendo a mão.
— Laura.
O toque foi breve, cordial. E por um instante, ambos voltaram ao silêncio confortável.
Ela se levantou minutos depois, sentindo que já havia ficado tempo demais ali. O relógio marcava quase meio-dia.
— Foi bom conversar — disse ela, ajeitando a alça da bolsa.
— Espero te ver de novo, Laura.
Ela sorriu, discreta.
— Quem sabe.
E foi embora.
Naquela tarde, Laura decidiu visitar a própria mãe. Não contou nada sobre Henrique, nem sobre Marina, nem sobre Lara. Conversaram sobre trivialidades: receitas, novelas, o tempo. Mas o simples fato de estar em outro ambiente, com alguém que a conhecia desde menina, lhe deu uma sensação tênue de estabilidade.
Ao voltar para casa, já no fim da tarde, encontrou Henrique no sofá, assistindo ao noticiário. Ele virou o rosto ao ouvir a porta.
— Oi. Pensei que ia ficar fora o dia inteiro.
— Fui ver a minha mãe.
Ele assentiu e se aproximou.
— Laura… — começou ele, com a voz mais baixa do que o normal. — Eu sei que tem alguma coisa errada. Não sei se é comigo, com você, ou com a gente. Mas eu queria que você me dissesse.
Ela o encarou, com os olhos fixos.
— Tem coisas… que não se dizem de uma vez. Elas precisam amadurecer por dentro antes de serem ditas.
Henrique engoliu em seco.
— Isso é uma forma de dizer que você quer ir embora?
— Não. É uma forma de dizer que eu ainda estou aqui. Mas diferente.
Ela subiu para o quarto sem dizer mais nada.
E ele, pela primeira vez em muito tempo, não teve palavras para segui-la.
Naquela noite, deitada em silêncio, Laura se lembrou do homem da praça. Daniel.
Não porque ele fosse bonito. Não porque tivesse dito algo marcante.
Mas porque, pela primeira vez em dias, alguém olhou para ela… e viu.
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Atualizado até capítulo 50
Comments
Sandra Camilo
tomara que ele faça amizade com ela e dps eles se apaixone, como advogado ajude ela a separar do cretino do marido!!
2025-07-20
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rafamendes
que situação
2025-07-17
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