O dia começou com ele me dizendo que precisava estar pronto antes das sete. Eu não perguntei o motivo. Já tinha aprendido que algumas respostas dele eram como cordas: apertavam e nunca soltavam.
Fiquei assistindo enquanto ele escolhia a camisa preta, dobrava as mangas e ajeitava o cabelo como se não soubesse o estrago que fazia em mim. Ele estava lindo. Irritantemente lindo. Cada movimento dele me dava vontade de gritar e beijar ao mesmo tempo. Era como se existisse uma seringa enfiada no meu peito, injetando alguma droga que vicia rápido demais.
A gente saiu juntos. Ele abriu a porta do carro pra mim. Não como um cavaleiro, mas como quem sabe que eu pertenço ali. Eu não reclamei. Eu nunca reclamo. Só observo. Como sempre faço.
O evento era em um restaurante elegante, cercado de gente que falava alto demais e sorria como se precisassem provar algo para o mundo. Ele cumprimentava cada um como se fosse fácil ser sociável. Como se ele não tivesse o mesmo lado podre que eu conhecia tão bem. E eu fiquei ali, do lado dele, com um vestido vermelho que ele mesmo escolheu uma vez, dizendo que me fazia parecer perigosa.
— Vai querer beber algo? — ele perguntou, com um sorriso de canto, olhando pro meu copo vazio.
Neguei com a cabeça. Se eu bebesse, talvez não conseguisse esconder o que já estava me corroendo.
Foi quando ela chegou. Uma mulher de riso fácil demais, ombros descobertos, voz leve como uma ameaça disfarçada. Ela tocou o braço dele ao cumprimentá-lo. Ele riu de algo que ela disse. Eu queria derramar meu vinho na cara dela, mas eu nem estava bebendo.
O ciúmes não é uma coisa que grita. Ele sussurra. Ele me dizia que ele ia embora, que ela era mais leve, mais fácil de amar. E enquanto isso, eu sorria, fazia pose e cruzava as pernas com classe.
A mão dele encostou na minha cintura uma ou duas vezes. Mas não era sobre carinho. Era como se ele estivesse me lembrando que eu ainda estava ali. Que eu ainda era dele. Mesmo que por pouco tempo.
Voltamos pra casa em silêncio. O carro parecia pequeno demais pra tanta tensão. Eu sabia que ele tinha percebido. Ele sempre percebe. Mas ele não perguntou nada. Nunca pergunta. Ele gosta de tirar as respostas com os dedos, com os olhos, com os dentes.
Entrei primeiro. Tirei os saltos. Fiquei na sala, esperando ele subir. Mas ele subiu devagar. Como se tivesse certeza do que ia acontecer. Como se estivesse dando tempo pra mim me preparar.
Quando entrou no quarto, eu já estava sentada na cama, de costas pra ele.
— Vai fingir até quando? — ele perguntou, sem raiva. Mas sem doçura também.
— Não sei do que está falando.
Ele deu uma risada curta, tirando a camisa enquanto vinha em minha direção.
— Você não gosta quando eu rio de outras mulheres. Né?
— Você acha que eu sou idiota?
— Não. Eu acho que você quer ser a única coisa que eu vejo.
— E você não quer?
Ele me encarou. Aquele olhar frio e quente ao mesmo tempo. Me empurrou leve até eu cair deitada. Subiu em cima de mim, com o corpo já quente demais.
— Eu quero. Mas você precisa ser lembrada disso, não é?
Eu não respondi. Porque sim, eu queria ser lembrada. Porque sim, eu queria que ele me possuísse como se eu fosse um castigo e uma oração ao mesmo tempo.
O sexo foi um tipo de punição. Daquelas que a gente suplica. Ele era firme, exigente, quase cruel. E eu deixava. Porque ali, naquela cama, com ele me puxando pelos cabelos e me mordendo como se minha pele fosse dele por direito, eu me sentia viva. Eu me sentia escolhida.
Quando ele gozou, com a respiração descompassada e o corpo colado no meu, eu quis chorar. De medo. De prazer. De saber que eu nunca mais ia conseguir amar de outro jeito.
Ficamos em silêncio. Ele passou a mão nas minhas costas, como se dissesse "acabou". Mas nunca acaba. Com ele, nunca acaba.
E eu pensei, enquanto encarava o teto: talvez eu esteja presa. Mas se essa é a prisão, que me joguem a chave fora.
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Atualizado até capítulo 54
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