Coincidência

Narrado por Felipe Castellani

O hotel era confortável, discreto, exatamente como eu exigia. Cobertura no centro de Bellagio, vista privilegiada para o Lago… e nenhuma distração além da que já estava me consumindo.

Me sentei no sofá, a bebida esquecida sobre a mesa, os olhos fixos na escuridão da janela.

Ela.Angelina Novak.

Os traços delicados, a maneira doce de tentar disfarçar o nervosismo, aquele sorriso treinado para lidar com qualquer cliente… mas que fraquejou quando me olhou nos olhos.

Ela tem o tipo de beleza que não combina com o mundo ao qual eu pertenço. Mas isso nunca me impediu de querer algo.E quando eu quero… ninguém me impede.

Victor entrou no cômodo, sempre eficiente, um tablet em mãos e aquela expressão controlada que o acompanha desde que trabalha comigo.

Victor - As informações chegaram — anunciou, entregando o aparelho com os dados completos.

Passei os olhos pelas primeiras páginas. Dados básicos, familiares, situação financeira… tudo como imaginei.Mas então… outros nomes me chamaram atenção.

Felipe - Karolaine Mendes — li em voz alta, os olhos passando pela ficha. — Melhor amiga, um ano de diferença, cresceram juntas… leal, impulsiva… essa pode ser útil… ou um obstáculo.

Victor assentiu.

Victor - A amiga é esperta, observa tudo, defende ela. Mas nada que impeça um bom plano. — completou com neutralidade.

Continuei deslizando o dedo pelo relatório até outro nome saltar à tela.

Eduardo Ferraz.

Ex-namorado. Traidor. Canalha.

A ficha dele falava por si só. Mentiroso, histórico de enganar, de se aproveitar… típico verme escondido em cidade pequena.

Senti o maxilar travar por um segundo, os dedos apertando o tablet.

Felipe - Esse… ainda tem acesso à vida dela? — perguntei, o tom mais cortante do que pretendia.

Victor deu de ombros.

Victor - De vez em quando aparece, tenta se reaproximar. Parece que ela ainda tá ferida pela última traição.

Assenti, absorvendo cada palavra.

Ela estava vulnerável…O coração em ruínas…

O orgulho machucado…

Melhor assim.Mais fácil para mim.Mais fácil para fazer com que ela me enxergue… antes que qualquer outro ouse tentar.

Apertei os olhos, um sorriso discreto se formando.

Felipe - Quero ele fora do caminho. Sem vestígios, sem barulho… e quero essa tal Karolaine sob vigilância.

Victor - Entendido — Victor respondeu.

Angelina Novak pode não ter percebido ainda…

Mas ela já está presa no meu jogo.

E eu…

Já estou decidido a vencer.

Narrado por Angelina Novak

Acordei antes do despertador, o corpo cansado, mas a mente inquieta.Tomei banho, vesti o uniforme simples da loja jeans justo, camiseta preta com o nome da empresa bordado no peito deixei os cabelos soltos caindo sobre os ombros e passei um gloss discreto, só para não parecer tão abatida.

Mas era impossível ignorar o turbilhão na cabeça.

O homem de ontem…A presença dele…O olhar dele…

Sacudi a cabeça, repreendendo meus próprios pensamentos. Homens bonitos aparecem e vão embora. A vida segue.

Peguei a bolsa e saí de casa, as ruas estreitas de Bellagio ainda calmas naquela manhã fria. O Lago refletia o céu cinzento, turistas começavam a circular, cafés abrindo as portas, o cheiro de pão fresco e café se misturando no ar.

Estava distraída, ajustando a alça da bolsa, quando senti…O mesmo arrepio na nuca.

Aquela presença densa, intensa… familiar demais para ser coincidência.

Levantei os olhos e lá estava ele.O homem do terno impecável, a barba perfeitamente alinhada, o olhar escuro, intenso, como se me despisse só com os olhos.

Meu corpo inteiro travou por um segundo.

Droga.

Ele sorriu, daquele jeito perigoso demais para essa cidade, e se aproximou, mãos nos bolsos, o andar calmo, calculado.

— Que coincidência… — disse, a voz rouca, carregada de um sotaque discreto, os olhos cravados em mim.

Coincidência?

Duvido.

Forcei um sorriso, ajeitando a bolsa no ombro, tentando parecer natural, mesmo sentindo o coração martelar no peito.

Angelina - Bellagio é pequena… — desconversei, dando um passo para o lado, sem permitir que ele se aproximasse demais.

Angelina - Não é tão difícil esbarrar nas pessoas por aqui.

Ele soltou uma risada baixa, os olhos passeando pelo meu rosto, pelo meu corpo… sem nenhuma pressa, como se me analisasse.

— Não imaginei que te encontraria de novo tão cedo… mas fico feliz pela sorte — completou, o olhar firme, a presença dominando o ambiente como se estivesse no próprio escritório.

Sorri de lado, desconfiada, mas decidi não prolongar.

Angelina - Preciso ir, meu turno na loja começa já já… — falei, escapando da armadilha do olhar dele e caminhando em direção ao trabalho.

Senti ele me observar enquanto me afastava, a pele arrepiando mesmo sob o casaco.

Definitivamente…Isso não era coincidência.

E ele…Era perigoso demais para mim.

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