Bonito demais

Narrado por Angelina Novak

Ele me olhava como se enxergasse além da pele, além do sorriso treinado… como se já soubesse o que eu escondia.Mas eu não escondia nada.

Minha vida era tão simples quanto essa loja.

Mesmo assim, o olhar dele me fazia querer disfarçar o nervosismo. Respirei fundo e mantive o sorriso, fingindo que aquele homem absurdamente bonito não estava me desconcertando.

— Angelina. — respondi finalmente, o nome saindo firme, mas os olhos… bom, os olhos não conseguiam negar o quanto ele mexia comigo.

Angelina- Angelina Novak.

Ele repetiu meu nome baixinho, como se saboreasse cada sílaba. O estômago revirou. Droga… eu precisava manter o controle.

Passei a máquina de cartão, finalizei a compra com eficiência, mesmo sentindo o peso do olhar dele sobre mim o tempo todo. Era como se o ambiente inteiro tivesse desaparecido só existíamos nós dois ali.

Ele pegou o pacote, as mãos grandes e elegantes quase tocando as minhas, mas parou no limite… provocando sem precisar ser óbvio.

— Foi um prazer conhecê-la, Angelina Novak. — disse meu nome inteiro, o sotaque carregado tornando cada palavra ainda mais intensa, mais perigosa… mais marcante.

Sorri, mantendo o tom leve, mesmo que a pele estivesse arrepiada.

Agelina - Digo o mesmo… — pausei, inclinando sutilmente a cabeça — mesmo sem saber seu nome.

Ele sorriu, aquele sorriso perigoso, como se aquilo fosse parte do jogo. Mas ao invés de responder, apenas me lançou um último olhar demorado… e saiu da loja, como se soubesse exatamente o efeito que tinha causado.

O sino da porta tocou.E eu fiquei ali, sozinha, com o coração disparado… sem nem imaginar que aquele homem…Era perigoso demais para mim.

Narrado por Felipe Castellani

Saí da loja sentindo o olhar dela me acompanhar até a porta.Ótimo.Ela começou a perceber… ainda que não tenha a menor ideia do que está prestes a acontecer.

Andei pela calçada sem pressa, o embrulho ridículo da loja na mão. Não precisava daquilo, nunca precisei. Mas era a desculpa perfeita para me aproximar, ouvir a voz dela, sentir o cheiro, observar de perto o que já me pertencia mesmo que ela ainda não soubesse.

Victor me esperava encostado discretamente em um dos carros, atento como sempre.Entreguei o embrulho para ele, sem me importar com o conteúdo.

Felipe - Jogue fora. — ordenei seco, enquanto a porta do carro se abria e eu entrava no banco de trás.

Victor fez o que pedi, entrando logo depois e ocupando o banco da frente.O motorista arrancou com o carro em direção ao hotel, e foi só quando estávamos a alguns quarteirões dali que voltei a falar:

Felipe - Descobriu o que pedi? — perguntei, ajeitando o paletó e encarando o reflexo da cidade pequena que desaparecia pela janela.

Victor não demorou.

Victor - Angelina Novak. Vinte e cinco anos. Natural daqui mesmo, Bellagio. Filha única, mãe viúva, trabalha desde os dezoito para sustentar as duas, já que o pai morreu cedo — listou os dados com eficiência, enquanto eu absorvia cada palavra.

Victor - Mora em um bairro simples, sem envolvimento com ninguém relevante, vida comum… até onde parece.

Assenti, processando as informações.

Órfã de pai, criada pela mãe, trabalhando para sobreviver…Inocente, mas com aquela aura de força escondida, o suficiente para me interessar.

O tipo de mulher que o destino normalmente não colocaria no meu caminho… mas o destino não dita minhas regras. Eu faço isso.

Felipe - Continue observando. Quero mais detalhes… rotina, amigos, fraquezas. — finalizei, os olhos ainda voltados para a rua. — E quero o relatório completo ainda hoje.

Victor assentiu, já pegando o celular.

Angelina Novak…Ela entrou no meu radar.

E ninguém entra… sem que eu decida o que acontece depois.

Narrado por Angelina Novak

Ele já tinha ido embora.O sino da porta tocou, o som dele se afastando sumiu pelas ruas, e ainda assim… a sensação permaneceu.

Respirei fundo, tentando retomar o foco, mas o clima dentro da loja não ajudava.As meninas cochichavam, riam, faziam piadinhas baixas o suficiente para parecerem inocentes mas eu conhecia bem aquelas provocações.

Sofia Ele ficou interessado em você, Angelina… — sussurrou Sofia, uma das atendentes mais novas, mal conseguindo esconder o entusiasmo. — Você viu como ele olhava?

Fingi um sorriso, balançando a cabeça, tentando cortar o assunto.

Angelina- Só fui simpática, como sou com todos — desconversei, ajeitando algumas peças nas prateleiras, mesmo que minhas mãos ainda estivessem um pouco trêmulas.

Angelina - Deve ser só mais um turista curioso.

Mentira.Ele não parecia um turista.Não agia como um.Não olhava como um.

Mas eu precisava me convencer de que era só isso.O homem perfeito demais, elegante demais, que me encarou como se… me conhecesse, já tinha ido embora.

Voltei para casa mais cedo, o turno na loja estava calmo e minha cabeça, confusa demais.Quando cheguei, o céu de Bellagio já estava pintado em tons alaranjados, o Lago refletia a luz suave do entardecer… e Karolaine estava largada no sofá como se morasse ali.

Nada fora do normal.

Karolaine - Finalmente! — ela reclamou, erguendo os olhos do celular. — Cidade parada, e você some.

Joguei a bolsa no canto, chutando os sapatos, exausta.

Angelina - Trabalho, Karol… normal. Só teve um cliente… diferente hoje.

Ela me encarou com aquele olhar maroto, já farejando fofoca.

Karolaine - Diferente como? — ela provocou, rindo.

Suspirei, me jogando na poltrona.

Angelina - Bonito demais… elegante demais… parecia saído de uma revista. — Dei de ombros, tentando parecer indiferente.

Angelina - Mas só foi simpático, comprou uma besteira qualquer e foi embora. Nada demais.

Karolaine riu, divertida.

Karolaine - Hum… cidade parada o caramba. Vai ver, ele volta. Vai ver… ele gostou do que viu.

Revirei os olhos, mas o frio na barriga voltou.