Capítulo 3 – Onde o Medo Dorme
[Cenário: Subsolo da mansão Moretti – porão usado para interrogatórios, punições e segredos. O teto é baixo, as paredes de pedra antiga úmidas. Iluminação fria e artificial. Cheiro de metal, cigarro e sangue ressecado no ar.]
Salvatore caminha à frente, os passos lentos e pesados ecoando no corredor estreito. Elia o segue, mais sério desta vez. Atrás deles, em silêncio tenso, vem o capanga de confiança: Rocco, alto, forte, barba cerrada, olhos de aço. O olhar dele nunca desgruda de Elia.]
Elia Russo
Elia (baixando o tom de voz):
— Então... aqui é onde os contos de fadas viram histórias de terror?
Salvatore Moretti
Sem olhar para trás):
— Aqui é onde a verdade mostra os dentes. E onde a lealdade é testada com sangue.
Rocco
Pela primeira vez, fala, com raiva contida):
— Ele não precisa ver isso. É um lixo enfiado aqui só porque sabe brincar com códigos e cuspe.
Salvatore Moretti
(para, vira-se lentamente para Rocco):
— Está questionando minha decisão?
Elia Russo
Intervém com um sorriso venenoso):
— Agradeço o ciúme, Rocco. Mas o Don sabe muito bem me proteger... e me usar, se quiser.
Rocco
(dá um passo à frente, os olhos cravados em Elia):
— Um passo em falso e eu arranco sua língua, loirinho.
Elia Russo
(sem recuar):
— Que romântico. Só faltou flores.
[Salvatore ergue a mão. Rocco se afasta, relutante, com os punhos fechados. Eles seguem. Chegam a uma porta de ferro, trancada com código e biometria. Salvatore digita e entra.]
[Interior: Um cômodo com cadeira metálica no centro, correntes, instrumentos de tortura modernos e antigos, e uma única luz pendendo do teto. Um homem machucado está desacordado num canto. Sangue seco no chão.
Salvatore Moretti
(Olhando para Elia):
— Bem-vindo ao coração da serpente. Nem todo segredo pode ser apagado com um clique.
Elia Russo
(Observa tudo com olhos atentos, mas firmes):
— Você faz isso com frequência?
Salvatore Moretti
— Com precisão. E sem prazer. Tortura é apenas uma linguagem... como o seu código.
[Rocco fecha a porta atrás deles. O som ecoa como um aviso.]
Rocco
— Ele vai vomitar em cinco minutos.
Elia Russo
(olhando diretamente para o homem no chão):
— Quem é ele?
Salvatore Moretti
— Um traidor. Tentou vender nomes da minha família para a polícia de Roma. Foi capturado ontem à noite.
Salvatore Moretti
(olha sério):
— Ainda não. Preciso que ele conte tudo. E às vezes... um grito diz mais que mil palavras.
[Salvatore se aproxima da cadeira, encosta nela. Um silêncio cruel se instala.]
Salvatore Moretti
— Você queria saber o que há por trás do meu mundo. Está olhando. Este é o lugar onde se escolhe entre o amor e o medo. Entre viver sob meu nome... ou morrer esquecido em um buraco.
Elia Russo
(voz firme, mas mais baixa):
— E onde você está, Salvatore? Amor ou medo?
[Silêncio. Salvatore ergue o olhar lentamente. Algo em sua expressão muda. Como se a pergunta o tivesse tocado num ponto que ele mesmo evita.]
Rocco
(rosnando):
— Já chega. Ele não tem o direito de falar assim com você.
[Num gesto súbito, Rocco empurra Elia contra a parede com força, segurando-o pela gola. Elia bate a cabeça, mas não demonstra dor. Salvatore apenas observa.]
Rocco
(gritando, quase cuspindo):
— Você não pertence aqui! Você é só um brinquedo sujo, uma distração temporária! Quer ver sangue? Vai ver o seu!
Elia Russo
(com a respiração pesada):
— E você é o cachorrinho ciumento... que late porque sabe que nunca será tocado como eu fui.
[Silêncio total. Rocco ergue o punho, pronto para bater. Mas antes que atinja Elia, Salvatore avança e segura o braço dele com força brutal.]
Salvatore Moretti
(frio, cortante):
— Solte. Agora.
[Rocco hesita, depois obedece, os olhos cheios de fúria e dor. Elia cai de leve no chão, tosse. Salvatore o encara por um segundo, e então se vira para Rocco.]
Salvatore Moretti
— Vá para a ala externa. Agora.
Rocco
— Ele vai acabar te destruindo.
Salvatore Moretti
(calmo):
— Talvez. Mas não será você quem vai impedir.
[Rocco sai, batendo a porta. Elia se levanta com dificuldade. Passa a mão pela boca e observa Salvatore em silêncio.]
Elia Russo
(fraco, mas ainda provocativo):
— Não sabia que causava tanto desconforto só com palavras.
Salvatore Moretti
(se aproximando, com um olhar sombrio):
— Você causa mais do que isso.
— E o que me assusta... é que eu começo a gostar.
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