Onde a Alma Respira

Capítulo 3

O carro seguia devagar por uma estrada estreita, ladeada por ciprestes altos e elegantes. Giulia observava pela janela, fascinada. A vila de Monteverdi surgiu como um quadro emoldurado pela natureza — telhados de cerâmica, muros de pedra cobertos por heras verdes, pequenas sacadas floridas, e o som dos sinos da igreja ecoando suavemente ao longe.

Era como entrar em um livro antigo. Ou melhor: em um sonho que finalmente se tornava realidade.

O motorista estacionou diante de uma construção charmosa, de dois andares, com janelas arqueadas e flores pendendo por todo lado. Uma plaquinha escrita à mão, em italiano, balançava ao vento: "Pensione Fiorella – Benvenuti".

— Chegamos, signora — disse o motorista, sorrindo.

Giulia agradeceu e desceu do carro com um leve tremor nas mãos. Era o cansaço. Era o medo. Mas também era a emoção. Aquela pousada parecia tirada de um filme antigo, com sua fachada colorida em tons terracota, jardineiras de lavanda, e uma varanda repleta de mesinhas de ferro com toalhas floridas.

A porta rangeu levemente ao se abrir, e uma senhora baixa, de cabelos brancos presos num coque perfeito, surgiu com um sorriso doce no rosto.

— Buongiorno, signora! A senhora é Giulia Santoro?

— Sim… sou eu.

— Bem-vinda a Monteverdi. Eu sou Fiorella, a dona da pousada. Seu quarto já está pronto. Venha, por favor.

O interior da pousada era aconchegante, com móveis rústicos, fotos antigas nas paredes e cheiro de bolo recém-assado no ar. Giulia seguiu a anfitriã pelas escadas de madeira, sentindo os passos ecoarem como batidas de um novo coração. Subiram até o segundo andar, e Fiorella parou diante de uma porta azul-clara.

— Esta é sua suíte. Com vista para o coração da vila.

Ao abrir a porta, Giulia sentiu um arrepio. O quarto era simples, mas cuidadosamente arrumado: uma cama grande com lençóis de linho branco, um pequeno armário de madeira escura, e uma escrivaninha com uma jarra de vidro cheia de flores frescas. As janelas estavam abertas, deixando entrar o perfume do campo.

Ela deixou a mala encostada no canto e caminhou devagar até a sacada.

Ao abrir as cortinas e pisar no pequeno espaço, o fôlego lhe faltou por um instante.

A vila estava ali, inteira, diante de seus olhos. As ruazinhas de pedra serpenteavam entre as casinhas, os telhados cor de barro formavam um mar ondulado, e ao longe se via o verde infinito das colinas, pontuadas por parreirais e oliveiras. Pessoas caminhavam devagar, cumprimentavam umas às outras, e havia música suave vindo de alguma janela.

Giulia se apoiou no parapeito e respirou fundo.

O ar era leve. Fresco. Diferente de tudo que já havia sentido. Era como se, pela primeira vez em muito tempo, ela pudesse respirar com a alma.

As lágrimas vieram sem aviso, mas não eram pesadas como antes. Eram leves. Eram de alguém que sentia, enfim, que poderia voltar a viver.

Ficou ali por alguns minutos, deixando que aquele lugar entrasse dentro dela, como um bálsamo silencioso. Depois, voltou para o quarto, lavou o rosto e trocou de roupa. Vestiu uma calça clara e uma blusa azul suave. Prendeu os cabelos num coque solto e calçou sandálias confortáveis. Não pretendia sair ainda — queria apenas se ambientar, escutar os sons, sentir o chão.

Descendo novamente, foi recebida por Fiorella com uma bandeja de chá de camomila e biscoitos amanteigados.

— Espero que goste. Fiz hoje cedo. — disse a senhora.

— Está tudo… perfeito. A pousada, o quarto, a vista. Sinto como se estivesse num lugar que sonhei por anos.

— Muitos sentem isso quando chegam aqui — respondeu Fiorella, com um olhar terno. — Monteverdi tem alma. E costuma acolher quem chega ferido.

Giulia sorriu com os olhos marejados. Não respondeu. Não precisava.

Sentou-se na varanda da pousada e ficou ali, com a xícara nas mãos, observando a vida acontecer em outro ritmo, outro tom. Sentiu o peso da mala que deixou no Brasil, as despedidas, a culpa, a dor… e sentiu também uma presença suave, como se Daniel estivesse ali, invisível, sorrindo e dizendo:

> "Vai, Giulia. Vai viver."

E ela iria. Ainda não sabia como. Ainda não sabia quando.

Mas naquele instante, sentada diante da vila que parecia saída de um conto, Giulia fez uma promessa silenciosa:

"Vou recomeçar. Nem que seja devagar, em silêncio. Mas vou."

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