Pimenta e vinho.

 

🍷 A Douma Vermelha

O relógio marcava 14h30 quando Gabriel entrou pela porta dos fundos do restaurante, carregando uma sacola preta com o símbolo discreto de uma alfaiataria boutique.

Estava impecável: camisa social cinza-grafite, mangas dobradas, cabelos úmidos do banho recente.

Luan já o esperava, revisando mentalmente os procedimentos para a noite.

— Já está tudo alinhado. A equipe do jantar de hoje à noite sabe que você estará fora. Eu fico no comando até vocês voltarem — disse Luan, direto, mas com uma pontinha de curiosidade.

Gabriel assentiu, sem rodeios.

— Ótimo. Aqui está sua douma.

Ele estendeu uma peça sob medida, escura e elegante, com um corte reto e discreto brilho no colarinho.

— E a dela?

Gabriel apenas ergueu uma sobrancelha e puxou a outra douma da sacola:

um modelo feminino.

Tecido acetinado. Gola arredondada. Botões discretos.

A cintura levemente marcada.

Maria apareceu segundos depois, distraída, segurando um pano de prato.

— Me chamou, Chef?

Gabriel estendeu a douma para ela, sem dizer muito.

— Experimente. Vamos sair às 18h.

Ela pegou a peça com as duas mãos, surpresa.

— Essa douma é pra mim?

— Sim. O jantar exige um assistente. Só um. Eu escolhi você.

Luan, ao fundo, tentou esconder a reação. Engoliu seco, mas deu um meio sorriso — resignado.

— Tá em boas mãos. Literalmente — disse, com humor irônico, e se afastou.

Maria sumiu no vestiário.

Minutos depois, voltou. A douma estava justa nos ombros. E, principalmente… no busto.

Ela olhou para Gabriel com um leve constrangimento divertido, os cabelos soltos sobre o tecido.

— Está um pouco apertada aqui… — disse, colocando as mãos sobre os próprios seios com naturalidade, tentando esconder a tensão.

— Acho que subestimaram o tamanho.

Gabriel congelou.

Um filete de calor subiu pela nuca dele.

Olhos nos olhos.

Olhos no decote.

Olhos de volta pros olhos.

— Certo — ele disse, limpando a garganta. — Vá até a esquina, na costureira. Leve agora. Peça ajustes. Rápido.

— E… — acrescentou, o tom mais frio do que queria — tire esse batom vermelho.

Maria ergueu uma sobrancelha, surpresa.

— É demais para um jantar profissional?

Gabriel a olhou por um segundo longo, quase perigoso.

— É demais para mim.

Ela sorriu de canto.

— Entendido, Chef.

Saiu devagar, deixando a silhueta e o perfume no ar.

Gabriel passou a mão pelo rosto, exasperado.

Encostou na bancada fria de mármore.

Fechou os olhos.

Ela vai me matar.

Subchef & Chef – “Pimenta e Orgulho”

A cozinha do restaurante estava em silêncio momentâneo, exceto pelo som do motor refrigerado do veículo utilitário que Luan estacionava nos fundos. Era um furgão preto, com o logo do restaurante, placas atualizadas e um compartimento interno refrigerado. Tudo estava impecável: ingredientes embalados a vácuo, utensílios esterilizados, mise en place separado por etapa.

Luan entrou na cozinha, limpando as mãos no avental, e encontrou Gabriel conferindo anotações em seu celular. O chef estava encostado na bancada com a mesma tranquilidade arrogante que sempre usava quando queria provocar.

— Tudo pronto? — perguntou Gabriel, sem tirar os olhos do celular.

— Sim. Inclusive o transporte.

Preparei o veículo da casa, com tudo que você precisa. Organizei os ingredientes por temperatura, etiquetei os molhos, e... até deixei o vinho decantando em caixa especial.

Gabriel apenas ergueu um olhar breve.

Fechou o celular e disse, com voz baixa:

— Não vou usar.

Luan piscou.

— Desculpa?

— O carro. Não vou usar o furgão do restaurante.

— Vai levar os ingredientes como, então? Equilibrando potes no colo da Maria?

Gabriel ergueu uma sobrancelha.

O golpe havia sido direto — e certeiro.

— Eu vou no meu carro. Pessoal. Espaçoso. Confortável.

Acho que isso vai deixar a Maria mais... à vontade.

Silêncio.

Tenso. Cortante como uma faca recém-afiada.

— Isso não é um encontro, é um jantar profissional — retrucou Luan, firme.

— E o restaurante tem uma reputação a manter. A imagem importa, Chef.

Gabriel sorriu. Um sorriso sem humor.

— A imagem está sob controle, Subchef.

— E quanto ao profissionalismo… — ele se inclinou um pouco pra frente — Maria sabe exatamente separar as coisas.

Luan cruzou os braços. O maxilar travado.

— Não parece, quando ela te chama de “chef” com aquele sorrisinho.

Você devia prestar mais atenção em como isso soa... pra quem está ouvindo.

— E você devia prestar mais atenção em como isso soa... pra quem está escolhendo — retrucou Gabriel, afiado.

Mais silêncio.

Os dois homens se encararam. A tensão era quase física, como vapor preso sob a tampa de uma panela.

— Se ela for no seu carro, você assume a responsabilidade — disse Luan, seco.

— Pela imagem. Pelo atraso. E por qualquer outra... consequência.

Gabriel deu um passo para o lado, já de saída.

— Assumo tudo.

— Inclusive o prazer de vê-la entrar no carro com aquele vestido ajustado.

— Agora, se me der licença… vou escolher o vinho.

E saiu.

Luan ficou parado por um segundo. Os olhos ardiam de raiva contida.

Ele chutou o pano de prato caído no chão.

— Filho da puta.

 

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