🍽️ – O Silêncio de Luan
Luan cortava chalotas com a precisão de quem já não precisa pensar no movimento — mas, naquele momento, pensar era impossível. Seus olhos voltavam, sempre, para a candidata que chegara atrasada, com um batom vermelho que parecia não pedir desculpas por existir.
Maria.
Ela cortava pimenta dedo-de-moça como quem escrevia poesia com faca.
E ela sorria… para o chef.
Para o Gabriel.
Luan conhecia aquele olhar no chefe. Ele já o tinha visto de todas as formas: impaciente, controlador, obcecado pela simetria perfeita. Mas não aquele olhar. Aquele olhar era lento. Quente. Quase perigoso.
E Maria devolvia o olhar como se soubesse o que fazia.
Luan franziu o cenho.
Não era ciúmes — ele não sabia o que era ainda. Mas sentiu algo que escorreu pelas costelas feito molho quente. Uma inquietação. Um susto interno.
O aroma do prato dela tomou conta do ambiente.
Mel, limão, arroz de coco... e pimenta.
Era doce, ácido e provocante. Era ela, em forma de prato.
E o Gabriel… comeu. Mastigou devagar, como se estivesse perdendo uma guerra que se recusava a admitir.
Maria falava com ele como se fosse igual.
Como se não visse a muralha que Gabriel era para todos os outros.
Como se quisesse incendiar a cozinha inteira, só pra ver o que ele faria.
E Luan não sabia por quê, mas isso o mexia também.
Quando ela lambeu o dedo no final, o som do gesto foi tão sutil… e tão indecente… que ele perdeu o ritmo da própria respiração. Uma colher caiu da mão dele e quicou no chão de inox com um tin irritante.
— Droga — sussurrou.
Gabriel saía da bancada, tenso, calado.
Maria recolheu o prato, cheia de si. E Luan olhou para ela como quem olha um problema que ainda vai tirar o sono.
Ele não sabia se queria devora-la… ou provar o que ela cozinhava.
E esse era o começo do seu problema.
Creme Brûlée com Flor de Sal
("Dura por fora, cremosa por dentro. Igual ao Chef.")
A Cozinha Vazia, o Silêncio Tenso… e a Vingança Doce
Após a entrevista, todos os candidatos foram dispensados. Todos… menos Maria.
Gabriel tirou o avental devagar, dobrou com precisão cirúrgica e jogou sobre a bancada.
— Você fez um prato excelente — disse, seco.
— Obrigada, chef — respondeu ela, com um sorriso que dizia eu sei.
— Mas você me provocou na minha cozinha.
— E funcionou.
Ele trincou a mandíbula. O olhar de Gabriel não era de desejo.
Era de guerra.
De alguém que quer recuperar o controle de um jogo que não deveria ter começado.
Ele apontou para a pilha de panelas e formas.
— Limpe tudo. Sozinha.
— Castigo? — Maria arqueou a sobrancelha.
— Considere um teste de resistência.
Ela pegou a esponja, ergueu o queixo.
— A que temperatura começa a tortura, chef?
Ele não respondeu. Apenas saiu, os passos ecoando no corredor de azulejos.
Mas ela sabia.
Ele voltaria.
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⏳ Uma hora depois...
A cozinha estava em silêncio. Os vidros embaçados. O chão brilhando.
Maria terminava de limpar uma travessa quando ouviu os passos novamente.
Não apressados. Não barulhentos.
Controlados.
Gabriel entrou com as mangas da camisa arregaçadas e uma tigela na mão.
— Já que ainda está aqui, vai me ajudar a preparar um novo doce para o menu de amanhã.
— A punição agora virou parceria? — ela provocou.
Ele se aproximou, colocando os ingredientes sobre a bancada de mármore fria:
Gemas de ovo. Açúcar. Creme de leite. Baunilha em fava. E um pequeno pote de flor de sal.
— Creme Brûlée — disse ele.
— Bonitinho por fora. Fogo por dentro — murmurou ela.
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🔥 O Preparo (e a tensão)
Enquanto Maria mexia o creme com uma colher de pau, Gabriel se colocou atrás dela. Perto. Muito perto.
— Mexa mais devagar. Está quebrando a textura.
— Estou seguindo meu instinto — disse ela, sem parar.
Ele se inclinou, o rosto tão perto que ela podia sentir o calor da respiração.
— Seus instintos… são um problema.
— Ou uma vantagem que você não consegue controlar, chef.
Silêncio.
Ele pegou a colher da mão dela devagar. Os dedos tocaram os dela.
Longamente.
Desnecessariamente.
Maria não recuou.
— Vai provar?
Gabriel mergulhou o dedo no creme morno e levou à boca.
Fechou os olhos por um segundo.
Depois pegou uma pitada de flor de sal, jogou sobre a superfície e passou o maçarico. A casquinha se formou, dourada, crocante, perfeita.
Ele quebrou a superfície com a colher.
O estalo preencheu o ambiente.
Ele olhou pra ela.
— Quer provar?
Ela lambeu a colher devagar.
Delicado por fora. Vulcânico por dentro.
Maria olhou para o chef, agora parado, indeciso, desejando — mas orgulhoso demais para admitir.
— Isso é uma armadilha? — perguntou ela, rindo baixinho.
— Isso é uma cozinha — ele respondeu.
— E eu sou a sobremesa?
— Você é… perigosa.
Ela se aproximou, tão perto que o calor entre eles superava o do maçarico.
— E você ainda vai me pedir em porção dupla.
Ele segurou o pulso dela. Não com força. Com firmeza.
O toque dizia: eu posso quebrar a casca.
Ela só sorriu.
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Atualizado até capítulo 37
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