"Os Pedaços da Verdade"

Quando chegaram ao orfanato, Liz percebeu que o lugar onde vivia não era tão longe da Itália. Mia explicou que a França faz fronteira com a Itália, por isso não precisaram ir de avião — era possível ir de carro.

Liz desceu do carro e encarou a porta do orfanato. Seu coração doía por estar ali, mesmo sabendo que tinha um pai vivo. Uma lágrima caiu, mas ela a limpou rapidamente ao ver uma senhora sair do prédio.

Sara, que cuidava do orfanato, havia visto Mia pela janela e correu para recebê-la.

— Mia, que bom que chegaram. Já preparei um quarto para a menina Liz — disse Sara com simpatia.

— Que bom, dona Sara — respondeu Mia, sorrindo, e aproveitou para apresentar Liz.

— Olá — disse Liz timidamente, mas Sara conseguiu ouvir.

— Você deve estar cansada, menina Liz. Que tal entrarmos? As outras crianças já estão dormindo — convidou Sara, levando-as para dentro.

Ao entrar no orfanato, Liz foi tomada por um sentimento de solidão. A ficha caiu: ela estava sozinha. Sara a convidou para jantar, mas Liz recusou, dizendo que não estava com fome.

Subiram para os quartos, e Sara levou Liz até o seu, onde ficaria até ser adotada por uma nova família. Mia observava Liz atentamente desde o momento em que entraram.

— Agora você vai descansar — disse Mia, com o coração apertado.

— Tome um banho. O banheiro fica logo ali. Já deixei roupas separadas para você — explicou Sara, e Liz apenas assentiu com a cabeça.

Assim que deixaram Hanna à vontade, Mia e Sara seguiram para o escritório. Antes que Sara se sentasse, Mia falou séria:

— Eu vou adotar a Liz.

— A menina deve ter sofrido muito, não é? — comentou Sara com tristeza.

— Os vizinhos disseram que a mulher que cuidava dela a maltratava... não fisicamente, mas psicologicamente — disse Mia, visivelmente abalada.

— Tem mulheres que não nasceram para ser mãe — respondeu Sara, suspirando.

— E tem mulheres que nasceram para ser mães e não podem — completou Mia, falando de si mesma.

— Você sabe algo sobre o pai da Liz? — perguntou Sara.

Mia levantou-se, andou de um lado para o outro e respirou fundo.

— Trouxe uma pequena caixa que a antiga tutora dela guardava. Não abri, porque é da Liz. Talvez tenha algo sobre o pai dela ali.

— Já está tarde. Que tal descansarmos? Seu marido deve estar esperando em casa — sugeriu Sara, tentando amenizar o clima.

Enquanto isso, no banheiro, Liz tentava controlar sua respiração. Sentia o coração apertar cada vez mais. Sentou-se no chão frio, colocou a mão no peito e tentou contar até dez, mas não adiantava. Pegou sua mochila, encontrou seus remédios para ansiedade e tomou dois. Aos poucos, sua respiração foi se normalizando.

Ela levantou-se, entrou no box e ligou o chuveiro. Debaixo da água, desabou. Chorou por tudo: pela mãe que nunca conheceu, pelo pai que a abandonou, por estar sozinha. Soluçava. Quando terminou, desligou o chuveiro, enxugou-se, vestiu a roupa e se olhou no espelho. Tocou a marca de nascença e, nesse instante, as lágrimas voltaram.

Do lado de fora, Lia, sua nova colega de quarto, escutava tudo. Voltou silenciosamente para sua cama quando ouviu a porta se abrindo. Liz saiu, ainda atordoada pelos remédios, e deitou-se na cama, exausta mentalmente.

Mais tarde, Mia passou no quarto antes de ir embora. Viu Liz dormindo e sorriu junto a Sara. Antes de sair, deixou a caixinha sobre a mesinha ao lado do abajur e o desligou.

Em casa, Mia encontrou Caio dormindo no sofá. Sorriu, acordou-o e foram juntos para o quarto. No dia seguinte, teriam muito o que resolver.

 

Na manhã seguinte, Liz acordou desorientada. Sentou-se na cama e aos poucos lembrou-se de tudo. Viu a caixa ao lado e a colocou sobre o colchão. Percebeu que sua colega de quarto já não estava ali. Então decidiu abrir a caixa.

Dentro, encontrou uma foto de um homem bem vestido. “Quem será ele?”, pensou. Colocou a foto de lado e encontrou uma carta escrita por Cinthia.

> “Olá, querida Liz.

Se você está lendo essa carta, provavelmente eu já estou morta. Queria explicar algumas coisas que estão dentro dessa caixinha misteriosa, hahaha.

A foto que está aí é do seu pai biológico. O homem que desprezou sua mãe. O homem que te odiou antes mesmo de te conhecer.

O nome dele é Lion Moretti. Ele é CEO de uma empresa de segurança. Em resumo: é milionário. Por isso não quis uma bastarda como filha.

Sua mãe era apenas uma garçonete.

Para confirmar, deixei um teste de DNA aí também.

Fiz isso caso um dia você queira conhecê-lo.

Beijos,

Cinthia.”

Liz pegou novamente a foto e a rasgou em pedacinhos — do mesmo jeito que sentia seu coração: despedaçado. As lágrimas caíram sobre os fragmentos.

— Eu te odeio. Te odeio, Lion! — gritou, chorando.

— EU TE ODEIO! EU TE ODEIOOO! — gritou novamente, num choro de dor.

Sara, ouvindo os gritos, pediu para ninguém sair da cozinha, onde as outras crianças tomavam café. Pediu a Miriã que ligasse urgente para Mia.

Na casa de Mia, ela acordava ao lado de Caio. Quando desceu para o café, o telefone tocou. Era o orfanato. Ela atendeu, estranhando o horário.

— Senhora Mia, venha urgente. É sobre a menina Liz — disse Miriã, aflita.

— Já estou indo — respondeu Mia, com o coração apertado. Virou-se para Caio, chorando.

— É a Liz. Aconteceu alguma coisa.

— Eu vou com você — disse Caio, pegando as chaves.

 

Sara abriu a porta do quarto e encontrou Liz encolhida no canto, chorando. Sentou-se ao lado dela, pegou sua mão e a fez sentar. Recolheu os pedaços da foto e da carta rasgada, juntando-os e guardando em seu bolso.

Liz olhou para Sara com os olhos vazios, cheios de dor.

— Eu deveria odiá-lo... mas não consigo — disse, balançando a cabeça.

— Você é boa demais, menina. O ódio só adoece a gente. Sei que está magoada, mas lembre-se: toda história tem dois lados — disse Sara, fazendo um carinho em sua cabeça.

Nesse momento, Mia entrou no quarto, com Caio atrás. Ao ver o estado de Liz, correu para abraçá-la.

— Eu estou aqui, Liz — disse Mia, apertando-a.

— Olá, Liz. Sou Caio, marido da Mia — apresentou-se, com gentileza.

Quando Liz se acalmou, foram até a cozinha, que estava vazia. Liz recusou a comida e foi até o jardim. Mia e Caio foram conversar com Sara no escritório.

— Se realmente querem adotá-la, peço que agilizem o pedido. Liz já tem 15 anos e aqui só ficam crianças pequenas — explicou Sara.

O orfanato era simples, para crianças até 10 anos. Antes de Mia aparecer, Liz iria para um internato na Suíça.

— Nós vamos adotá-la, dona Sara — garantiu Caio.

— Vamos resolver tudo hoje mesmo — confirmou Mia.

— Ótimo. Eu temo por ela. Essa mulher causou muito estrago — disse Sara, preocupada.

— Fique de olho nela até o pedido sair — pediu Caio.

Sara assentiu e saiu com o casal à procura de Liz.

No jardim, Liz observava duas meninas brincando e alguns garotos jogando futebol. Estava distraída quando Lia se aproximou e sentou ao seu lado.

— Olá, sou a Lia. Prazer — disse, estendendo a mão. Liz aceitou o gesto.

— Prazer, Lia. Como já sabe, sou Liz — respondeu, voltando os olhos para o campo.

— Eu vi seu ataque de pânico ontem... e hoje também — comentou Lia sem rodeios. Por ser nova, ainda não sabia como tratar assuntos delicados.

Liz abaixou a cabeça, constrangida.

— Eu entendo. Aconteceu comigo no meu primeiro dia aqui. Você perdeu sua mãe? Seu pai? — perguntou.

— A maioria aqui perdeu os pais por causa de dívidas com facções.

— É... eu perdi — respondeu Liz, sem coragem de dizer que foi abandonada.

O silêncio se fez. A palavra “abandono” gritava na mente de Liz. Era uma dor silenciosa, cruel.

Enquanto isso, no escritório, Sara guardava os pedacinhos da foto. Em seu íntimo, sabia que um dia teria que montá-la de volta. Aquele homem ainda faria parte da história de Liz.

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!