O dia amanheceu nublado. Choveu a noite inteira, e mais uma vez, Liz passou horas acordada, observando a água cair do céu através da janela. Lentamente, ela se levantou do pequeno sofá em seu quarto e foi em direção ao banheiro.
Após se arrumar para ir ao colégio, Liz parou diante do espelho. Sempre que se olhava, levava a mão ao pescoço, sobre a marca de nascença. Perguntava-se, em silêncio, quem da sua família também a tinha — seu pai? Sua mãe?
Cinthia, sua tia, nunca falava sobre isso. Sempre que Liz perguntava, a resposta era a mesma: que ela era fruto de uma aposta idiota, feita por seu pai com os amigos, para tirar a virgindade de uma nerd da faculdade. E quando sua mãe contou que estava grávida, ele simplesmente pediu que abortasse.
Com a mão ainda sobre o pescoço, Liz murmurou:
— Então... eu nunca fui desejada — disse, com tristeza nos olhos.
Naquela manhã, Cinthia acordou com fortes dores pelo corpo, tossindo sangue, e correu para o banheiro. Após o acidente que provocou anos atrás, levou Hanna a um hospital particular da família. Durante a internação, o médico da confiança de Cinthia descobriu um calombo na parte de trás da cabeça da menina. A tomografia revelou uma hemorragia cerebral.
Uma cirurgia de emergência foi realizada. Hanna, com apenas três anos, entrou em coma. Aproveitando-se da situação, Cinthia modificou os documentos da menina enquanto ela ainda estava inconsciente. As chances de sobrevivência eram mínimas. Mas, contra todas as expectativas, Hanna despertou um ano depois — desorientada, sem entender onde estava ou o que havia acontecido. Ao ver Cinthia, chamou-a de “mamãe”.
Cinthia não gostou, mas também não a corrigiu. Até os dez anos de idade, Hanna continuou chamando Cinthia de mãe. Então, naquele aniversário, a verdade foi dita: Cinthia não era sua mãe, apenas a melhor amiga da verdadeira. Agora, com 15 anos, Hanna a chamava apenas de Cinthia.
Cinthia sorriu perversamente diante do espelho. Criar a filha da sua maior inimiga fora parte de sua vingança. Agora, com o diagnóstico de um câncer terminal, sabia que não tinha muito tempo. Estava pronta para concluir o que havia começado.
Pouco tempo antes, havia ido atrás de Lion.
— Olá, Lion — disse ela, esperando por ele em frente à empresa.
— O que você está fazendo aqui? — respondeu ele, com desprezo nos olhos.
Ela engoliu seco.
— Soube da sua perda... — fingiu empatia.
— E você achou que isso me faria voltar pra você? — disse Lion, rindo com sarcasmo. — Sério mesmo?
Ele se aproximou, o suficiente para que os outros ouvissem:
— Você me dá nojo. É desprezível. Tenho pena de você — sussurrou em seu ouvido. — Eu sei que foi você quem matou a Amélia. Ainda não tenho provas, mas vou encontrar.
Ele saiu, deixando Cinthia tomada pelo ódio.
— Quem vai pagar por tudo é sua filha, Lion. Sua tão amada filha vai te odiar — murmurou com raiva.
Naquela manhã, depois de se arrumar, Cinthia saiu do quarto e encontrou Liz na cozinha preparando o café.
— Sabe... eu ainda não entendo por que seu pai não te quis — disse, fingindo tristeza.
Liz, ao ouvir aquilo, derramou café quente sobre a mão.
— Desculpa... — murmurou, sem encará-la.
— Sua mãe sofreu muito por ele te rejeitar. Na verdade, ela pensou em te abortar.
— O quê? — Liz arregalou os olhos, sentindo o coração apertado.
— Sim. Ela estava decidida. Mas fui eu quem não deixou — disse, observando a reação da menina.
Liz abaixou a cabeça. Tristeza era pouco para descrever o que sentia.
— Eu já vou, Cinthia — disse, saindo.
Enquanto caminhava até a escola, a revelação não saía de sua mente. Aquilo a machucava mais do que podia suportar.
Na escola, Liz mal interagia com os colegas. Era conhecida como “a órfã”. Quando foi matriculada, Cinthia chegou a pagar alunos para zombarem dela. Desde então, Liz nunca teve amigos. Na semana anterior, após ser chamada de indesejada, perdeu o controle e empurrou a garota que a insultava. Como resposta, apanhou de outras meninas.
Cinthia, por sua vez, riu ao ver Liz sair de casa apressada. Seu plano estava se cumprindo. Subiu ao quarto da menina, pegou uma mecha de cabelo e levou ao laboratório, onde já guardava fios do cabelo de Lion.
Quando o teste de DNA ficou pronto, ela sorriu. Tinha tudo o que precisava. Dirigia de volta para casa, planejando como usar aquela prova, quando não viu o sinal vermelho. Um caminhão colidiu em cheio com o carro, do lado do motorista.
Os pais de Cinthia estavam em viagem quando receberam a notícia da morte da filha. Para eles, ela era perfeita — ignoravam os horrores que ela cometia. Pegaram o primeiro voo de volta e foram direto ao hospital.
Durante a terceira aula de Liz, o diretor a chamou com urgência. Ao sair da sala, um colega a fez tropeçar, e toda a turma riu. O professor mandou que se retirasse. Com o coração apertado, ela correu até a direção.
Ao abrir a porta, viu dois membros do conselho tutelar.
— O que está acontecendo? — perguntou, com medo.
— Viemos te levar para um orfanato. A mulher que cuidava de você sofreu um acidente e faleceu no local — informou uma das conselheiras.
— O quê? Ela estava bem hoje cedo! Eu... os pais dela... eles podem ficar comigo...
— Os pais da senhora Cinthia recusaram a guarda. Você precisa vir conosco agora — completou a diretora, tentando manter a compostura.
Liz caminhou com os representantes do conselho, com o coração despedaçado. Sentia-se sozinha. Seu pai a rejeitara. Sua mãe estava morta. E agora, até a única figura que tinha desaparecera.
— Será que eu sou mesmo uma desgraça para as pessoas? — sussurrou, enquanto as lágrimas escorriam.
Do outro lado da cidade, Lion não parava de procurar por sua filha. No celular de Amélia havia fotos, anotações, pistas. Ele contratou Enzo Ferrari, um amigo influente, para ajudá-lo. Com o tempo, as pistas foram surgindo, mas logo desapareciam. Mesmo assim, nem ele, nem Enzo desistiram.
Na noite anterior, Enzo descobriu tudo: quem causou o acidente de Amélia, e quem desapareceu com Hanna. Quando contou, Lion quebrou tudo em sua sala.
— Eu vou matar aquela desgraçada — gritou, furioso.
Enzo e Caio, outro aliado, esperaram que ele se acalmasse.
— Descobri outra coisa — disse Enzo, sério.
— Fala logo — exigiu Lion.
— Cinthia morreu há uma semana. Na casa onde ela morava, não havia sinais de que vivia com uma criança ou adolescente.
— Continue procurando minha filha. Não importa quanto tempo leve — ordenou Lion, saindo.
Caio olhou para Enzo, pensativo:
— Se Cinthia estivesse com minha afilhada, ela teria escondido em outro lugar. Deve haver outro endereço.
— Vou colocar meus homens nas cidades pequenas e do interior — respondeu Enzo.
Ele saiu, deixando Caio sozinho, pensativo.
— Espero que você esteja bem, minha afilhada — murmurou Caio, saindo logo depois.
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Atualizado até capítulo 23
Comments
Maria de fatima Lucena
🥰😘 amando
2025-06-27
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