Eliza Miller...
Me lembro daquela noite como se fosse ontem. Estávamos em casa, fazendo a refeição noturna. Meu irmão estava ao meu lado, completamente distraído. Naquele tempo, eu não sabia o que estava acontecendo. Meus pais pareciam tensos e nervosos; havia medo e preocupação em seus rostos, como se algo terrível estivesse prestes a acontecer.
Cada colher de comida que colocavam na boca parecia uma despedida. Olhei firmemente nos olhos azuis da minha mãe e pude notar as lágrimas se formando. De vez em quando, a observei nos encarando. Havia medo, dor e raiva refletidos em seus olhos. Até seu sorriso não tinha brilho — era um esforço desesperado para mostrar que estava tudo bem. Papai, no entanto, permanecia calado. Seus olhos percorriam a sala e cada recanto da nossa casa, até repousarem sobre mim e meu irmão. Lembro de ter perguntado o que estava acontecendo, por que pareciam tão assustados. Mas não houve resposta imediata. Mamãe deu um sorriso forçado e disse que estava tudo bem, que estavam apenas cansados do trabalho.
Após o fim da refeição, sentei-me perto da lareira e fiquei observando o fogo dançar sobre a madeira, enquanto as brasas estalavam. Meu irmão, que era dois anos mais velho que eu, sentou-se ao meu lado e me entregou um brinquedo. Ficamos brincando até que adormeci deitada no chão.
O que vem a seguir é o que me machuca todos os dias. É o motivo da minha insônia e dos meus ataques de ansiedade. É o que me faz odiar viver cada segundo dessa minha vida mesquinha e infeliz.
Recordo de despertar com minha mãe me balançando, desesperada. Ela me puxava das cobertas e me levava para fora do quarto. Eu estava assustada e sem entender o que estava acontecendo. Ao chegarmos na sala, notei que meu pai fechava as portas e tentava bloqueá-las com qualquer objeto que encontrasse.
Ele parecia com medo. De repente, um estrondo ensurdecedor atingiu a porta, e vi os objetos usados para bloqueá-la se balançarem com o impacto. Nesse momento, senti um medo enorme crescer dentro de mim. Logo depois, outros impactos começaram, cada vez mais fortes. Meu pai correu na nossa direção e segurou meu irmão nos braços, enquanto minha mãe também me puxava violentamente até chegarmos a um quarto escuro. Papai acendeu as luzes e empurrou uma mesa, revelando uma passagem secreta.
Ele abriu uma pequena porta e, em seguida, olhou para mim e para meu irmão. Vi uma lágrima escorrer de seus olhos. Ele nos abraçou forte e disse que nos amava e que nunca deveríamos esquecer disso. Mamãe se aproximou e nós três nos abraçamos. Naquele momento, meu coração estava pesado, e eu só conseguia chorar e perguntar o que estava acontecendo. Meu irmão também chorava muito.
Então mamãe olhou nos olhos dele e o fez prometer que cuidaria de mim, que a partir daquele momento ele seria meu responsável. Enquanto falava, sua voz se tornava embargada, e suas lágrimas caíam como uma tempestade.
Ela nos deu um beijo e nos fez descer pelas escadas, com uma orientação clara: correr o máximo que pudéssemos, sem parar, sem olhar para trás — nunca.
A porta se fechou sobre nós dois. Caminhávamos por um túnel estreito. O caminho era iluminado por pequenas luzes que refletiam através das aberturas na madeira acima de nós. A cada passo, o cheiro de mofo era forte e as paredes exalavam umidade. De repente, escutamos o som de objetos caindo e gritos vindo do andar de cima. Meu irmão segurou minha mão e juntos corremos até sairmos do outro lado, que dava acesso à floresta. E corremos. Corremos feito loucos, cheios de medo e insegurança, sem saber por onde ir, nem o que estava acontecendo — ou o que havia acontecido com nossos pais.
O vento soprava sobre nossos rostos e a neblina obscurecia nossa visão. Galhos de árvores secas se quebravam a cada passo dos nossos pés.
Desci a encosta da floresta, meus pés escorregando no chão úmido e irregular. Meu irmão segurava minha mão, sua palma suada e fria. Nós dois estávamos exaustos, mas não podíamos parar. Tínhamos que encontrar um lugar seguro, um lugar onde pudéssemos nos esconder.
A floresta parecia se fechar ao nosso redor, as árvores se erguendo como paredes de uma prisão. Eu sentia como se estivéssemos sendo perseguidos, como se algo estivesse nos seguindo. Meu coração batia forte no peito, e o medo se espalhava pelo meu corpo.
Meu irmão me puxou para frente e eu tropecei, quase caindo. Ele me segurou, e eu olhei para cima, vendo seu rosto pálido e assustado.
— Vamos — disse ele, com a voz baixa e urgente. — Temos que encontrar um lugar seguro.
Assenti, e continuamos descendo a encosta. A floresta parecia infinita, e eu sentia como se estivéssemos andando em círculos. Mas meu irmão parecia saber para onde íamos, e eu confiava nele.
De repente, ele parou e eu tropecei novamente. Ele me segurou, e eu vi um olhar de alerta em seu rosto.
— O que foi? — sussurrei.
Ele não respondeu, apenas apontou para frente. Segui seu olhar e vi uma clareira à nossa frente. No centro da clareira, havia uma cabana pequena, feita de madeira e folhas.
Meu irmão me puxou para frente, e eu o segui, sentindo um misto de medo e esperança. Talvez, apenas talvez, aquela cabana fosse o nosso refúgio.
Mas nossa pequena esperança acabou rapidamente. Antes de chegarmos ao local, escutamos passos rápidos na floresta, vindo em nossa direção. Tentamos correr o máximo possível, mas de repente uma figura estranha surgiu à nossa frente. Não me lembro de seu rosto, nem de como era, mas lembro que usava uma capa preta e longa, e seus olhos brilhavam em um tom escarlate.
E foi naquela noite que perdi tudo — minha casa, meus pais e meu irmão. Isso mesmo, naquela noite eu me perdi dele e acabei caindo em um buraco. Desmaiei. Quando acordei, estava em um refúgio escondido, criado para salvar e proteger alguns humanos. É onde vivo até hoje... ou, ao menos, vivia. Já se passaram onze anos desde que tudo mudou na minha vida. Mas eu não esperava que ainda pudesse piorar.
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Atualizado até capítulo 28
Comments
Kitty 👾
é o essencial, nunca olhar para trás em hipótese alguma
2025-08-15
2
Laura Roberta
Muito bonita pra quem vive o que o diabo amassou e o jogou fora kkkkkk
2025-08-16
0
Camila Sousa
tenho a sensação de que ela irá se vingar /Silent/
2025-08-16
0