O Jogo Começou
O salão nobre do Cassino Império era um espetáculo de opulência, projetado para embriagar os sentidos e esconder pecados. Cortinas de veludo escarlate pendiam do teto abobadado, lustres de cristal lançavam reflexos dourados sobre mesas de roleta e fichas reluzentes. O cheiro de charuto caro, uísque envelhecido e perfume francês pairava no ar como um lembrete constante: naquele lugar, tudo tinha um preço — menos a alma de Allegra.
Ela caminhava com leveza calculada, o vestido preto abraçando suas curvas com precisão. Seus olhos varriam o ambiente, memorizando rostos, anéis, conversas em sussurros. Cada detalhe importava. Cada gesto era uma pista.
No centro do salão, cercado por homens de terno e mulheres com olhos famintos, estava ele.
Dante Morelli.
Imóvel como uma escultura antiga, mas tão vivo que parecia controlar o ar ao seu redor. Um predador envolto em seda e aço. Allegra podia sentir seu olhar, mesmo antes de chegar perto. Era como uma lâmina deslizando por sua pele nua.
Ela se aproximou com a bandeja de bebidas, cada passo firme como um compasso de guerra.
— Senhor Morelli — disse, com a voz suave, mas cheia de espinhos.
Ele a observou longamente. Os olhos, de um cinza cruel, mergulharam nos dela com a intensidade de quem tenta decifrar enigmas.
— Obrigado, Sofia. Fique.
Palavra simples. Ordem disfarçada. Ela assentiu, permanecendo atrás dele como uma sombra obediente, enquanto os homens à mesa seguiam discutindo negócios que jamais seriam publicados em jornais.
— Temos problemas em Palermo. A alfândega apreendeu uma carga que deveria estar protegida. Alguém falou demais — disse um dos capangas, um homem com um bigode impecável e sotaque carregado.
— Os americanos estão ficando ousados — comentou outro.
Dante tamborilou os dedos na borda do copo.
— Os americanos não se mexem sem permissão. Isso veio de dentro. — Olhou de canto para Allegra. — E você sabe o que fazemos com traidores, Sofia?
Ela sustentou o olhar. Um desafio velado.
— Imagino que não os promova para o salão nobre.
Dante sorriu. Não era um sorriso amigável.
— Não. Mas às vezes, damos corda. E observamos até onde vão.
O clima ao redor da mesa ficou mais denso. Allegra permaneceu impassível, mas sua mente estava em alerta máximo. Ele desconfiava. Estava testando seus limites.
Mais tarde, quando o movimento no salão diminuía e os sorrisos se desfaziam junto com o álcool, Dante se levantou e murmurou:
— Comigo.
Ela o seguiu sem hesitar.
Subiram pelos corredores internos, passando por portas de acesso restrito. O perfume dele misturava-se ao cheiro de madeira cara e couro envelhecido. Chegando ao escritório, ele trancou a porta com um gesto firme.
A sala era um retrato de poder. Paredes de vidro escurecido, piso de mármore, uma lareira acesa lançando sombras dançantes nas paredes. Sobre a mesa, uma pistola, um charuto apagado e uma taça de uísque pela metade.
— Beba — disse, oferecendo-lhe um copo.
Allegra aceitou, mas não bebeu. Apenas segurou o copo, fria.
— Está me interrogando ou me seduzindo? — provocou.
Dante deu um passo à frente. Depois outro. Quando parou diante dela, estavam perigosamente próximos.
— Você me tira o sono, Sofia. E isso é um problema. — Ele passou o dedo indicador sobre o ombro nu dela, devagar. — Porque quando eu perco o sono… alguém costuma pagar por isso.
Ela encostou o copo sobre a mesa com firmeza.
— Talvez você precise de novos hobbies.
Ele riu, mas o riso não chegou aos olhos.
— Você é afiada. Mas toda lâmina tem um ponto fraco. E eu vou descobrir o seu.
Antes que ela pudesse responder, ele a puxou pela cintura com uma velocidade que fez seu coração saltar. O beijo foi brutal, faminto. Mas Allegra revidou com a mesma intensidade. Por um instante, não havia vingança. Não havia máscaras. Apenas desejo cru e descontrolado.
Ela foi quem recuou primeiro, ofegante.
— Isso não vai acontecer de novo — mentiu.
— Claro que vai — ele sussurrou, com a certeza de quem conhece o sabor da vitória.
Ela se virou para sair, mas ele segurou seu braço com firmeza.
— Sofia…
— O quê?
— Não brinque com o fogo se não estiver disposta a queimar.
Allegra soltou o braço com um puxão e saiu. Mas dentro dela, algo já ardia. O tipo de incêndio que destrói tudo — inclusive os motivos.
Do lado de fora, ao se encostar na parede para respirar, murmurou para si mesma:
— Você não pode se apaixonar por ele. Não pode…
Mas o coração? O coração não conhecia ordens. Só reconhecia batidas — e as dela estavam todas presas ao nome Dante Morelli.
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