Cheiro do *lo mein* ainda fumegante enchia o quarto de Lucas, um contraste estranho com o silêncio pesado da casa. Ele sentou-se na cama, equilibrando o recipiente de plástico no colo enquanto olhava para o celular, onde a conversa com Adrian ainda piscava na tela.
**Lucas:** *"Pediu. Tá aqui."*
Enviou uma foto do prato, meio desajeitada.
**Adrian:** *"Finalmente! Tá parecendo bom. Agora come antes que esfrie, nerd."*
Lucas sorriu sozinho e pegou os pauzinhos, misturando os noodles com cuidado. O primeiro garfo foi uma explosão de sabores — o macarrão macio, os vegetais crocantes, o molho levemente adocicado. Ele quase gemeu de satisfação. **Por que eu nunca pedi isso antes?**
Enquanto comia, seus olhos vagaram até a foto emoldurada na estante: seus pais sorrindo em frente ao Grand Canyon, uma viagem da qual ele não fizera parte. *"É só uma conferência rápida, filho. Você tem escola"*, dissera sua mãe. *"E você já é quase adulto, pode cuidar da casa"*, completara seu pai, como se isso fosse um elogio.
Era sempre assim. Eles viajavam, ele ficava. Já estava acostumado.
O celular vibrou novamente.
**Adrian:** *"E aí? Tão bom quanto eu falei?"*
**Lucas:** *"Melhor."*
**Adrian:** *"SEE? Eu sempre certo. Próxima vez a gente pede juntos e come no meu apartamento. Tenho Netflix e um sofá que engole pessoas."*
Lucas congelou com o garfo a meio caminho da boca. **Apartamento? Netflix?** Isso soava como… um encontro? Não, claro que não. Só amigos. Se é que eles eram amigos. Ele hesitou antes de responder.
**Lucas:** *"Ah… talvez."*
**Adrian:** *"Que resposta mais emocionante,"* veio a resposta sarcástica, seguida de uma figurinha de um cachorro rolando os olhos.
Lucas riu, mas o som ecoou estranho na casa vazia. Ele olhou para o teto, sentindo um peso no peito. Por que era tão fácil conversar com Adrian por mensagem, mas tão difícil acreditar que aquilo era real?
De repente, uma nova mensagem.
**Adrian:** *"Falando nisso… Seus pais tão aí? Ou você tá sozinho nesse castelo assombrado?"*
Lucas olhou para a porta do quarto, como se esperasse que, por milagre, seus pais estivessem ali. Mas só o silêncio respondeu.
**Lucas:** *"Viajaram. De novo."*
O celular ficou quieto por alguns segundos. Até que…
**Adrian:** *"Então você tá aí, comendo comida chinesa sozinho como um personagem triste de filme indie. Que deprê."*
Lucas sentiu um nó na garganta. Não queria pena.
**Lucas:** *"Tô acostumado."*
Dessa vez, a resposta demorou mais. Até que o celular tocou — **Chamada de Adrian**.
Lucas quase deixou o garfo cair. Eles nunca tinham falado por telefone. Ele engoliu seco e atendeu.
— Tá tão ruim assim que você prefere *falar*? — ouviu a voz de Adrian, cheia de riso, do outro lado.
— Eu… não sei o que dizer.
— Relaxa, não tô te stalkeando. Só pensei que, já que você tá aí ouvindo eco, a gente podia conversar pra você não pirar. — Uma pausa. — A menos que você *queira* ficar na sua caverna de solidão.
Lucas sentiu o coração acelerar.
— Não. É… bom ouvir uma voz humana.
Adrian riu.
— “Voz humana”? Caralho, Lucas, você é *muito* dramático.
E, assim, sem que Lucas percebesse, as horas passaram. Eles falaram de tudo — da escola, dos professores irritantes, da obsessão de Adrian por carros velhos, do jeito que Lucas gostava de fotografar coisas que ninguém notava.
Quando Adrian finalmente desligou — *"Tô com sono, nerd. Amanhã te encho o saco na escola"* —, Lucas ficou olhando para o celular, como se aquele objeto agora guardasse algo precioso.
A casa ainda estava vazia. Mas, de alguma forma, o silêncio já não doía tanto.
O sinal do intervalo soou, libertando os alunos da Elite Crest Academy para mais quarenta e cinco minutos de caos controlado. Lucas fechou seu livro devagar, como sempre fazia, evitando o fluxo de alunos que já se empurravam para sair da sala. Ele pegou sua mochila e estava prestes a sair quando uma mão pousou em seu ombro.
— **Fugindo de novo, nerd?**
Lucas virou-se e encontrou Adrian sorrindo, aquele sorriso largo e despreocupado que parecia desafiar qualquer um a não sorrir de volta.
— **Eu não tô fugindo**, Lucas respondeu, desviando o olhar. **Só… indo pra biblioteca.**
Adrian fez uma expressão de fake horror.
— **Biblioteca? No intervalo? Isso é crime contra a juventude.** Ele jogou um braço sobre os ombros de Lucas, puxando-o para o corredor. **Hoje não, meu amigo. Você vem comigo.**
Lucas engoliou seco.
— **Pra onde?**
— **Refeitório, obviamente. Ou você já esqueceu que humanos precisam comer?**
Lucas não teve tempo de responder antes de ser arrastado pelo turbilhão de alunos. Adrian parecia conhecer todo mundo — cumprimentava com acenos, trocava insultos carinhosos, ria alto de piadas que Lucas nem sempre entendia. Era como se ele pertencesse aquele mundo de uma forma que Lucas jamais conseguiria.
Quando chegaram à mesa onde o grupo de Adrian já estava reunido, Rafa levantou a sobrancelha ao vê-los.
— **Ué, o fantasma saiu da biblioteca?**
— **Calado, Rafa**, Adrian cutucou o ruivo com o cotovelo antes de empurrar Lucas para sentar. **Ele tá evoluindo. Hoje come com a gente, amanhã domina o mundo.**
Levi, o asiático quieto, observou Lucas por um segundo antes de comentar:
— **Desde quando você adota projetos sociais, Adrian?**
Lucas sentiu o rosto esquentar, mas Adrian apenas riu.
— **Desde sempre, Levi. Sou um filantropo.**
Marcos, o moreno do boné, jogou um pacote de batatas para Lucas.
— **Ignore esses idiotas. Come aí antes que o Adrian decida que você é responsabilidade dele pra sempre.**
Lucas pegou as batatas, murmurando um *"obrigado"*, enquanto Adrian se virava para ele, ignorando os outros.
— **Falando nisso…** Adrian inclinou-se para frente, os olhos azuis brilhando com algo que Lucas não soube decifrar. **Você tem planos depois da aula hoje?**
Lucas franziu a testa.
— **Não… só estudar, eu acho.**
Adrian sorriu, como se já soubesse a resposta.
— **Perfeito. Então você vai na minha casa.**
Lucas quase engasgou com a batata.
— **O quê?**
— **Você. Minha casa. Hoje.** Adrian contou nos dedos, como se estivesse explicando para uma criança. **A gente pode fazer o dever juntos. Ou, sei lá, assistir alguma coisa. Eu tenho um Playstation 4 que tá chorando por atenção.**
Rafa tossiu, fingindo sufocar.
— **Isso soou muito como um convite pra um encontro, Hart.**
Adrian jogou um guardanapo nele.
— **Cala a boca, Rafa. Lucas é meu amigo. E amigos vão na casa um do outro. Normal.**
Levi observou os dois com interesse, mas não comentou.
Lucas sentiu o coração acelerar. Ir na casa de Adrian? Só eles dois?
— **Eu… não sei**, ele murmurou.
Adrian encostou o cotoveno na mesa, apoiando o rosto na mão.
— **Tá com medo?**
— **Não!** Lucas respondeu rápido demais. **É só que…**
— **Que?** Adrian insistiu, os olhos fixos nele.
Lucas respirou fundo.
— **Você não precisa fazer isso. Me incluir. Eu… eu me viro sozinho.**
O sorriso de Adrian diminuiu um pouco, mas não desapareceu.
— **Eu sei que você se vira. Mas às vezes…** Ele deu de ombros. **É legal não ter que se virar sozinho.**
O silêncio que se seguiu foi quebrado por Marcos:
— **Caramba, Adrian. Quase poético.**
Adrian revirou os olhos, mas manteve o olhar em Lucas.
— **Então? Bora?**
Lucas olhou para Adrian, para o grupo, para suas próprias mãos. E então, devagar, ele assentiu.
— **Bora.**
Adrian sorriu, como se tivesse ganhado algo.
— **Ótimo. Te busco no seu armário depois da aula.**
E, enquanto o intervalo terminava e os alunos voltavam para as salas, Lucas percebeu que, pela primeira vez em muito tempo, ele estava ansioso pelo final do dia.
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