Guerra declarada
Foi num intervalo, enquanto Beatriz comia um pedaço da receita-teste com Lucas sob uma árvore, que Gabriel passou por eles e fez algo impensável: parou.
Ele perguntou olhando para Beatriz com genuína curiosidade.
Ela, que esperava no máximo um aceno, engasgou com as migalhas do bolo.
Beatriz
É… meio que… sim. Com ajuda
Gabriel
Tá bom. Bem melhor que os do bufê da cantina. Você devia vender isso.
Gabriel sorriu e se afastou. Mas olhou para trás. Duas vezes.
Lucas ficou em silêncio por alguns segundos, depois murmurou:
Lucas
Você ficou feliz que ele te notou?!
Por reflexo, quase respondeu “sim”. Mas então olhou para Lucas, com os dedos cheios de massa de bolo, os olhos ansiosos e gentis...
Beatriz
Fiquei surpresa. Não é a mesma coisa.
Lucas sorriu, tímido, mas genuíno.
Beatriz sentiu, pela primeira vez, que talvez não estivesse tão perdida quanto pensava.
Mas Manuela, observando de longe, não ia deixar barato. Ela tinha um plano, e o bolo de Beatriz era apenas o primeiro ingrediente da bagunça que viria.
A escola anunciou a premiação do concurso de culinária, que seria durante a feira cultural...
O vencedor teria uma bolsa parcial para um curso de gastronomia em uma escola técnica renomada da cidade.
Bastava isso para Lucas se empolgar e Beatriz se desesperar.
Lucas
Vamos participar juntos?!
Disse ele, com os olhos brilhando.
Lucas
Vai ser incrível, Bee. Podemos usar aquela receita do bolo trufado que testamos ontem. O sabor ficou surreal.
Beatriz hesitou. Não era só o nervosismo.
Era o peso das coisas não ditas, dos olhares que duravam um segundo a mais, da forma como ele a chamava de Bee de um jeito que ninguém mais fazia.
Mas, como num enredo bem montado, Manuela também se inscreveu. E, para a surpresa de todos, tinha um talento considerável — provavelmente treinado com a intenção de competir com Lucas no único lugar onde ele ainda era imbatível: a cozinha.
No dia seguinte, Manuela se aproximou de Beatriz no corredor, sorrindo de forma quase gentil.
Manuela
Ouvi dizer que vocês vão participar também. Que fofo. Mal posso esperar para ver… como vocês vão se sair sob pressão.
Beatriz forçou um sorriso.
Beatriz
Não se preocupe. A gente vai segurar bem a barra.
Manuela abaixou a voz, como se falasse uma confidência:
Manuela
Você devia tomar cuidado com os ingredientes que deixa sem supervisão. Às vezes, o açúcar pode virar sal…
A ameaça velada foi clara. Manuela não estava para brincadeira.
Nos ensaios para o concurso, Beatriz e Lucas se tornaram uma dupla afinada.
Ele a ensinava com paciência. Ela aprendia com dedicação. Em meio a forminhas, glacês e testes de sabor, havia também risadas, lembranças — e uma tensão crescente, doce e densa como ganache.
Uma noite, enquanto limpavam a bancada, Beatriz quebrou o silêncio...
Beatriz
Você já me perdoou? Por... ter terminado sem muita explicação
Lucas parou, secando uma tigela.
Lucas
Você não precisava explicar. Eu vi que você estava confusa. Achei que te dar espaço fosse melhor do que tentar te prender.
Beatriz
Foi. Mas eu sinto que… talvez eu nunca tenha parado de gostar de você.
Lucas a encarou. Havia algo nos olhos dele — uma mistura de esperança e medo.
Lucas
Eu nunca parei de gostar de você, Bee.
Eles se olharam por um momento que pareceu caber num filme.
Mas foram interrompidos por uma mensagem no celular de Beatriz. Era uma foto.
Do bolo que haviam deixado na geladeira da sala de gastronomia da escola...
Virado. Rasgado. Coberto com... ketchup.
A legenda era simples:
“Ups. Escorregou.”
Manuela tinha feito sua jogada.
Mas Beatriz não era mais a garota que chorava em meio a nuvens de farinha e sonhos despedaçados.
Respirou fundo, olhou para Lucas e disse:
Beatriz
Vamos refazer. Do zero. Melhor ainda.
E dessa vez, não era só sobre impressionar Gabriel, vencer Manuela ou ganhar uma bolsa...
Era sobre se redescobrir. Era sobre amor — pelo que fazia, por si mesma… e talvez, por alguém que esteve ao seu lado o tempo todo.
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