Obsessão
Eles dizem que a gente exagera.
Que estamos “imaginando coisas”.
Que é só ansiedade.
Só paranoia.
Só... medo infundado.
Mas o medo é real. E quando ele entra pela porta, você já não vive mais, só sobrevive.
Tudo começou de forma tão sutil que, por um tempo, achei que era culpa minha.
Uma xícara fora do lugar. A luz da varanda acesa quando eu tinha certeza de tê-la apagado. O som da porta rangendo mesmo fechada. Coisas pequenas. Tão pequenas que pareciam erros comuns — esquecimentos. E eu quis acreditar nisso. Quis de verdade.
Mas o medo... o medo se instala devagar. Ele não grita. Ele sussurra. E o sussurro do medo tem o poder de corroer até os alicerces mais sólidos da mente.
Sou Isabela. Tenho 29 anos. Moro sozinha em um apartamento pequeno no centro da cidade. Trabalho de casa, revisando textos e corrigindo histórias que não são minhas. Sempre gostei de silêncio, de ficar só. A vida nunca me exigiu muito além disso. Nem amigos próximos, nem grandes dramas. Apenas... a quietude do cotidiano.
Por isso, quando o silêncio começou a me assustar, soube que algo estava errado.
A princípio, era aquela sensação de estar sendo observada. Você conhece? Aquela fisgada nas costas, como se um par de olhos estivessem fixos em você — mesmo dentro de casa, com as janelas fechadas. Olhei para trás muitas vezes, sem ninguém ali. Mas sentia. O peso. A presença. O ar mais denso.
Comecei a deixar as luzes acesas à noite. Achei que era só um incômodo passageiro. Estresse, talvez. Falta de sono. Mas o incômodo virou rotina. E a rotina, desespero.
Certa manhã, encontrei um bilhete sob minha porta. Papel branco, caligrafia limpa.
> “Você é mais bonita quando não percebe.”
Eu não entendi. Achei que fosse algum tipo de brincadeira estúpida de vizinho. Rasguei. Joguei fora. Esqueci. Ou tentei esquecer.
Dois dias depois, outro bilhete.
> “Você dorme com os lábios entreabertos. Sonha com o quê?”
Dessa vez, tremi.
Minha porta tinha duas trancas. Eu verificava cada uma antes de dormir. A janela da sala mal abria. Ainda assim... alguém via. Alguém anotava. Alguém entrava.
Levei os bilhetes à polícia. Riram. Perguntaram se eu tinha namorado. Disseram que provavelmente era um ex tentando chamar atenção. Falaram para eu "ficar atenta" e "evitar criar pânico desnecessário".
Desnecessário?
A partir dali, parei de sair. Cancelava entregas. Desligava o telefone. Colava fita nas câmeras do notebook. Vivia na sombra da própria casa, como uma estranha dentro da minha vida.
Porque não é o grito que mais machuca. É o silêncio. É saber que, mesmo com tudo dentro do peito gritando, ninguém ouve. Ou pior: ninguém acredita.
O perseguidor — o obsessor — esse alguém sem nome, sem rosto, sem forma definida, passou a controlar meus dias. Meu sono. Minha comida. Minha respiração.
E quanto mais o ignorava, mais ele se aproximava.
Certa noite, acordei com a TV ligada. Estava sem som, mas ligada. As luzes piscavam. O quarto cheirava a perfume — um que eu não usava. Levantei sem ar. Corri para a porta. Trancada. Trancada? Ou fingindo estar?
Comecei a registrar tudo. Cada detalhe. Cada barulho. Cada centímetro deslocado. Registrei porque, no fundo, eu sabia: se eu morresse, alguém precisaria saber. Mesmo que fosse tarde demais. Mesmo que eu virasse só mais uma nota de rodapé em algum jornal.
O pior de tudo? Não saber quem. Não saber como. Não saber quando. Era isso que me matava lentamente.
As paredes da minha casa se tornaram inimigas. Os espelhos, armadilhas. As noites, um campo de batalha.
Você nunca sabe o quanto está sozinha até precisar que alguém acredite em você — e não ter ninguém.
E se você acha que isso não pode acontecer com você, pense de novo. O medo não escolhe vítimas por estatísticas. Ele se infiltra nas frestas do cotidiano. Ele se aproxima quando você está distraído. E ele veste máscaras que você nem imagina.
Eu nunca fiz mal a ninguém. Nunca me envolvi em conflitos. Nunca persegui ninguém.
Mas fui escolhida. Por alguém que achou que meu silêncio significava consentimento. Que minha solidão significava fraqueza.
Ele estava errado.
Demorei, mas sobrevivi. E hoje escrevo isso com uma única intenção: ser ouvida. Porque por muito tempo, eu fui o eco do próprio desespero. Gritei em vão. E quase me perdi.
Essa é minha história. A história de uma perseguição silenciosa. De um terror que não aparece com sangue ou gritos, mas com passos leves no corredor e respiração no telefone.
Essa é a história de como eu quase morri.
E de como — finalmente — tive paz.
Mas não antes de fazer com que ele pagasse por tudo.
Foto da Isabela:
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Atualizado até capítulo 42
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