04

Ele sabia que deveria consertar as memórias de Paul e simplesmente ir embora, mas percebeu que estava extremamente curioso. Sobre as sacolas de presentes e por que Paul andava sozinho pelas ruas escuras. Por que ele não tinha casaco e por que cheirava tão bem. Já que uma boa hora se esvairia de qualquer maneira, que mal poderia haver em passar alguns minutos conversando? Fazia muito tempo que não tinha uma conversa de verdade; ele se perguntava se ainda sabia como.

Paul manteve os olhos azuis fixos nos de Taviano enquanto controlava o medo. Seu coração batia acelerado, mas seu suor carregava um toque de alívio e, estranhamente, de excitação.

"Obrigado", disse ele com fervor enquanto Taviano se aproximava. "Não sei o que aconteceu, exceto que você salvou a minha vida." Ele riu e balançou a cabeça. "Nossa, isso soou presunçoso. Certo, você salvou os presentes e impediu que eu levasse um chute." Ele estendeu a mão que não estava sobre o ombro e disse: "Sou Paul. Feliz Natal."

Taviano sentiu um sorriso se formar em seus lábios. Quando foi a última vez que alguém lhe estendeu a mão para cumprimentá-lo? Divertido, apertou a mão de Paul, cujo aperto era quente e suave. A vida pulsava forte e constante na palma contra a sua, e nos dedos em volta de suas extremidades frias.

"Sim, ouvi você dizer seu nome. Meu nome é Taviano." Depois de um momento, ele acrescentou, sem jeito: "Feliz Natal para você também."

"Italiano, hein?", disse Paul quando o aperto de mão terminou. "Imaginei. Você tem a cara e eu ouço um leve sotaque. Provavelmente sulista, certo? Com esse cabelo preto e seus olhos escuros."

Taviano assentiu e, tardiamente, disse: "Sou de Nápoles. Originalmente."

"Ah, que legal. Minha família veio principalmente do norte da Itália, lá atrás. Mas seu nome... Tão antiquado! Temos três Octavios na vizinhança que eu conheça, mas não me lembro de nenhum Taviano antes."

"Era incomum até mesmo de onde eu venho. Minha mãe o escolheu de uma lista de nomes escrita na frente da Bíblia da nossa família."

"Incrível." Paul piscou algumas vezes e pigarreou. "Então, Taviano, você pode me contar o que aconteceu aqui ou teria que me matar? Eu realmente não quero isso, então se for melhor você não me contar, ótimo também. É só dizer. Morrer no Natal. Isso seria péssimo." Ele riu, constrangido. "Desculpe, estou falando demais. Estou meio assustado e isso me faz falar muito."

Taviano interagia pouco com outras pessoas além de suas vítimas. Levou alguns instantes para decifrar o que Paul havia dito e o que poderia precisar. Com o que esperava ser um sorriso tranquilizador, os lábios cerrados para cobrir as presas, disse: "Não se preocupe, por favor. Não vou te machucar. Mas provavelmente é melhor se nós... esquecermos como nos conhecemos."

Paul balançou nos calcanhares e expirou pesadamente. "Por mim, tudo bem. Ótimo. Nada de matar, então."

Taviano ficou aliviado por ter feito Paul se sentir melhor. Como se tivesse passado em um teste. O cheiro forte de sangue fresco chegou às suas narinas. "Seu ombro está sangrando. Não é fundo, mas você deveria cuidar disso."

Paul franziu a testa como se tivesse esquecido, mas, ao retirar a mão que o cobria, estremeceu. A faca havia cortado seu suéter, a camiseta de algodão por baixo e, segundo Taviano, uns vinte centímetros de pele. Uma boa quantidade de sangue cobria a palma da mão e o ombro de Paul e infiltrava-se nos tecidos, mas o ferimento era facilmente tratável. Ele nem precisaria de pontos.

"Ah, merda", murmurou Paul. "Este é o meu suéter favorito." Ele olhou inexpressivamente para a palma da mão ensanguentada. "Que nojo, cara."

Seu demônio concentrou seu foco no sangue. Taviano se preparou para uma batalha, mas, para sua surpresa, o demônio não fez nenhum esforço para atingir Paul. Em vez disso, acalmou-se e flutuou em sua barriga.

Ele franziu a testa. Será que ele colocaria Paul em risco só por estar perto? Aquela falta de interesse da sua fera de sangue era quase sem precedentes, e ele permaneceu alerta para algum truque.

Mas havia algo diferente em sua reação. Podia ser tão simples quanto já ter se alimentado duas vezes naquela noite. Ou... poderia ter se acostumado com seu código de poupar inocentes e se alimentar apenas dos piores miseráveis? Taviano convivera com tão poucas pessoas boas nas últimas décadas que nunca tivera a oportunidade de notar.

Todos os seus instintos lhe diziam que Paul era tão sincero e inocente quanto parecera do alto. O prazer incomum de conversar com Paul, combinado com a aparente tolerância de seu demônio, animou Taviano. Ele se concedeu mais tempo para conversar, enquanto se mantinha vigilante contra qualquer ataque surpresa da fera de sangue.

"Posso te levar a algum lugar para cuidar do seu ombro? Talvez uma farmácia aqui perto?"

"É melhor eu voltar para o meu apartamento e limpar tudo lá. Preciso me trocar de qualquer jeito agora." Paul fez uma careta enquanto girava o ombro. "Não dói muito, mas é muito sangue." Olhou para Taviano e perguntou sério: "Você acha que eu deveria ir para um hospital ou algo assim? Não tenho plano de saúde, mas provavelmente me atenderiam em um pronto-socorro mesmo assim." Murmurou: "Espero que sim."

"Não é necessário", disse Taviano, confiante. "Coloque um curativo, mantenha-o limpo, e imagino que não ficará nenhuma cicatriz."

Paul arregalou os olhos e deu um sorriso enorme. "Nem pensei em cicatriz. Seria uma viagem! Um ferimento de guerra de verdade, né?"

Taviano teve que sorrir de volta. "Você está notavelmente calmo para alguém que foi assaltado esta noite e cortado com uma faca."

"Não, eu cuido disso, mano. Eu disse a mim mesmo que teria dez minutos para gritar e surtar mais tarde hoje à noite, então, tipo, simplesmente deixei para depois. Acredite, vou ficar um desastre."

Improvável. Quando Taviano alterasse suas memórias, ele eliminaria a agressão física junto com todo o resto. Ele não queria que uma nuvem negra do ataque estragasse a óbvia satisfação de Paul com a temporada. Ele deveria fazer isso logo.

Bem, quando a conversa segue seu curso.

Taviano poderia muito bem fazer algo útil enquanto conversavam. Era quase uma pena, já que Paul parecia animado com sua potencial cicatriz. Ah, mas ele nem vai se lembrar do ferimento.

"Posso?", perguntou ele com um pequeno gesto no ombro de Paul. "Posso estancar o sangramento, mas você terá que consertar o suéter sozinha."

Paul assentiu, curioso, e Taviano cortou o dedo indicador com a unha afiada do polegar. Passou um pouco de icor no corte, que começou a fechar. Os olhos de Paul brilharam como pires enquanto se desviavam da ferida que se estreitava para o seu curador. Chocando-se, Taviano piscou para ele. Piscou mesmo. "Desculpe, Paul, mas sem cicatriz."

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