Capítulo 2 – O Despertar da Dor
O som do monitor cardíaco foi a primeira coisa que ela ouviu.
Bip... bip... bip...
Fraco, contínuo, insistente.
Luiza abriu os olhos devagar, sentindo as pálpebras pesadas, como se mil dias tivessem se passado dentro dela. A luz branca do hospital ardeu, ofuscando sua visão. Tudo parecia fora do lugar. O ar tinha cheiro de desinfetante. As mãos estavam geladas. O corpo doía.
— Luiza...? — uma voz suave chamou, ao lado da cama.
Ela tentou virar o rosto, mas o esforço foi demais. Apenas piscou, tentando entender onde estava. O coração acelerou. E então a pergunta veio, fraca, rouca, quase um sussurro:
— Onde... meu pai?
Silêncio.
A enfermeira desviou o olhar, apertando os lábios. Chamou um médico.
Minutos depois, ela soube.
Soube da forma mais cruel possível: palavras cortantes, ditas com cuidado, mas que perfuraram como lâminas.
O acidente.
A colisão.
A morte instantânea.
O coma.
Quatro meses.
E agora... ela sozinha no mundo.
Luiza não chorou. O choque era profundo demais para lágrimas. O coração parecia vazio, como se alguém tivesse arrancado o que havia de mais importante dentro dela e deixado só a casca.
Queria apagar de novo. Queria não ter acordado.
Não conseguia respirar direito. O peito pesava, como se estivesse sendo esmagado. A ausência do pai era um buraco que consumia tudo.
— Você vai se recuperar, querida — disse uma voz gentil. — E há alguém esperando por você... alguém que vai cuidar de você agora.
Ela franziu a testa, confusa.
— Quem?
— Sebastian.
Aquele nome soou como um eco distante. Ela já ouvira o pai mencionar, poucas vezes, com uma mistura de respeito e mistério. O melhor amigo. Um homem perigoso, alguém de um passado sombrio. Mas... ela nunca o viu. Nunca falou com ele. E agora, do nada, esse tal Sebastian era responsável por ela?
Não. Não podia ser verdade.
Mas era.
Duas semanas depois, ainda fraca e emocionalmente devastada, Luiza foi liberada do hospital. Não teve tempo de escolher. Não teve voz ativa. Seu pai deixara tudo preparado: documentos, advogado, tutela. Era como se Marcos soubesse que não voltaria daquela viagem.
Sebastian estava lá. Na saída.
Alto, imponente, vestindo preto dos pés à cabeça. A barba por fazer, os olhos escuros e inexpressivos. Ele a encarava como se já soubesse de tudo que ela estava sentindo, mas não demonstrava nada. Nenhuma emoção. Nenhuma aproximação forçada.
Luiza desviou o olhar.
Foi um trajeto silencioso até a casa dele — uma fazenda enorme, afastada, cercada de árvores e cercas de ferro. Tudo frio, escuro, intimidador. Assim como ele.
Ela entrou muda. Subiu as escadas sem dizer uma palavra. Trancou-se no quarto e só então, desabou.
O choro veio como uma avalanche. O grito ficou preso na garganta, mas o coração gritava em silêncio. Não era só a dor da perda. Era o medo. A raiva. A solidão. E aquele homem desconhecido, que agora era tudo o que restava.
Nos dias seguintes, Luiza não saiu do quarto. Não comeu. Não falou com ninguém. Ignorou as batidas na porta, recusou todas as bandejas de comida deixadas do lado de fora. A dor era tanta que ela desejava não ter acordado.
"Quero morrer", pensou, abraçada ao travesseiro. "Quero dormir e não acordar nunca mais."
Sebastian, por sua vez, observava à distância. Sabia que forçar não ajudaria. Ele conhecia a dor da perda, mas não sabia consolar. Nunca soube. Seu mundo era feito de ordens e sobrevivência — não de acolhimento. Mas ver aquela garota definhar sem comer, se apagando aos poucos... estava mexendo com ele.
Na terceira noite, ele subiu até o quarto. Bateu forte na porta. Nada. Bateu de novo.
— Luiza — chamou, sério, firme. — Abre a porta.
Silêncio.
— Eu sei que está me ouvindo. Não quer falar comigo, tudo bem. Mas precisa comer. Isso não é o que seu pai gostaria que você fizesse.
Nada.
Ele encostou a testa na porta por alguns segundos. Suspirou fundo.
— Eu não sou bom com isso. Nunca fui. Mas prometi a ele que cuidaria de você. E mesmo que você me odeie agora... eu vou cumprir minha promessa. Nem que você me odeie todos os dias por isso.
Ele deixou a bandeja no chão, como nas outras vezes. Mas antes de sair, disse com voz mais baixa:
— Se não por você... faz por ele.
E desceu as escadas.
Luiza, deitada no escuro, mordeu o lábio até sentir o gosto de sangue. Lágrimas escorriam. Seu coração quebrado doía em cada batida. Mas... algo naquela voz... naquela frase... quase a fez levantar.
Quase.
Mas ainda não.
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Atualizado até capítulo 39
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