Capítulo 5

...Deise...

O dia foi cansativo. Clientes impacientes, minha chefe exigente e meus pés implorando por misericórdia depois de horas em pé. Tudo o que eu queria era chegar em casa, tomar um banho quente, colocar uma roupa larga e esquecer que o mundo existia. Mas, às vezes, o universo tem outros planos — e naquele dia, ele estava determinado a me tirar da rotina.

Eu vinha caminhando pelo centro, seguindo o mesmo trajeto de sempre, quando algo chamou minha atenção. Era uma movimentação incomum em frente a uma casa noturna recém-inaugurada, daquelas que sempre passava reto sem nem olhar duas vezes. Algumas pessoas estavam paradas por ali, pegando panfletos, e um rapaz vestido com uma camiseta preta apertada se aproximou de mim com um sorriso treinado.

— Boa noite, gata. Hoje tem show especial na Boate Onyx. — Ele estendeu um folheto. — Dois dos performers mais desejados da cidade... trisal garantido no palco. Vem conhecer os meninos de fogo. Lyan e Renald.

O nome acendeu como um holofote na minha mente. Senti um frio na barriga.

— Desculpa, qual o nome mesmo? — perguntei, pegando o papel da mão dele, olhando para a imagem dos dois vizinhos.

— Lyan e Renald. Eles bombam na internet. É tipo... performance sensual, sabe? Meio stripper, meio cena de filme. Você vai amar.

Assenti mecanicamente, tentando parecer natural, mas por dentro, meu mundo estava virando do avesso. Me afastei com o panfleto nas mãos, sentindo o coração bater mais rápido. O papel tremia levemente entre meus dedos.

Na imagem estampada, os dois estavam lá. Sem camisa, em poses sensuais, o corpo de Lyan reconhecível de longe — era ele, sem dúvida. E o outro, de expressão mais séria, olhos intensos: Renald. O "Marrento". Os apelidos que eu inventei já não pareciam mais jogos inofensivos. Eles tinham nomes. Eles tinham uma identidade pública. E não era qualquer uma.

Eles eram performers. Não apenas bonitos e misteriosos. Eram conhecidos. Desejados. Profissionais. A ficha caiu em câmera lenta.

O trajeto até meu apartamento foi uma mistura de choque e curiosidade. Me sentia estranha. Envergonhada por estar bisbilhotando a vida deles esse tempo todo sem saber o que realmente havia por trás. E, ao mesmo tempo, excitada pela descoberta.

Assim que entrei no apartamento, joguei a bolsa no sofá e fui direto para o laptop. Meus dedos digitavam com rapidez: “Lyan e Renald + Boate Onyx + vídeo”. Os resultados vieram em avalanche.

Vídeos. Matérias. Perfis. Entrevistas. Seguidores aos milhões.

Cliquei no primeiro link que parecia mais recente. Era um vídeo postado há poucas semanas. Título direto: “Trisal de tirar o fôlego: Lyan, Renald e Priscila em noite quente”. Só o nome já me fez engolir em seco. Respirei fundo antes de dar play.

A tela se encheu com a imagem dos dois — meus vizinhos — em um cenário iluminado, elegante e ousado. Havia sensualidade ali, mas também uma química verdadeira. Lyan estava sorridente, cheio de energia. Renald, como sempre, mais contido, mas ainda assim com um olhar que queimava. E então, ela apareceu: Priscila. Morena, curvas generosas, olhar de quem sabia exatamente o que estava fazendo.

Os três interagiam com fluidez. Não era só uma performance mecânica. Era íntimo. Intenso. Real.

Assisti em silêncio, o rosto colado na tela. Me sentia exposta só de ver. Era como se estivesse invadindo um espaço que não era meu. E, no entanto, não conseguia parar. Havia algo naquele vídeo que me puxava, como um ímã. Eu não via apenas corpos em movimento — eu via a conexão entre eles. A liberdade. O desejo sem amarras. A confiança.

Quando o vídeo acabou, me peguei sem ar. O silêncio do apartamento combinava com a confusão dentro de mim. Fiquei olhando para a tela preta por longos segundos, tentando entender o que eu estava sentindo.

Não era só tesão, apesar de ele estar ali. Era um misto de surpresa, inveja e algo que parecia... curiosidade profunda. Aquilo tudo era tão distante da minha realidade. Eu, que vivia observando pela janela, presa à minha rotina segura, nunca imaginei que meus vizinhos estavam vivendo algo tão fora da curva. Tão ousado. Tão livre.

Levantei e fui até a sacada. Olhei para o prédio da frente. As luzes estavam apagadas. Talvez estivessem na boate, preparando-se para o show daquela noite. Ou talvez em algum outro lugar, vivendo mais uma das histórias que eu jamais teria coragem de protagonizar. Só sei que no panfleto estava claro, que seria duas noites. A última, teria surpresa.

Encostei os braços no parapeito, sentindo o vento tocar minha pele. Meus pensamentos rodavam em círculos. E se eu fosse até lá? E se eu comprasse um ingresso para aquele show? E se eles me vissem? Será que me reconheceriam?

Mas eu sabia que era só fantasia. Eu não era uma das fãs enlouquecidas. Eu não fazia parte desse mundo. Eu era só a vizinha do décimo andar. A mulher solitária com binóculos na sacada.

Mesmo assim... algo havia mudado.

Não podia mais vê-los com os mesmos olhos. Agora que sabia quem eles eram — o que faziam — o jogo havia virado. E, de certo modo, eu não estava mais apenas observando. Eu estava envolvida.

Voltei para dentro, fechei o laptop com cuidado e sentei no sofá. Peguei o panfleto que havia guardado no bolso da jaqueta novamente. A imagem deles me encarava. Eles não eram apenas bonitos. Eles eram desejados. E agora, eram reais demais.

Suspirei fundo. Sabia que, a partir daquele momento, não haveria mais volta. Eu queria mais. Queria entender o que existia além daqueles corpos perfeitos. Queria descobrir quem era Lyan, de verdade. Quem era Renald, por trás daquela pose séria. Queria saber até onde essa história podia ir — e se, em algum momento, eu também poderia fazer parte dela. Aquela curiosidade virou desejo.

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