...Deise...
Acordei naquela manhã de domingo, como sempre. O dia estava claro, e a luz do sol parecia ser gentil o suficiente para não agredir meus olhos cansados. Não era dia de trabalho, o que significava uma folga da rotina de sempre. Isso deveria ser algo positivo, mas, em vez de relaxar, havia algo em mim que permanecia inquieto, como se uma parte de mim soubesse que aquele dia seria diferente.
Eu queria afastar essa sensação estranha e decidi que seria um dia para me animar. Fui direto para a cozinha e fiz um café forte, daqueles que me deixam elétrica e um pouco mais viva. Tomei um gole enquanto olhava para o céu azul através da porta de vidro. Que droga, eu tinha que parar de pensar demais.
— É só um domingo — disse para mim mesma.
Para espantar de vez aquele clima meio pesado, decidi colocar música. Não qualquer música, claro, mas algo animado e dançante. Escolhi uma playlist antiga que sempre me fazia rir e me deixava mais leve.
A música encheu o apartamento e, sem perceber, eu estava dançando. Era meu pequeno ritual particular: movimentos desajeitados, passos improvisados e risadas solitárias. Eu ria de mim mesma, sem me importar se alguém pudesse ver ou ouvir. Naquele momento, era só eu e a música. Com a batida pulsante, deixei a melodia me guiar até a porta da sacada. Ainda balançando os quadris, abri as cortinas sem pensar muito e saí para a varanda.
Eu estava despreocupada, agitando os braços e cantarolando, quando algo me fez parar. Um sexto sentido, talvez, ou o desconforto de perceber que não estava sozinha. Virei o rosto e, para meu total desespero, lá estava ele.
O Alongador matinal, estava na sacada do outro lado observando. Ele estava sem camisa, como se fosse a coisa mais natural do mundo. Seus braços estavam apoiados na grade, e havia um cigarro pendurado entre seus dedos, queimando lentamente. Ele tinha um meio sorriso no rosto, um daqueles que parecem dizer "Eu vi tudo, está indo bem, só continue".
Senti meu rosto esquentar como uma lâmpada acesa.
— Que visão do inferno, logo de manhã — murmurei para mim mesma, ainda atordoada.
Tentei manter a calma, mas era impossível. Ele não desviava o olhar, e agora eu estava consciente de cada movimento, cada respiração. Meus pés começaram a recuar, mas parecia que ele podia sentir minha hesitação. Seu sorriso se alargou um pouco, como se estivesse achando graça da situação. Foi aí que eu percebi que minha tentativa de fuga estava lenta demais.
Corri para dentro, quase tropeçando nos próprios pés, e fechei a porta de vidro de um jeito desajeitado, derrubando a cortina no processo. Senti minhas mãos tremendo enquanto ajustava a cortina de volta no lugar. Meu coração estava disparado, como se eu tivesse acabado de correr uma maratona.
— Droga, ele me viu — praguejei, encostando a testa na porta. — Ainda bem que não saí com o binóculo na mão. Se ele tivesse me pegado assim, eu estaria totalmente ferrada.
Fiquei parada ali por um momento, tentando recuperar o fôlego. O que eu estava pensando? Eu devia ter checado a sacada antes de sair. Meu pequeno ritual de domingo se tornara uma performance acidental para o meu vizinho misterioso, e isso era embaraçoso demais para lidar.
Mas a curiosidade é uma praga, e eu precisava saber se ele ainda estava lá. Com cuidado, abri um pouquinho da cortina e espreitei. Ele ainda estava lá, observando. E agora, ele estava rindo, enquanto balançava a cabeça em negativo. Certamente pensando que sou doida. Eu deveria ficar brava, talvez até ofendida, mas em vez disso, senti um calor estranho no estômago. Algo que não consegui decifrar.
Fechei a cortina rapidamente, o rosto pegando fogo. Meus pensamentos estavam um caos, e tudo o que eu queria era esquecer aquela cena. Precisava de uma distração. Peguei meu laptop e me sentei no sofá, tentando ocupar a mente. Mas abrir e fechar janelas na tela não ajudava muito. Tudo o que eu conseguia pensar era naquele sorriso. Aquele sorriso seguro, provocador. Como ele ousava rir de mim, daquela forma tão provocante?
As horas passaram, e eu não conseguia reunir coragem para sair da sacada de novo. Parecia que aquela área do apartamento tinha virado território inimigo. Eu era quem normalmente observava sem ser vista, mas agora estava do outro lado dessa brincadeira desconfortável. E não era uma sensação que eu estava gostando de experimentar.
No meio da tarde, decidi fazer um chá para me acalmar. A cozinha era meu refúgio, o lugar onde eu podia me esconder de mim mesma. Esperei a água ferver, tentando ignorar aquela sensação de estar sendo observada. Mas, ao voltar para a sala, a curiosidade falou mais alto. Com cuidado, abri a cortina mais uma vez. A sacada estava vazia. Isso deveria me tranquilizar, mas, em vez disso, senti uma pontada de desapontamento.
Meu celular tocou, interrompendo meus devaneios. Era uma amiga, me chamando para sair naquela noite. Considerei por um momento, mas a ideia de sair e tentar agir como se nada estivesse acontecendo parecia impossível. Senti-me vulnerável demais, então inventei uma desculpa qualquer e recusei.
Voltei para o sofá, tentando relaxar com um filme. Mas cada som me fazia saltar, como se eu estivesse esperando que ele aparecesse a qualquer momento, atravessando a porta de vidro com aquele sorriso irritantemente confiante.
Isso é ridículo — pensei, mas o nervosismo não diminuía.
Quando a noite chegou, me forcei a ir para a cama. Talvez dormir ajudasse a esquecer aquele encontro embaraçoso. Mas, ao deitar, tudo o que eu conseguia ver eram aqueles olhos e aquele sorriso meio debochado.
Virei-me na cama inúmeras vezes, sem conseguir relaxar. Por que aquilo me incomodava tanto? Afinal, ele era apenas um vizinho, alguém que eu provavelmente nunca conheceria de verdade. Mas, mesmo assim, a sensação de ter sido vista, de ter sido pega no meu pequeno mundo particular, me deixava inquieta.
Na segunda-feira de manhã, acordei exausta, mas determinada a me recompor. Não podia deixar que uma única troca de olhares me afetasse tanto. Eu precisava de controle, e deixar esses pensamentos tomarem conta só me faria perder a linha. Decidi que não olharia mais para a sacada. Pelo menos por enquanto. Precisava recuperar minha paz de espírito.
Mas, no fundo, eu sabia que não seria tão simples. Aqueles olhos e aquele sorriso haviam deixado uma marca em mim. Algo que não seria fácil de apagar. E enquanto a manhã de segunda-feira passava lentamente, tentei me concentrar em mais um dia de trabalho na loja de roupas em que eu trabalho.
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Atualizado até capítulo 30
Comments
Maria Sena
Isso foi hilario, a detetive se sentido observada, se nessa primeira troca de olhares ela já ficou assim, du imagino qua do ele chegar bem pertinho e sussurar no ouvido dela.
2025-04-10
1
Maria Das Neves
estou amando essa história parabéns autora 😍❤️❤️❤️
2025-04-09
1
Maria Cruz
Não faça aos outros o que você não gostaria que fizesse com você kkkkk
2025-04-08
3