À Beira do Abismo

O tempo parecia brincar com Aurora. Cada novo dia trazia mais incerteza, e cada noite carregava o peso da dúvida e do medo. Seu perseguidor não se escondia mais nos cantos escuros de sua mente; ele se fazia presente em cada detalhe de sua vida. Não era mais apenas a sensação de estar sendo observada — era um fato. Ele estava ali. Sempre.

Os dias se tornaram um tormento silencioso. Aurora passou a evitar espelhos, vitrines, superfícies reflexivas. Tinha medo do que poderia encontrar neles — não seu reflexo, mas os olhos dele. Aqueles olhos. Frios. Famintos.

Seu telefone tocava em horários aleatórios. Sempre silencioso. Às vezes, durava segundos. Em outras, ela ouvia um leve ruído, como se alguém respirasse do outro lado, muito próximo. Começou a usar fones de ouvido no trabalho, para isolar a realidade, para fingir que o mundo ainda era seguro. Mas mesmo no escritório, sentia-se vigiada.

Certa tarde, encontrou uma foto presa sob o limpador do vidro do carro. Era uma imagem dela — tirada de cima, em algum prédio próximo. Ela estava caminhando sozinha, com o casaco vermelho, a bolsa atravessada no corpo. Uma imagem cotidiana. Mas ela nunca tinha tirado aquela foto. E no verso, uma única palavra, escrita com uma letra limpa, fria:

"Perfeita."

Ela entrou no carro trêmula, os olhos cheios de lágrimas, os dedos mal conseguindo segurar a chave. Tinha medo de ligar para alguém, medo de envolver outras pessoas. Se ele estava disposto a segui-la, a invadir sua vida com tamanha precisão, do que mais seria capaz?

Naquela noite, decidiu sair. Precisava respirar, fingir que ainda era dona de si. Escolheu um restaurante discreto, uma mesa nos fundos, longe das janelas. Tentava se convencer de que o medo não a dominaria, mas a cada garfada, seu olhar voltava ao reflexo no espelho atrás do balcão. Seu coração acelerou quando viu um vulto.

Ele estava ali.

No reflexo do espelho do bar, entre as garrafas e as luzes amareladas, aqueles olhos a encontraram. Atravessaram-na como lâminas afiadas. O ar lhe faltou. Ele a olhava sem desviar, como se cada gesto seu fosse meticulosamente analisado.

O pânico a dominou. A lógica dizia para ficar, para não demonstrar medo. Mas o instinto foi mais forte. Levantou-se de súbito, o sangue pulsando em seus ouvidos. Não pensou, apenas correu. Para fora do restaurante, para dentro da noite fria.

Os passos atrás dela eram reais. Não eram fruto da sua imaginação.

Aurora virou uma esquina, o coração prestes a explodir. Olhou para trás, mas a rua estava vazia. Seu peito subia e descia descontroladamente. Ela quis acreditar que estava sozinha. Mas então, uma mão firme segurou seu pulso. Forte. Quente. Familiar.

Ela tentou gritar, mas o som morreu em sua garganta quando sentiu a respiração quente perto de sua pele.

— Finalmente sozinha — a voz era baixa, quase um sussurro, mas carregava um peso avassalador.

Aurora congelou. O medo e algo mais profundo – algo que ela se recusava a nomear – a paralisaram.

— Por favor... — conseguiu sussurrar, a voz falha.

Ele sorriu, um sorriso perigoso. Seus dedos subiram até o rosto dela, como se fossem acariciá-la. Mas havia algo errado naquele toque. Era possessivo, invasivo, como se ele já a tivesse tocado antes, em sonhos distorcidos ou pesadelos esquecidos.

— Você não faz ideia do quanto esperei por esse momento — ele murmurou, os olhos fixos nos dela. — Você é exatamente como imaginei.

Aurora reuniu forças e empurrou-o com os dois braços, libertando-se num movimento rápido e instintivo. Correu de volta pela rua, sem olhar para trás. Seu coração batia tão alto que abafava os sons do mundo.

Chegou em casa, trancou todas as portas e janelas. Enfiou uma cadeira debaixo da maçaneta. E chorou. Chorou até não ter mais lágrimas. Sentia-se quebrada, exposta, invadida. A casa, antes seu refúgio, agora parecia uma armadilha. As paredes pareciam observá-la.

Na manhã seguinte, encontrou um presente na porta. Uma pequena caixa preta, com um laço vermelho.

Dentro, havia um colar com um pingente de rubi. Sangue sólido. E um bilhete:

"Eu te vejo mesmo quando você tenta se esconder. Cada parte sua é minha. Ainda vamos rir disso, minha linda. Em breve."

Ela caiu de joelhos. Não havia mais como negar. Ele não era apenas um perseguidor. Era um predador. E ela, a caça.

Aurora estava à beira do abismo. E sentia que, em breve, alguém a empurraria.

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Comments

anonimata

anonimata

que história bom, ao mesmo tempo que me prende na tensão de quer ler mais, faz me sentir no lugar da personagem, com medo de continuar, mas a curiosidade é maior

2025-04-22

1

Nalu Correa

Nalu Correa

que história prende a minha curiosidade pra saber o que aconteceria com tudo esse mistério realmente que é esse homem 🚹 tá msis parecendo um fantasma 👻 vindo se vingar eu em Deus me livre

2025-04-20

3

Ver todos

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