Eu me chamo Marina Lins, tenho 37 anos, e sou chefe de cozinha, vendo almoços de forma autônoma, mais exatamente. E moro com meu gato Thor no condomínio "Novo Amanhecer".
Marina:
Falando sério, ser abandonada é uma ferida que nunca se fecha completamente. Quando você é uma criança, as expectativas em relação à segurança emocional dos pais são absolutas. Eles devem estar lá para você, sempre. Mas e quando eles não estão? Ou, pior, quando fazem questão de te deixar para trás sem nenhuma explicação?
Eu tinha apenas 10 anos quando meu pai decidiu que ele não queria mais fazer parte da minha vida. Lembro-me até hoje da cena – a casa vazia, a porta se fechando atrás dele enquanto eu e minha mãe tentávamos entender o que estava acontecendo. Ele me prometera que voltaria. Como ele poderia prometer isso? Como alguém pode prometer algo assim para uma criança e depois simplesmente desaparecer sem deixar nenhuma pista?
Houve promessas no início, algumas cartas de uma tal “nova vida” que ele estava tentando construir, mas, no fundo, sabíamos que estava acontecendo algo diferente. O tempo passou e ele simplesmente nunca voltou.
Minha mãe fez o melhor que pôde, sozinha, mas o vazio que seu abandono deixou nunca pôde ser preenchido completamente. Ele me privou da possibilidade de acreditar em muitas coisas. Amor. Fidelidade. Compromisso. Como poderia eu esperar o melhor do mundo, quando o meu próprio pai foi embora de uma hora para outra, sem mais nem menos? A dor não vem de uma simples falta, mas da quebra de confiança.
O que talvez tenha sido pior de tudo foi crescer com uma única pergunta incessante na cabeça: “Por que eu não fui suficiente para ele?” Eu nunca consegui encontrar a resposta. E essa ferida passou a crescer comigo.
Mas, conforme o tempo passou, a vida me deu uma segunda chance – ou pelo menos parecia assim. Eu me apaixonei e, acreditei, dessa vez seria diferente. Ele se chamava Rodrigo. Achava que seria o meu porto seguro, o homem que faria eu esquecer de todo o resto. Aquela ideia torta de que o amor era a cura para todos os males, sabe? Eu era jovem, cheia de sonhos e esperança, então comecei a viver um conto de fadas.
Ele pediu minha mão em casamento no aniversário de um ano de namoro, em uma tarde no parque. Eu achei que tinha conquistado o final feliz que tanto queria.
Infelizmente, o que eu não sabia era que ele também tinha mais uma história para contar. Uma história de traição.
Rodrigo não foi só o meu marido, ele também era o noivo de Nathalia, minha melhor amiga.
Eu confiei nela. Ela era minha amiga de toda a vida. O tipo de amiga que conhece todos os detalhes sobre sua alma, seus medos e sonhos mais íntimos. Ela era a pessoa para quem eu confiava tudo – minha amiga e, sem saber, minha traidora.
Mas o que era mais desolador não era o ato da traição em si, não. Todos nós sabemos que traições acontecem, que as pessoas cometem erros. Não. O que me destruiu foi ver os olhares trocados entre ela e Rodrigo em uma noite de jantar de celebração. Eu soube naquele momento. O que parecia ser uma noite de comemorações virou um campo de batalha. Eles se olharam. Ela sorriu para ele, e foi o suficiente para que eu visse o filme se desenrolar diante de meus olhos. Eu não precisei que nada mais fosse dito. Nada além daqueles olhares, da troca de gestos e sorrisos que traíam tudo o que eu tinha vivido ao lado dela.
O inferno não foi saber que ele me traiu, o inferno foi perceber que ela, uma pessoa que dizia se importar comigo, me enganou o tempo todo.
Naquele momento, a vergonha foi a pior parte. Eu queria fugir, mas ao mesmo tempo não conseguia. Por um momento, tudo o que eu queria era esconder no fundo do mundo e desaparecer.
Mas, eu não desapareci. Eu entrei em modo de sobrevivência. Eu já não acreditava no casamento, nem na amizade. Eu sentia raiva, como um fogo que consome tudo por onde passa.
E é aqui que minha vida começou a mudar de verdade.
Ela tentou se desculpar, ele também. Mas o que eles não sabiam é que aquela traição não era só a deles. Eu também os traí de volta, ao desmoronar em uma farsa que parecia muito boa para ser real. Dizer-lhe um sonoro “Adeus”, ao invés de me afundar em autocomiseração, foi a única forma de realmente partir sem carregar os vestígios dessa dor.
A vingança não vinha em ações físicas, como muitos poderiam imaginar, mas nas palavras, no simples afastamento. Em não mais deixar o meu sofrimento dominar a história.
Foi por isso que decidi, sem hesitar, entrar em um acordo com Letícia e criar o Clube das Solteiras e Traídas. Em meio a tudo isso, encontrei uma mulher de alma forte, disposta a dar risadas da dor. Juntas, criamos algo que se tornaria nosso remédio, nosso santuário. Porque o que mais importa após tanto sofrimento é encontrar um meio de unir forças com outras pessoas que têm seus próprios passados.
No fim, o Clube foi minha maneira de “rebalancear a vida”. De devolver às pessoas aquilo que elas têm de mais importante quando estão em um relacionamento, que é respeito. Foi para aprender novamente a ser eu mesma, sem a toxicidade das relações ou amizades falsas, sem ser lembrada constantemente que alguém que eu amei pode me decepcionar de novo.
Desta vez, sem traições. Sem falsas promessas. E essa experiência me levou a acreditar que se eu podia me reerguer, outras também poderiam.
Com Letícia, aos poucos, o clube foi ganhando corpo. Começou com um simples encontro de amigas e logo se expandiu. Conversávamos sobre as dores, as superações e, principalmente, como nunca mais aceitaríamos menos. Nosso lema era claro: mulheres se ajudam, se respeitam e se protegem, especialmente da dor de traições e abandonos.
Assim, o Clube se consolidou como algo que transcendeu a simples vontade de rir ou fazer piadas da vida. Ele se transformou em uma irmandade próxima e verdadeira, onde nossa força se uniu para que nunca mais nos sentíssemos sozinhas novamente.
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Atualizado até capítulo 90
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