A mansão em estilo hispânico, construída no final da década de 20 por um famoso contrabandista siciliano de bebidas, irradiava luz como uma jóia reluzente encravada no topo de uma colina em Bel Air sendo um dos lugares mais luxuosos, confortáveis e seguros para se viver não só nos EUA. mas também em todo o mundo. Está localizado no oeste de Los Angeles, sul da Califórnia. A sofisticada comunidade residencial está localizada a 230 metros acima do nível do mar, em área montanhosa no sopé das Montanhas de Santa Monica. Bel Air é o lar de aproximadamente 8.000 pessoas que buscam solidão não muito longe de uma das cidades mais dinâmicas da América do Norte. Aqui vivem muitas celebridades e VIPs do mundo dos negócios e da política.
O atual proprietário era um premiado diretor convertido em ativista político, e suas festas sempre viravam notícia.
No terraço coberto, Aimée Sandiego se isolava dos demais convidados, distraída com a brisa noturna que agitava as folhas das palmeiras e a superfície da piscina.
Não era uma mulher alta, mas a silhueta esguia e o porte altivo sugeriram mais altura do que realmente tinha. Seus cabelos, de um tom natural de loiro-claro, estavam presos , realçando o rosto de tez jovem - afinal, estava com apenas vinte e seis anos - e traços clássicos. Somente a expressão nos olhos verdes revelava o cansaço.
Fazia um ano que Aimée trabalhava como assessora do senador Nolan Connor e, no decorrer desse período, participava de algumas festas, não muitas. Entretanto, àquela era diferente. De fato, era a realização de um sonho, pois quando menina ela sempre se imaginava como estava naquele momento: envolvida em seda e tomando champanhe na roda deslumbrante e privilegiada da alta sociedade. Além do mais, naquela noite participava da reunião em comemoração ao aclamado documentário do anfitrião sobre direitos civis americanos... Não estava ali apenas como uma funcionária do senador, porém como sua recém-anunciada noiva.
Contudo, algo parecia errado. Os olhos se tornaram sombrios por um instante com o curso dos pensamentos. Em seus sonhos, ela sempre se imaginara realizada e feliz num ambiente como aquele, orgulhosa de si mesma pela ascensão social e ansiosa pelo futuro. E agora... sentia apreensão e incerteza.
— Mais champanhe, mademoiselle? — Um garçom a abordou com um leve sotaque francês.
— Não, obrigada. — Ela recuou, colocando a taça vazia na bandeja. Partiria numa longa viagem no dia seguinte e já estava suficientemente nervosa. Para que complicar a situação com uma ressaca?
O garçom se afastou com uma discreta reverência e nesse instante Aimée avistou Nolan. Ele vinha sorridente ao seu encontro e ela admirou, como da primeira vez que o vira, a confiança com que se movimentava e que nenhum homem mais jovem poderia demonstrar.
Não que Nolan Connor fosse velho. Com quarenta e oito anos, gozava de plena saúde, excelente forma física e ostentava um charmoso bronzeado. Era um homem que sabia não só para onde queria ir, mas também exatamente como chegar lá, do tipo a que poucas mulheres seriam capazes de resistir e nenhum homem de ignorar.
— Eu a deixei esperando, querida. Perdoe-me. — Ele tomou as mãos dela e a puxou para lhe dar um beijo no rosto. — Mesmo em festas, infelizmente negócios são negócios. Naturalmente você compreende.
— Naturalmente! — Aimée sorriu sem conseguir esconder a ironia.
Nolan ergueu as sobrancelhas escuras em contraste com os cabelos grisalhos.
— Ora, minha querida, se eu não a conhecesse melhor, acharia que está aborrecida. Diga-me a verdade. Está realmente zangada comigo, ou apenas fazendo charme?
O tom era bem-humorado, mas Aimée o conhecia o suficiente para não se deixar enganar pelas aparências. Nolan Connor em um homem de posição, dinheiro e ambição insaciável, que já deixara claro que não pretendia mudar nada na vida depois de casado. Acostumado à condição de solteiro, não estava disposto a cobrir uma esposa de atenções o tempo todo. Aimée sorriu, tomando cuidado para não deixar transparecer os verdadeiros sentimentos. Ela aprendera há muito tempo que as emoções reveladas se voltavam facilmente contra si, e não pretendia se mostrar vulnerável e indefesa como certa vez no passado...
— Não estou zangada com você. — O tom era tão bem-humorado quanto o dele. — Só porque você prefere a companhia de chefes de Estado exilados e suas esposas cobertas de jóias não é motivo para me aborrecer. Talvez fosse o caso de lamentar sua falta de gosto. — Ela conseguiu fazê-lo rir. — Mas nada mais que isso.
— Aimée, querida, você é admirável. — Ele lhe beijou a mão. — Tão jovem e no entanto livre das exigências e expectativas ridículas da juventude.
— Não tenho certeza se isso é um elogio.
— Vindo de mim, querida... — Ele lhe deu o braço —, Não é um mero elogio, mas um tributo. Agora venha... Está quase no fim da festa e você não dançou comigo ainda.
Apesar da diferença de idade, os dois formavam um par notável: ele moreno e impecável em seu smoking feito sobre medida num dos melhores alfaiate do país, enquanto ela claramente em um dos vestidos mais cobiçados, a marca Elie Saab foi fundada pelo estilista libanês Elie Saab em 1982 em Beirute. Tendo ateliês em Beirute, Milão e Paris, igualmente elegante, a altura realçada pelo salto das sandálias exclusivas.
A caminho do salão, foram abordados por várias pessoas e parabenizados pelo recente noivado. Na pista, vários casais dançavam ao som nostálgico do tema do filme Scent of a Woman, executado por uma orquestra.
— Você está linda esta noite, eu já lhe disse isso? — Nolan comentou ao enlaçá-la pela cintura.
— Sim, creio que já. — Aimée sorriu ao acompanhar os passos soltos do noivo.
Entre outras coisas, ele dançava muito bem, com a mesma confiança que seu porte sugeria.
Ela sabia que Nolan Connor era um bom partido, tudo que se poderia desejar num homem. Entretanto, às vezes, quando ele a beijava ou abraçava, como naquele momento, fechava os olhos e o imaginava mais alto, mais jovem, com cabelos pretos e olhos não de um azul-claro, porém escuros e cheios de paixão. Às vezes fingia que não era nos braços de Nolan que estava, mas nos de...
O curso involuntário dos pensamentos a deixou tensa. Lembranças do passado simplesmente não tinham lugar em sua vida agora.
— O que houve, querida? — Nolan a fitou, sentindo sua mudança. — Está com frio? Para mim, até que está quente aqui dentro.
— Não... eu estou bem. — Aimée evitou encará-lo, receando revelar o remorso.
— Só estou um pouco cansada e gostaria de não ter que pegar a estrada amanhã para praticamente atravessar o país.
— Ah, sim. Sua viagem... — A desaprovação no tom de Nolan foi reforçada por um suspiro. — Não preciso lhe dizer como me sinto a respeito, certo?
A música terminou nesse instante e a salva de palmas de praxe à orquestra interrompeu a conversa. O próximo número foi um foxtrot, e Aimée sentiu alívio quando em seguida Nolan sugeriu que fossem embora.
As despedidas constituíam invariavelmente um ritual exaustivo, exigindo bem mais de meia hora e levando Aimée a imaginar se até as próprias celebridades não se cansavam de tanto protocolo. Aquele lado da vida "glamourosa" não lhe ocorreu antes.
O assunto da viagem iminente a Louisiana - a viagem "de volta às origens", segundo Nolam dizia com desdenho e malícia - só viria à tona novamente quando estavam na limusine a caminho do apartamento de Aimée.
Acomodado na poltrona de veludo cinza diante dela, Nolan tirou do bolso do paletó a cigarreira de prata cravejada de pequenos brilhantes. Acendendo a cigarrilha com um isqueiro de ouro, ele se recostou e deu uma tragada, com atenção fixa nela.
— Você não precisa ir, querida. — Uma baforada lenta anuviou o rosto por um instante. — Um de meus advogados poderia muito bem tratar do caso.
Aimée desviou o olhar para a janela, reparando distraidamente nas luzes da cidade de Los Angeles enquanto a mente vagueava a muita distância dali.
— Não, Nolan. Não quero que faça isso. — Não foi preciso ela alterar a voz nem encará-lo para transmitir firmeza. As vezes a irritava aquele convencimento de que não havia um problema que ele não pudesse resolver de um jeito ou de outro. Em geral, por meio do dinheiro. O que mais a irritava, contudo, era que ele quase sempre tinha razão.
Mas naquele caso...
Com a atenção ainda voltada para fora, Aimée mal notou a curiosidade com que Nolan a fitava. Estava perdida nos próprios pensamentos, relembrando o telefonema que recebera há menos de uma semana. O fato de não ter mantido laços propriamente afetivos com o avô que a criara não havia amenizado o choque da notícia de sua morte por enfarte.
Na verdade, a morte do velho ainda não parecia realidade. Provavelmente porque desde a infância nutrira a crença secreta de que Benício Sandiego era de alguma forma imune às fraquezas de qualquer outro mortal; uma alma execrável que viveria para sempre, zombando da vontade divina e em especial de sua neta mais nova.
Um tremor súbito a fez colocar a capa de seda sobre os ombros, no que foi ajudada por Nolan.
— Aimée, querida. — Ele lhe tocava o braço numa carícia discreta. —, Compreendo sua preocupação com o espólio de seu avô, mas não deve deixar essa questão dominar seu bom senso, um traço que admiro tanto em você. — Sua mão deslizou para o anel de diamante que ela exibia na mão esquerda.
— Isto, — só então ela o encarou. — Não tem nada a ver com bom senso, Nolan.
Apesar da nota de irritação, Aimée não queria discutir com ele. Embora enfrentasse as divergências normais de todo relacionamento mais sério, nunca haviam se exaltado um com o outro. Sua relação se baseava no terreno sólido da realidade da compatibilidade de gênios e dos objetivos em comum; não nas areias movediças e traiçoeiras do que chamavam de amor.
Ambos sabiam que deveriam desempenhar satisfatoriamente os papéis que haviam concordado anos atrás em terem. Uma jovem mulher, linda e inteligente, um par perfeito para um futuro homem que desejava chegar à presidência. Amor ou paixão eram para os fracos que não almejavam o sucesso e o poder da vida política.
No caso de Nolan, Aimée era um belíssimo prêmio, e daria uma excelente primeira-dama, na verdade era isso que os eleitores desejam, uma família de conto de fadas e era isso que Nolan Connor lhes daria.
Suspirando, ela se forçou a sorrir.
— Nolan, não vamos discutir. Você deve estar certo quanto à minha agitação desnecessária, mas eu gostaria que compreendesse. Não estou desprezando sua ajuda. Acontece apenas que este é um assunto que preciso resolver sozinha.
A fisionomia de Nolan continuou impassível enquanto se virava para apagar a cigarrilha.
— Muito bem! Então, não vamos discutir. Não gostaria que partisse com a ideia de que não sou razoável.
— Você é. — Aimée sorria, sabendo que ninguém jamais poderia acusar Nolan Connor de não ser razoável. Tratava-se de um homem prático, que lidava com fatos em vez de emoções. E esse era o traço que mais a atraía. Ele não oferecia, e portanto não lhe exigia, reações emotivas. — Sentirei saudades.
— Disso eu faço questão. — Um sorriso complacente curvou os lábios dele. — Quanto tempo ficará fora?
— Por apenas alguns dias, espero. Além disso, você estará ocupado como sempre e mal notará a minha ausência. Sua programação deverá estar toda planejada, e Martina poderá cuidar dos preparativos necessários.
— Tem certeza? — Ele zombou, fazendo Aimée rir.
Martina Coleman era o braço direito de Nolan, encarregada de toda a parte administrativa do gabinete. Ela treinava Aimée para o cargo de assessora de imprensa há um ano, com base em sua experiência anterior como relações públicas do ex-presidente dos EUA.
E sem dúvida seria Martina quem treinaria outra pessoa para substituí-la, depois que se casasse com Nolan. Aimée não exultava com a ideia de largar o emprego, mas, como esposa de um senador, teria compromissos importantes a cumprir. Até ele alcançar o teu desejado objetivo, se sentar na cadeira presidencial.
Durante o resto do trajeto, de San Diego Freeway até o apartamento dela perto de Santa Mônica, a conversa girou em torno do trabalho. Assim que a limusine estacionou, o chofer de uniforme preto se apressou em abrir a porta.
— Quer entrar um pouco? — Ela perguntou já na porta do dúplex.
— Querida, sabe que eu não desejaria mais nada do que passarmos o resto da noite a sós, mas, como você mesma lembrou, terei um dia cheio amanhã e você uma longa viagem pela frente.
Aimée sorriu. Tratava-se de um de seus pequenos rituais de delicadeza. Ela o convidava a entrar e ele dava a entender que a ideia era tentadora, mas... Sempre havia um porém. Ao contrário dos homens mais jovens que ela namorara, Nolan não media a virilidade através do sexo. Como alguém maduro, não precisava provar nada a ninguém. Assim, quando ele a deixava com não mais do que um beijo à porta, Aimée ficava na maioria das vezes conformada.
— Cuide-se querida. — Ele recomendou antes do beijo de despedida.
— É claro. Você fará o mesmo, não?
— Sem dúvida. Agora me prometa que será uma boa menina e fará o que for necessário para resolver essa... essa questão pessoal o mais depressa possível. Senão, irei buscá-la.
Aimée sabia melhor do que ninguém que a ameaça jamais seria cumprida. Assim como soubera que não passariam a noite juntos. E, como sempre, se convenceria de que isso não tinha a menor importância.
Entretanto, parada à janela, acompanhando a limusine preta até perdê-la de vista, ela desejou que apenas daquela vez Nolan tivesse ficado ao seu lado, pois especialmente naquela noite, como nunca ocorrera antes, precisava que alguém a abraçasse, que alguém espantasse os fantasmas do passado que a atormentavam, ameaçando o seu futuro.
Só que não havia ninguém. E ela concluiu que, como de costume, só podia contar consigo mesma. Antes de se comprometer com o futuro, devia deixar o passado definitivamente para trás. Por mais que isso lhe doesse, já estava mais do que na hora.
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Atualizado até capítulo 33
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