Bibi Bittencourt
As horas seguintes foram como um borrão. Quando meu pai e eu voltamos para casa, a casa parecia imensa, cheia de ecos de uma vida que, na verdade, eu ainda não sabia como levar adiante. Mas havia uma sensação crescente dentro de mim, algo que eu não podia ignorar. A decisão estava tomada. Não sabia exatamente como o futuro seria, mas uma coisa era certa: eu estava escolhendo seguir adiante com a gravidez e levar minha vida para um novo caminho, mesmo que ele fosse cheio de incertezas e medos.
Eu ia ter o bebê. E, mais do que isso, eu sabia que a única maneira de sobreviver ao turbilhão que estava por vir seria ir embora. Eu precisava da minha liberdade, da minha própria vida, longe de toda a pressão que sempre exerci sobre mim mesma, e da que minha família impunha. O luxo, a opulência, a aparência de uma vida perfeita – tudo isso já não me fazia sentido. A única coisa que agora importava era o bebê, que seria o único vínculo que eu teria que carregar comigo. E isso, de algum modo, me dava força.
Eu me sentia como se estivesse em um abismo, prestes a saltar. O problema era que eu não sabia se a queda seria longa ou se eu conseguiria voar.
— Mãe, pai… precisamos conversar — disse, interrompendo o silêncio enquanto nos reuníamos na sala de estar. Eles estavam sentados no sofá, seu olhar voltado para mim, esperando o momento que já sabia que estava por vir. Meu coração estava acelerado, mas eu precisava ser firme.
Minha mãe estava com uma expressão tensa, seus olhos fixos em mim, tentando ler a minha mente. Meu pai, ao contrário, estava imóvel, como uma rocha, tentando não demonstrar qualquer reação. Ele sabia que o momento de tomar uma decisão havia chegado, mas a realidade ainda não parecia ter se instalado completamente para ele.
Sentei-me diante deles, de costas para a janela, as luzes de Las Vegas brilhando ao fundo como um lembrete da vida que eu estava prestes a abandonar. As palavras estavam presas na minha garganta, mas eu sabia que precisava seguir em frente.
— Eu tomei minha decisão — comecei, a voz mais firme do que eu imaginava que seria. Minha mãe me olhou com uma mistura de ansiedade e receio, enquanto meu pai simplesmente manteve seus olhos fixos em mim. — Vou ter o bebê.
Houve um silêncio profundo. Eles estavam esperando que eu dissesse mais, que explicasse por que tomei essa decisão tão ousada. Mas as palavras não vieram imediatamente. Eu precisava encontrar uma maneira de explicar a razão por trás da minha escolha.
— Eu sei que isso não é o que vocês esperavam. Sei que não tenho como voltar no tempo e fazer as coisas de uma maneira mais… planejada. — A palavra parecia estranha em minha boca. Na verdade, toda a minha vida parecia ter sido um grande planejamento, sempre tentando controlar cada aspecto, desde os estudos até as amizades e até mesmo meus sentimentos. Eu nunca soubera o que era viver por mim mesma. Agora, tudo estava diferente.
Minha mãe não me interrompeu, mas seu rosto mostrava a dor que ela estava sentindo. Eu sabia o quanto ela queria que minha vida fosse perfeita, que eu tivesse o futuro que ela imaginava para mim. Mas aquele futuro, com todas as suas expectativas e exigências, não era mais o meu.
— Eu não sei como será, mãe. Não sei nem o que vai acontecer. Mas eu não posso ignorar o que estou sentindo. Não posso ignorar a vida dentro de mim. E, mais do que isso, eu preciso de algo que me faça sentir viva, algo que me ajude a seguir em frente. E este bebê… ele é a única coisa que agora faz sentido. — Eu parei por um momento, tentando me controlar. Minha voz tremia, mas eu sabia que tinha que ser forte.
Meu pai finalmente falou, sua voz grave e firme.
— E o que isso significa para nós, Bibi? Vai abandonar tudo? Vai deixar o nosso nome para trás, a nossa casa, a nossa vida? — A dureza em suas palavras me cortou como uma lâmina afiada. Ele sempre teve uma maneira de falar que parecia não permitir espaço para dúvidas. Ele queria saber onde eu estava indo, o que estava fazendo. Queria entender tudo. Mas eu não sabia.
— Não é sobre abandonar, pai. É sobre... — Eu hesitei, não sabendo como explicar. — É sobre viver para mim mesma, para algo que eu escolhi. Eu não posso mais viver para vocês, para as expectativas que vocês têm de mim. Eu preciso encontrar meu próprio caminho, minha própria liberdade.
Eles me olhavam, esperando que eu dissesse mais, que desse algum tipo de explicação para a minha escolha. Eu sabia que eles estavam perdendo o controle sobre minha vida, e isso os deixava inseguros. Eles não estavam acostumados a ver a filha deles tomando as rédeas de sua própria vida de forma tão radical.
Minha mãe finalmente falou, a voz tensa, mas com uma preocupação genuína.
— E o que você vai fazer, Bibi? Vai embora… para onde? Vai criar essa criança sozinha? Como vai viver? Não tem ideia de como as coisas funcionam no mundo real. Você não pode simplesmente sair e esperar que tudo se resolva sozinho. — Ela parecia quase desesperada, tentando me convencer de que essa decisão era um erro. Eu entendi sua preocupação, mas, ao mesmo tempo, aquilo só fazia minha decisão parecer ainda mais certa.
— Eu sei que vai ser difícil, mãe. Mas eu vou seguir meu próprio caminho. Eu vou embora de Las Vegas. Eu preciso de espaço, preciso da minha liberdade. Não posso viver sob o peso da nossa vida aqui, da nossa história. Eu preciso descobrir quem eu realmente sou sem todo esse glamour, sem as pessoas esperando sempre o melhor de mim. — Eu olhei para os dois, meus olhos cheios de determinação. — Vou ficar com o bebê. Vou ser mãe. Mas não quero que isso signifique que vou continuar na mesma rotina. Eu preciso de algo mais.
Meu pai se levantou da cadeira, caminhando para a janela. Ele estava pensando, tentando processar tudo o que eu tinha acabado de dizer. Eu podia ver o quanto ele estava machucado com a minha decisão, como se eu tivesse rasgado uma parte dele ao meio. Mas eu sabia que ele precisava aceitar. Isso não era apenas sobre ele e sobre as expectativas da nossa família. Era sobre mim. Sobre o que eu precisava para ser feliz.
— Onde você vai? — minha mãe perguntou, a voz mais calma agora. Ela estava tentando entender, mas ainda sentia um medo que parecia sufocá-la. Ela queria garantir que eu tomasse uma decisão sensata, que não jogasse minha vida fora.
— Eu não sei ainda. Só sei que preciso ir para um lugar onde ninguém me conheça, onde eu possa começar de novo. — Eu respirei fundo. A decisão estava tomada, e não havia mais volta.
Meu pai voltou para a cadeira, sua expressão mais suave, mas ainda carregada de incerteza. Eu vi que ele estava tentando entender minha visão. No fundo, eu sabia que ele me amava, que queria que eu fosse feliz. Mas o que ele não compreendia era que, para eu ser feliz, eu precisava me afastar do que ele considerava felicidade.
— Se você vai embora, então que seja de maneira inteligente, Bibi. Não faça escolhas impulsivas. Você tem muito para aprender ainda. E não podemos te proteger de tudo, mas sempre estaremos aqui para você.
Aquelas palavras, embora ditas com uma certa frieza, me deram um tipo de alívio. Ele sabia que eu estava seguindo meu caminho, mas ele ainda estava me oferecendo apoio. Talvez não do jeito que eu esperava, mas estava ali, e isso fazia toda a diferença.
Olhei para minha mãe e meu pai, e pela primeira vez em muito tempo, senti que, talvez, eles realmente estivessem me entendendo. Eles não gostavam da minha decisão, mas eles sabiam que não havia mais nada que pudessem fazer para mudar minha mente.
— Eu sei que isso não é fácil para vocês — falei, minha voz baixa, mas sincera. — Mas eu tenho que fazer isso. Eu espero que um dia vocês possam entender.
Com isso, levantei-me, saindo da sala com o peso de uma nova vida nas costas. Eu estava dando o primeiro passo para algo totalmente novo, algo que eu nem sabia se estava pronta para enfrentar. Mas uma coisa era certa: eu não poderia mais viver pela vontade dos outros. Agora, era hora de viver por mim mesma. E eu faria isso. Com ou sem a compreensão deles.
Enquanto eu saía, a certeza de que estava seguindo o caminho certo me envolveu. Eu iria dar à luz uma nova vida — uma vida que seria minha, só minha.
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Atualizado até capítulo 101
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