HOJE

Tenho que organizar as coisas, deixar tudo anotado e pronto porque essa semana, ou melhor, os próximos 30 dias serão mais corridos que o normal. Vou iniciar esse curso logo, que já adiei por muito tempo mas que agora agregará e muito à minha vida pessoal e profissional. Mas de verdade, meu dia já é tão corrido e ainda ficar com 30 noites comprometidas. O curso mudou a data de início três vezes, e prá completar no 2º dia de aula era meu aniversário. Tudo bem que este ano a comemoração será diferente e não tô com pique prá nada.

Quando Felipe viajou a gente já tinhamos falando sobre esse esfriamento entre nós e depois de 3 meses ele veio em casa resolver algumas coisas no quartel e vê a família, passou 8 dias aqui mas ficamos praticamente separados. Eu estava trabalhando, ele ia muito pra casa dos pais e eu sentia ele diferente, tipo envergonhado e me evitando. Só fiquei mais encucada e achei estranho porque nos falavamos todos os dias e era como não tivesse mudado nada mas esses dias comigo ele estava distante. Chorava muito porque vi que estava no fim. Procurei não forçar mais a barra quando um dia antes de retornar ele me chamou pra sair e eu disse que não queria mais.

- eu reservei um lugar pra nós dois, a gente sair um pouco e matar a saudade...

- Hoje? Sério mesmo isso Felipe?

- Não entendi Letícia.

- Um dia antes de você ir embora? Você chegou e sequer me deu um abraço e sumiu a semana toda chegando só a noite pra durmir. E porquê? Prá não ter que dizer a ninguém que nosso casamento acabou?

- Eu, bem eu realmente me perdi nos compromissos do quartel e com meus pais mas não achei que fosse se chatear. Me desculpe.

- Não acredito que seja isso Felipe mas você quem sabe o que acha melhor me dizer. Mas hoje não quero mais ir a lugar nenhum com você.

- Mas Letícia, ainda temos hoje prá ficar juntos. Eu já viajo amanhã logo cedo.

- Eu sei que não estávamos bem, sei que falamos de dar um espaço um ao outro, mas quando você viajou nos despedimos e foi, prá mim, maravilhoso. Nas ligações na verdade, nem parecia que pensamos em nos afastar ou separar. E você chega e nem um dia se aproximou de mim. Entendo que se não quer mais, conheceu alguém, você nem aqui deveria ter ficado quanto mais me deixar como vc deixou a semana toda.

- Eu tô confuso. Eu não deixei de ter sentimentos por você mas eu não sei o que me aconteceu. muitos dias distante e eu ... Mas não terminamos nosso casamento e nem eu quero isso.

- Deveria ter ficado na sua mãe então pelo menos assim eu não criava expectativas e nem sofreria o que sofri essa semana. Olha, pega a sua mala e vai pra um hotel, prá casa dos seus pais. Prá onde você quiser! não precisa se preocupar comigo, eu tô sabendo me virar.

saio do quarto chorando...

Tenho minha parcela de culpa, que agora com a ausência dele consigo perceber algumas coisas que negligenciei. Eu sempre gostei de cuidar de tudo relacionado a nossa rotina de casal como casa, alimentação. Muito trabalho, cursos, e ele, a mesma coisa e como se não bastasse essa convocação para uma missão por 03 anos, passando por vários estados.

Nos finais de semana não tínhamos mais tempo prá nós dois, porque não faltavam coisas para deixar pronto, curso, aulas e trabalhos extras e enfim. Tudo isso também piorou depois que perdi nosso bebê. É uma situação que guardo e não superei ainda portanto o assinto se torna dolorido ainda. E ele sei que sempre foi louca pra ser pai mas infelizmente não aconteceu até então.

Quando essa proposta chegou, achamos de cara que nos faria bem, um tempo separados, íamos avaliar o nosso relacionamento e tal, mas a verdade é que sinto tanta saudade dele, já queria desistir desse “tempo” mas também precisava deixar que ele pesasse o que era melhor prá ele. Não queria forçar uma barra por que eu já estava com saudades, pois na minha cabeça ele poderia não estar mais querendo continuar então eu deixaria ele decidir.

Me pego lembrando, já estava sentindo falta do que eu precisava fazer, cuidar das coisas dele, de ser esposa e a amiga com sempre fui. Que saudade!!! Ah saudade de quando dormíamos juntos, agarradinhos.

- Vem amor, vira pra eu te abraçar. (ele amava dormir de conchinhas e eu também)

- Hum dormir assim Lipe é sempre um perigo. Mas eu amo dormir abraçadinha com você, sentindo você me proteger.

- vem minha princesa, amo te agarrar e me enterrar no seu pescoço cheiroso e sentir essa pele macia.

Éramos assim, eu amava dormir agarrada com ele, ele também. Eu virava deitando em seu peito e relaxava. Dormia como uma rainha e ele muitas vezes colocava a perna em cima do meu corpo e como eu amava tudo isso. Juntos, éramos um!

Felipe não foi embora e dormiu em outro quarto. No dia seguinte, antes de viajar ele preparou café e me aguardou levantar. Era sábado e ele só queria sair quando a gente conversasse. Acordei e me ajeitei, descendo pra começar o dia. A cara tava bem inchada do tanto que chorei.

- Bom dia Lê.

- Bom dia. Achei que já tivesse saído.

Ele me puxa, abraça e beija minha testa. Me direciona pra tomarmos café.

- Eu estava esperando você acordar pra sair.

- Tá certo. Já pode se organizar, não se atrase por minha causa.

Ele me pediu desculpas mais uma vez e conversamos resolvendo dar um tempo em nosso relacionamento. Foram 10 anos. Fomos muito ligados, parceiros, apaixonados e com muita cumplicidade, mas que estava, tenho que admitir, muito desgastado.

Às vezes me pergunto, como nos distanciamos dessa maneira?

Não tínhamos filhos, eu tinha sofrido um aborto no início do nosso relacionamento e três anos depois fui acometida de uma gravidez nas trompas, que quase me levou à morte. Depois disso, meu médico havia dito que poderia ainda engravidar, mas as chances eram menores por ter apenas uma das trompas e também havia possibilidade de ter algum entupimento ou dificuldade na outra trompas. Mas foram duas situações dolorosas e teve um tempo que resolvi fazer exames mas estava tudo ok. Então se fosse pra ser mãe, Deus me daria esse milagre no tempo dEle.

Volto a realidade, nos despedimos e então ele se foi mais uma vez… só que dessa vez doeu demais

Tinha passado mais dois meses, e decidimos deixar cada um seguir seu caminho e iríamos respeitar um ao outro sempre. Quando voltasse decidiríamos sobre nossos bens e até sobre nós dois. Na verdade, tudo que temos conquistamos juntos. Tínhamos a casa no interior, no terreno de herança de seus pais que era nosso lugar de paz e a nossa casa na cidade que devido a nossos trabalhos e correria, era onde ficávamos a semana. Cada um tinha seu carro porque os trabalhos eram em direções e horários opostos. Não éramos de brigar por nada material.

Mesmo com essa decisão, era difícil de nos acostumar em não nos falar em ligações, os eu te amo, se cuide, minha princesa, meu amor. As contas de casa, ele fazia questão de pagar. eu acabei voltando a ter contato com ele depois da segunda partida.

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