O Sol iluminava o quarto todo quando acordei com o som metálico batendo em um tilintar irritante, me virei na cama tentando não fazer barulho algum, me movendo lentamente até que estivesse em pé no chão. A cama era minha, é claro.
Eu já estava desperta quando cheguei até o tubo na parede oposta, a tubulação de mensagens entre o Estado e seus funcionários de dentro e fora do Burgo. Eu estava dentro, na parte mais alta onde viviam as pessoas de maior posse então sabia que não era o comunicado de evacuação ou de suprimentos negados. Essa mensagem só poderia vir de um lugar, o Departamento de Investigação Criminal.
Tentei controlar a emoção como aprendi no treinamento, mas era quase impossível, abri o vidro no final do tubo e tirei a lata estreita e comprida carimbada com três laços interligados que representavam o Burgo, a Área das Ilhas, lar dos licantropos e a Cidade do Minério dos vampiros. Abri e deixei que o pergaminho enrolado escorregasse para fora, não havia nenhuma palavra, apenas um horário. Onze horas.
Olhei no relógio em cima da mesa de cabeceira, ainda era cedo, respirei fundo e ignorei totalmente o homem que resmungava em seu sonho.
Me formar na Academia tinha sido meu mais impressionante feito, a maioria dos que se arriscaram no treinamento acabavam mortos, inválidos para o trabalho ou desistiram no caminho, mas eu não. Fui a primeira, da minha turma, a concluir todas as etapas.
Mesmo assim, aquela era a primeira vez que me chamavam no Departamento, desde que me tornei Sentinela.
Me sentei em frente a penteadeira e escovei meu cabelo curto, prendendo as mechas escuras, que caiam na testa, com grampos na parte de trás. A maquiagem não levou muito tempo, era a mesma de sempre, batom vinho e olho preto esfumado. No closet, peguei o conjunto azul marinho de terninho e saia feitos sobre medida, meia-calça preta e sapato de salto fino.
As duas malas Hermés, feitas por encomenda, estavam prontas no canto, mas não quis parecer tão desesperada quanto estava. Se precisasse, voltaria para pegá-las.
Apanhei minha pistola de três canos no cofre, em cobre e empunhadura de madeira escura, incrustada de madrepérolas de um lado e fios de ouro no outro. Mas o que essa arma tinha de mais impressionante era seu carregamento automático a partir de um carretel preso na parte de cima, me dando trinta tiros sem precisar trocar.
-Bom dia - a voz masculina e sonolenta me assustou. Ele ainda estava aqui?
-Bom dia, Brad.
-Brian.
-Brian - repeti sem sentir nenhum tipo de remorso pela confusão, estava implícito que seria apenas casual - se importa de sair pela porta dos fundos? - ele balançou a cabeça sutilmente - E em silêncio, por favor.
Desci as escadas com passos decididos, as batidas do meu coração superavam o som do salto batendo no piso, virei a esquerda passando pela grande galeria até chegar no cômodo mais afastado.
-Pai? Posso entrar? - perguntei abrindo uma pequena fresta na porta, ele estava ao telégrafo, batendo o indicador no pequeno botão, o olhar variando entre o objeto e um pequeno caderno. Esperei um minuto inteiro até que ele fizesse sinal para que eu entrasse.
Seus olhos me queimaram, senti seu julgamento no fundo da minha alma, enchi o peito de coragem para falar mesmo tendo as mãos ainda trêmulas.
-Fui chamada no DIC, acredito que para a primeira missão.
-Tenha sucesso.
-Sim, senhor.
-E não se anime muito, no começo eles dão algo pequeno como saqueadores de loja ou acidentes domésticos. Eu mesmo passei quase um ano apanhando batedores de carteira na rua principal.
-Sim, senhor. Só vim avisar que não tenho hora para chegar em casa, hoje.
Ele abaixou os olhos de volta ao caderno e seu dedo bateu algumas vezes mais no telégrafo. A conversa tinha acabado, mas o que eu esperava que acontecesse?
Tomei o caminho da porta da frente e saí para a rua, o lado de fora era bem menos glamouroso, as ruas vazias exceto por um ou outro transeunte que corria apressado em sair da rua.
Os vampiros estavam atacando a parte alta do Burgo de maneira esporádica, de modo que não dava para saber se o bonde que eu tomei explodiria antes de chegar no meu destino. Mas eu era uma Sentinela e como tal, não podia deixar que os malfeitores me intimidassem.
Saltei do bonde no meio da rua principal, do outro lado da rua o prédio de quase 160 andares se erguia entre os trilhos e dirigíveis de transporte, o lado de dentro da Sede de Estado estava lotado, diversos funcionários chegavam pelas entradas laterais, rumo aos seus postos.
Eu era um deles, prendi meu distintivo no bolso do blazer, três argolas que se entrelaçavam e o nome do meu cargo logo abaixo, antes das letras DPI.
Avancei os últimos metros até o elevador que chegara ao saguão e entrei menos de um segundo antes das portas fecharem.
- Departamento de Investigação Criminal\, por favor.
- Nova sentinela? - perguntou a ascensorista.
- Sim - respondi com um breve sorriso - imagino que tenha ouvido falar.
- Ah não - ela riu acompanhada de duas ou três pessoas dentro do elevador e apontou para meu peito - o broche é bem visível.
- É um distintivo - balancei meu cabelo e mantive o olhar a frente enquanto o elevador subia.
Estar ali era importante, as únicas pessoas acima dos sentinelas na pirâmide da lei eram os chefes de departamento e os Estatais, um conjunto de velhos que comandavam tudo em Domínio, um deles era meu pai.
- DPI - ela anunciou assim que paramos.
- Acho que quis dizer\, Departamento de Investigação - corrigi de forma autoritária.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 132
Comments
Ana Cristina
Adorei o capítulo
2023-05-20
0
legal
2023-04-27
0