O tempo em que eu fiquei no
orfanato, eu só rezava para que o juiz deixasse que a minha madrinha me
adotasse, tinha medo de ser entregue para outra pessoa, mas quando a Stella me
disse que estava tudo certo e que logo eu estaria em casa novamente, ela quis
dizer que eu estaria com a pessoa que vem mudando a minha vida.
E quando cheguei a sua casa,
depois de ver tudo que ela tinha feito por mim, o quarto, as roubas e os
calçados e até mesmo a escola, eu sabia que tinha encontrado um anjo em minha
vida.
Sempre acordo com os pesadelos,
sinto como se as mãos daquele homem ainda estivesse em mim, ouço a sua voz em
meu ouvido, tento me soltar, mas não consigo, meu Deus, ele voltou, ele não
morreu, sinto o ar me faltar, acordo assustada e suando muito, olho para o
quarto, mas não tem ninguém, a luz do abajur, mesmo sendo fraca, consegue
iluminar todo o lugar, fico procurando, mas a porta está fechada, me mantenho
acordada, tenho medo, as horas vão passando, quando sinto que ele não voltou, é
que consigo pegar novamente no sono.
Sou acordada pela minha madrinha,
que me chama com tanto carinho, acho que ela tem medo, e assim que eu consigo
abrir os meus olhos, posso ver o sorriso dela, me olhando.
― Bom dia Bia! Está na hora de
acordar, hoje vou te levar para conhecer a escola nova.
― Bom dia madrinha! Já vou me
levantar.
Ela sai e me deixa sozinha no
quarto, o meu corpo está todo dolorido, acho que foi por ter sido acordada a
noite e ficar um bom tempo sem dormir. Vou para o banheiro, faço a minha
higiene, entro no box e tomo banho, volto para o quarto e dentro do closet, eu
não sei qual roupa escolher, decido pegar uma calça legging preta e uma
camiseta bordô, coloco o tênis, prendo o cabelo num rabo de cavalo, e como não
uso maquiagem, saio do quarto em direção a cozinha, e assim que me sento, ela
vem com o pão fresquinho, leite e café, faminta, como tudo.
Depois de terminamos o café, ela
foi pegar a sua bolsa e juntas, saímos, como era perto, fomos andando e todos
que a parava, perguntava quem eu era, ela não escondia que eu era sua filha de
coração, era isso que ela respondia.
Quando paramos no portão da
escola, fomos recebidas pelo diretor, que já estava nos esperando, ela contou
tudo o que tinha me acontecido e que agora ela seria minha mãe.
― Roseli, pelo tempo que a
conheço, sei que para ter adotado essa menina, o seu coração já deve amá-la,
você mais uma vez mostrou que tem um coração enorme, sempre vi isso em cada
doação que fez para as crianças do abrigo. Pode deixar que cuidarei muito bem
de sua filha. Aqui, ela terá toda a ajuda necessária, e mais uma vez, parabéns
pelo seu ato de amor.
― Eu me sinto muito bem ajudando
as pessoas e as crianças do abrigo, não tem ninguém por elas, se todos fizessem
isso pelo menos uma vez por mês, tenho certeza de que as crianças não passariam
tanta necessidade, quanto a Bia, ela tocou o meu coração, acho que era chegado
a hora de eu compartilhar a minha vida com alguém e nada melhor do que uma
menina sozinha como eu.
― Deus soube colocá-la em seu
caminho, porque tinha que ser.
― Com certeza foi isso sim.
Ele me levou para conhecer a
escola, era muito grande, existiam, além dos cursos normais, outros de
graduação, fui apresentada a várias pessoas, além das aulas normais, eu teria
que passar por psicólogo e terapeuta, pois era uma regra da escola, depois fui
levada junto com a madrinha para a área de esportes e lazer, tudo era muito bem-organizado.
Saímos da escola e voltamos para
casa, mas antes, passamos na sorveteria, ela comprou dois podes de sorvetes,
segundo ela, seria nossa sobremesa hoje, assim que chegamos em casa, ela foi
tratar de fazer o nosso almoço, mesmo eu tentando ajudar, ela não deixou, pediu
que eu arrumasse a minha mochila para o outro dia, os livros que ganhei e os
cadernos, tudo era personalizado com o emblema da escola. Depois que almoçamos,
ela teria que ir trabalhar, pediu que eu trancasse a casa, me ligaria para
saber se eu estava bem, e que eu não abrisse a porta para ninguém.
O dia se passou bem rápido, como
a minha mãe tinha me ensinado a cozinhar, eu resolvi fazer a nossa janta,
preparei um arroz com brócolis, file de franco e uma salada verde. Depois de
tudo pronto, fui para a sala ver televisão, não demorou muito até a porta ser
aberta por ela.
― Oi! Está tudo bem por aqui?
― Sim madrinha!
― Que cheiro bom é esse?
― Eu fiz a nossa janta! Espero
que a senhora goste.
― Pelo cheiro, com certeza irei
gostar, vou tomar um banho e já venho para jantamos.
Ela saiu pelo corredor, eu fui
colocar a mesa, e quando ela voltou me contou sobre o seu trabalho, eu ainda
não tinha nada para contar, já que fiquei em casa, mas amanhã eu teria, depois
da aula, limpamos a cozinha juntas, quando tudo estava limpo, fomos ver
televisão e quando chegou a hora de ir dormir, eu já imaginava novamente sonhar
com aquele homem. Fui para o quarto, troquei de roupa e me deitei, ela veio me
dar boa noite, me deu um beijo na testa e saiu. Liguei o abajur, fiquei um bom
tempo acordada, mas senti que o sono estava chegando, me arrumei melhor na cama
e nem vi quando adormeci.
Não sei que horas são, mas uma
vez tenho a sensação de que ele está aqui, as mãos tocando meu corpo, seu
cheiro chega até as minhas narinas.
Não! Meu Deus, não, por favor, o faça ir embora.
Começo a gritar e a chorar pedido
para que ele vá embora, sinto alguém me sacudindo.
― Bia! Acorda!
― Madrinha... Ele voltou.
― Não tem ninguém aqui, filha,
foi um sonho ruim, já passou.
Eu a abraço e choro em seu colo,
desta vez, eu conseguir gritar e alguém veio me ajudar, ela fica passando a mão
em meus cabelos, com isso o sono volta, escuto ela dizer que vai ficar comigo,
que não vai me deixar.
Sou acordada por ela no outro dia, quando abro os
meus olhos, percebo que ela dormiu na pequena poltrona que tem no quarto, me
sinto culpada, pois sei que deve ter sido muito desconfortante para ela.
― Acorda Bia! Não pode se atrasar
no seu primeiro dia.
― Bom dia madrinha.
― Bom dia, Bia! Eu não quero
pressionar, mas quando quiser conversar, saiba que estou aqui, sei que algo
aconteceu com você, e ontem não foi o primeiro pesadelo que teve, mas eu sei
esperar o momento certo em que confie em mim, jamais vou julgar você.
― Eu sei madrinha, eu só não
consigo falar.
― Tudo bem Bia, sei esperar,
agora se levante e vá se arrumar.
Depois do banho, vesti o meu
uniforme e arrumei os meus cabelos, calcei o meu tênis, saí do quarto com a
minha mochila, fui para a cozinha tomar meu café, comi bastante, estava com
fome, depois me despedi e fui para a escola.
Cheguei à escola, fui direto para
a sala de aula, me sentei e como não tinha muita gente ainda, pude ver cada uma
das pessoas tomando os seus lugares, até imaginei que onde eu me sentei poderia
ser de alguém, mas não.
― Oi, eu posso me sentar ao seu
lado?
― Sim, pode!
― Eu sou Mariana, como se chama?
― Me chamo Beatriz!
― É o seu primeiro dia aqui
também?
― Sim!
― Podemos ser amigas, já que
somos novas e não conhecemos ninguém ainda.
― Eu gostaria muito de ter uma
amiga, não tenho nenhuma, só a minha madrinha.
― Então seremos amigas, eu também
não tenho, me mudei há duas semanas, com o meu pai, ele foi transferido da
empresa para cá, e como só somos nós dois...
― Eu já morava aqui, só que num
bairro mais afastado, eu e minha madrinha também somos só.
― Você não tem pais?
― Não, eles morreram, minha
madrinha me adotou.
― Eu não tenho a minha mãe, ela
foi atropelada há dois anos, ficou em coma por dois meses, mas as lesões foram
muito graves e ela não resistiu.
― Perdemos pessoas que amamos,
teremos muita coisa para conversar.
Paramos de falar, pois a sala já estava cheia e o
professor tinha entrado, fiquei contente em encontrar alguém da minha idade
para conversar, além da minha madrinha. Depois da aula, seria a minha primeira
vez com o psicólogo e o terapeuta, eu estava com medo, não sabia o que falar ou
como agir. Sigo para o outro prédio, chego a uma sala, e vou direto à recepção.
― Boa tarde!
― Boa tarde, em que posso te
ajudar?
― Me mandaram aqui, eu tenho uma
consulta com o psicólogo e o terapeuta.
― Ah, sim, o Doutor Rodrigo é o
psicólogo e terapeuta, só um minuto que vou avisar que está aqui. Qual o seu
nome?
― Beatriz.
Sento-me e fico esperando-a
voltar, e assim que a vejo, me levanto.
― Pode entrar, ele a está
esperando.
Sigo para a sala, quando chego em
frente a porta, ela estava encostada, bato e escuto um “pode entrar”.
― Seja muito bem-vinda Beatriz,
já deve saber o meu nome, teremos sessões duas vezes por semana, então não
quero que fique com medo, estou aqui em primeiro lugar para te ajudar, pelo que
me foi informado, tem pouco tempo que perdeu sua mãe, e não tem seu pai. Como
somos humanos, guardamos sentimentos bons e ruins, por causas de nossas dores
não conseguimos expressar ou mesmo dividir com outra pessoa o que sentimos e
precisamos de uma pessoa que nos entenda. Dependo da dor, ela pode até provocar
insônia, pesadelos e outras situações, que impedem de seguimos nossa trajetória
de vida, mesmo tendo outras pessoas ao nosso lado, quero que confie em mim, eu
serei além do seu médico, seu amigo, o que me contar, não passará dessa porta,
porque seria falta de ética profissional e se tem uma coisa que prezo muito, é
minha profissão, sou médico há quase 20 anos.
Ficamos conversando por um tempo,
hoje foi mesmo para conhecê-lo e ele saber um pouco mais sobre mim, há muito
tempo não me sentia bem na presença de um homem como me senti com ele, e saber
que eu podia falar tudo que me aconteceu e ninguém ia saber, me deixou
aliviada. Mas eu ainda não sabia como contar tudo o que me aconteceu, isso me
faria lembrar aquele homem. Fui para casa, amanhã seria outro dia, como ele
disse, eu tinha que viver um dia por vez, e era isso que eu iria fazer.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 57
Comments
Somalia Oliveira
será pai dela não morreu
2024-04-08
0
Shirlei
Vai ser uma história emocionante, com certeza.
2023-10-24
2
ʎqǝᗡ 🐝
💔
2023-01-10
3