l. Evitar diálogos sem valor
Como escrever um diálogo bom? Antes de pensar nisso, no primeiro considerarmos a necessidade de um diálogo?
Qual a função do diálogo? Movimentar a história. Diálogos precisam passar alguma coisa. Avançar a história de alguma forma. Nenhum diálogos sem valor deve ser mantido.
Uma das maiores dicas para melhorar seus diálogos é prestar atenção em como as pessoas falam na vida real. Porém, quanto mais você observar as conversas a seu redor, vai notar como falamos coisas desnecessárias para um diálogo. "Oi, tudo bem?" que não pedem resposta. "E aí? Beleza?" apenas para reconhecer que viu a pessoa. E mais banalidades. Isso não é diálogo, isso é conversa.
Diálogos fazem a história andar. Conversas não, apenas perdem tempo. Você deve criar diálogos e não conversas. Eu sei que volta e meia umas pequenas banalidades são necessárias para deixar as coisas naturais, mas não exagere. Lembre-se do objetivo do diálogo.
Por exemplo:
Fulano avisou que iria ao mercado e voltaria só à noite.
— Vou no mercado e volto só à noite — disse fulano.
A narração já apresentou a mensagem, qual a importância do diálogo aqui? Nenhuma. Não faça isso, você apenas estará tomando tempo do leitor com coisas assim.
Diálogos nada mais são do que um recurso para contar a história. E, como tal, eles possuem funções claras. Precisam exercer um papel e não somente estar lá no seu capítulo por estar.
Primeiramente, os diálogos são uma forma de avançar na narrativa. Nenhum diálogo deve existir sem avançar em algum ponto a trama, nem que de forma sutil. Se dois personagens começam a falar um com o outro e nenhuma informação relevante sai disso, eles não tiveram um diálogo, tiveram uma conversa. Conversas não avançam a trama, sua novel não deve ter conversas, deve ter apenas diálogos.
Além de avançar a trama, diálogos devem realizar uma ação interna. Mas o que seria isso? Seria mostrar o interior dos personagens: seus pensamentos, sentimentos, estado de espírito, gostos, vontades, motivações. A menor e mais sutil das escolhas nos diálogos pode mostrar muito mais do personagem do que uma narração explanando tudo.
É por meio dos diálogos que o leitor deve perceber o que o personagem sente, sem que o narrador veja a necessidade de explicar isso. Em vez de colocar seus personagens falando algo e depois um dicendi como "disse, cansada", tente passar essa ideia somente pelo diálogo. Uma fala "não aguento dar mais nenhum passo, apenas me deixe falecer em algum canto" diz mais sobre uma pessoa cansada de andar do que um "- estou cansado - disse ele, exausto".
São pequenos detalhes da personalidade e da forma que o personagem enxerga o mundo que devem ser passados por meio dos diálogos. Um bom diálogo mostra mais sobre a história do que a narração.
ll. Preste atenção ao ambiente do diálogo
Outra dica importante na hora de escrever diálogos: o ambiente. Você vai pregar a palavra de Lorde Satã aos berros dentro de uma igreja católica? Ou seus personagens vão entender sussurros no meio de uma balada? Onde seus personagens estão enquanto conversam? Eles se sentem confortáveis ali? Estão falando algo que pode ser ouvido por passantes? Não? Como eles se portam enquanto falam? São todos pontos válidos que você precisa se questionar quando começar um diálogo.
Muitos entendem a verossimilhança como apenas uma forma de tornar as histórias mais críveis para a nossa realidade. No entanto, há mais para ela do que isso. Existe, obviamente, o fator de tornar uma história mais crível, para não quebrar o clima da leitura. Nada de colocar japoneses comendo coxinha no meio da Índia e jogando pelada depois... não sem um bom motivo ao menos.
A linguagem usada pelos personagens deve soar autêntica dentro da ambientação em que estão e verdadeira para eles mesmos. Voltamos a parte de conhecer bem seus personagens. Na situação em que estão, eles falariam daquela forma? Isso faz sentido para eles nesse momento? São várias coisas que você deve levar em conta antes de fazer os personagens abrirem a boca.
Como um delinquente falaria? Como a diretora de uma renomada faculdade falaria? Como uma deusa falaria com um jovem antes de enviá-lo para outro mundo?
Um diálogo inverossímil faz com que o leitor deixe de acreditar no que está lendo. Você quebra a expectativa do pior jeito possível e acaba com a relação de leitura que sua obra poderia criar com ele.
Um diálogo ruim, uma narração ruim faz com que o leitor se sinta expulso. Quando estamos diante de um bom texto, perdemos a noção de que estamos lendo um texto e nos sentimos parte daquilo.
lll. A voz de personagens
Agora, o mais fundamental na hora de se escrever um diálogo: a voz dos personagens. Eu falo de forma diferente que você. Que fala de forma diferente do Trump. Que fala de forma diferente do Biden. Que não fala como um senhor de 80 anos. Que não fala como uma acriança de 5. Pessoas que moram no Nordeste falam diferente das que moram no Sul.
Ninguém fala da mesma forma. Todos temos sotaques e falamos de jeitos diferentes. Muita coisa está sendo transmitida em nossas falas, desde nossa origem, criação, escolaridade, modo de pensar, e vários outros fatores que nos tornam o que somos hoje. Acredite, as mínimas diferenças marcam os personagens.
Ela fala de forma educada porque recebeu uma educação rígida? Ele é um filhinho de papai, mas comete várias gafes na fala por não se importar com a imagem que passa? Ela não teve boas condições de estudo, mesmo assim tenta falar "certinho" para que não a julguem?
Lembrando que ninguém fala como um dicionário ou um livro de português. Nós falamos errado. Isso é um fato. Se seus personagens falam com todos os pronomes oblíquos e vocabulário rebuscado, quem vai acreditar que são adolescentes e não robôs?
Ainda assim, não vale tudo na hora de diferenciar as falas dos seus personagens. Não abuse de erros de português e gírias. O leitor precisa entender o que as personagens estão dizendo.
Bons diálogos trazem falas específicas que nos ajudam a definir os personagens. Por isso, antes de criar os diálogos, é importante conhecer bem seus próprios personagens. As palavras que eles usam, como eles as usam, refletem as condições sociais, econômicas, culturais e muito mais.
Seus personagens devem demonstrar vida por meio dos diálogos.
lV. O tamanho do diálogo
Outro ponto importante é o tamanho do diálogo. Se a fala do seu personagem ultrapassar 4 linhas, pare e revise. Por que ele está falando tanto assim? É difícil alguém conseguir falar tanto sem interrupções do ouvinte, exceto em alguns raros casos, como palestras e afins. Mas pense bem no tamanho das suas falas, quanto mais longas forem, mas cansativas se tornarão.
V. Tom de falar
Você não tem o poder da entonação contido na fala, então precisa passar apenas com a escrita o que seus personagens querem comunicar. Faça bom uso da sua narrativa para demonstrar os sentimentos contidos nas palavras, fulano falou com que tom? Ele disse, gritou, berrou, sussurrou ou apenas falou? Use bem o seu dicendi, não abuse dele. Ninguém gosta de diálogos do tipo:
— Oi — disse ele. — Tenho algo importante para falar.
— Tá — respondeu ela.
— Então... — começou.
— Espera — interrompeu ela. — Antes disso...
— O quê? — perguntou.
Vl. O silêncio também é important
Diálogos são importantes, isso já está bem claro, espero eu. Contudo, o silêncio também é. O significado por detrás de uma falta de resposta pode ser imprescindível para formar a cena. Você precisa saber quando parar um diálogo, quando interrompê-lo ou finalizá-lo.
Tudo em exagero é ruim, exceto chocolate, até diálogos. Não use apenas diálogos para avançar sua história, dose a quantidade de diálogos. Quem aguenta páginas e páginas só de conversa? Há momento em que você só quer que algum personagem chegue e diga "PAREM DE FALAR DE UMA VEZ!" .
Além disso, os diálogos também precisam de ritmo?
Vamos pensar no que é um diálogo, são duas ou mais pessoas conversando, uma troca não somente de informações e opiniões como também uma troca de ações e reações. Se você diz que acha Suzumiya Haruhi ruim, eu respondo com um "diálogo" na sua cara.
Diálogos devem sempre provocar uma tensão em direção a um clímax.
Diálogos são ações e reações que vão intensificando a cena, crescendo em direção ao ponto máximo, o clímax, o ponto de virada. Produza seus diálogos tendo em vista qual será o clímax dele e como você deve chegar a eles sem torná-los tediosos ou arrastados. Em vez de ficar quatro páginas fazendo os personagens explicarem tudo, escolha um ponto de partida que permita que o clímax chegue rápido e de forma eficaz para manter o leitor atento.
O bom diálogo é econômico: expressa o máximo com o mínimo de palavras.