Capítulo 3 – O Encontro
O Hospital Central estava mais movimentado que o normal naquela manhã.
No corredor principal, o som de passos apressados se misturava ao bip constante dos monitores e ao vai-e-vem de macas.
Helena caminhava com seu jaleco impecável, pastas de exames sob o braço, e a expressão concentrada que fazia residentes se endireitarem ao vê-la passar.
Tinha acabado de sair de uma cirurgia de quatro horas.
Um aneurisma delicado, que exigira toda a sua atenção e habilidade.
Mesmo cansada, parecia mais desperta do que nunca.
Gostava dessa sensação: o controle absoluto que sentia no centro cirúrgico, o poder de devolver uma vida saudável a alguém com o simples movimento de suas mãos.
Mas o corredor a trouxe de volta à realidade.
Ali fora, ela não controlava tudo.
No andar de pediatria, Laura tentava disfarçar o nervosismo.
Era seu primeiro dia oficial, e embora tivesse passado por ali durante a residência, agora sentia o peso da responsabilidade maior.
Cumprimentou enfermeiros, sorriu para os pequenos pacientes e fez questão de se apresentar a cada membro da equipe.
Sua energia parecia iluminar o setor.
— Doutora Prado? — chamou uma das enfermeiras.
— Sim — respondeu Laura, ajeitando a prancheta.
— A chefia pediu que você fosse à reunião multidisciplinar agora de manhã. É no auditório central.
Laura agradeceu e seguiu para o auditório, tentando não se atrasar.
Era importante causar uma boa primeira impressão.
No auditório, vários médicos já estavam sentados.
Casos clínicos seriam discutidos ali, um ritual diário no hospital.
Laura escolheu uma cadeira mais ao fundo, observando a movimentação.
Foi quando a porta lateral se abriu.
Helena entrou.
Não havia necessidade de alguém apresentá-la: sua presença dominava a sala.
Cabelos loiros presos em um coque impecável, olhos azuis que varriam o ambiente em busca de qualquer sinal de desorganização.
Seu jaleco branco parecia feito sob medida, e o crachá com o nome "Dra. Helena Vasconcellos – Chefe de Neurocirurgia" refletia a luz.
Laura sentiu o coração acelerar sem entender bem por quê.
Não era medo, exatamente.
Era... algo diferente.
Helena, por sua vez, notou a ruiva sentada ao fundo.
Uma nova pediatra, provavelmente.
Olhos atentos, sorriso que teimava em se manter mesmo naquele ambiente sério.
Por algum motivo, Helena se pegou olhando por um segundo a mais do que deveria antes de começar a reunião.
— Bom dia — disse, com a voz firme que não precisava ser alta para impor silêncio.
A discussão de casos começou, e Laura prestava atenção em cada palavra, impressionada com a clareza e a segurança com que Helena conduzia tudo.
Era quase hipnotizante.
No final da reunião, enquanto todos começavam a sair, Laura foi abordada por um residente da pediatria.
— Doutora, você pode vir comigo ver o caso do menino do 304?
Ela assentiu, mas ao se levantar, sentiu o olhar de Helena sobre si.
Rápido, quase imperceptível.
Mas estava lá.
Mais tarde, no corredor, as duas acabaram se cruzando.
Helena estava analisando um exame de imagem, e Laura vinha no sentido oposto, apressada.
Quase se chocaram.
— Desculpe! — Laura disse, rindo sem graça.
Helena ergueu os olhos.
Por um instante, o tempo pareceu parar.
De perto, Laura era ainda mais bonita do que parecia no auditório.
Cabelos ruivos soltos agora, olhos escuros e vivos.
E aquele sorriso — caloroso, quase desarmante.
— Cuidado por onde anda — respondeu Helena, em tom neutro, mas sem a frieza habitual.
Laura piscou, surpresa por ter sido respondida, e inclinou a cabeça levemente.
— Pode deixar, doutora.
Helena seguiu andando, mas algo a incomodou.
Era uma sensação estranha — como se aquele encontro tivesse deixado algo fora do lugar.
E ela detestava quando algo fugia do controle.
Laura, por outro lado, sorriu sozinha enquanto se afastava.
Algo na expressão de Helena lhe causara curiosidade.
Havia frieza ali, sim, mas também algo escondido.
Algo que Laura sentiu vontade de descobrir.
O resto do dia passou entre consultas, cirurgias e plantões agitados.
Mas, em algum momento, as duas se viram novamente, desta vez na sala dos médicos.
Laura estava tomando café, quando Helena entrou para buscar um prontuário.
— Primeiro dia? — Helena perguntou, de repente.
Laura quase engasgou com o café, surpresa com a iniciativa.
— É, sim. — E sorriu. — Um pouco caótico, mas estou sobrevivendo.
Helena apenas assentiu, mas os cantos da boca quase se curvaram.
Quase.
Quando Helena saiu, Laura sentiu uma pontada de algo que não sabia nomear.
Admiração, talvez.
Ou a estranha sensação de que aquele encontro tinha sido o primeiro de muitos.
E foi.
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Atualizado até capítulo 94
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