Renascida Entre Colheitas
Só mais um parágrafo
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O relógio marcava 23h47 e a tela do computador parecia brilhar mais do que nunca.
Marina piscava pouco, digitava muito e respirava quase nada. A pilha de relatórios ao lado crescia como se tivesse vida própria, e o prazo — aquele monstro invisível — respirava no seu cangote.
Marina
“Só mais um parágrafo”
Ela repetia, pela vigésima vez naquela hora. O estômago roncou, mas ela ignorou. O café da tarde já tinha virado lembrança distante, e a última refeição decente… ninguém mais lembrava.
Ela não sabia, mas naquele momento estava prestes a descobrir que, sim, é possível morrer de tanto trabalhar. E
O estômago roncou outra vez, dessa vez tão alto que quase poderia entrar na ata da reunião. Marina abriu a gaveta em busca de um biscoito esquecido, encontrou apenas um grampo, um post-it amassado e um boleto atrasado.
Marina
“Não dá tempo pra comer agora”, pensou, enquanto tentava convencer a barra de progresso no computador a se mover mais rápido com a força do olhar.
O corpo começou a pesar. Primeiro as pálpebras, depois os braços, e, por fim, até os pensamentos. O cérebro, mal-humorado, começou a desligar setores, como quem apaga as luzes de um prédio que está fechando.
E foi assim, entre um relatório e outro, que Marina caiu de cara no teclado.
A tela piscou, o cursor congelou, e o silêncio foi tão absoluto que até o prazo se assustou.
No dia seguinte, encontraram-na ali, imóvel, com a xícara de café ainda quente ao lado — e a cara impressa no Word.
No laudo: exaustão extrema.
No coração: fome atrasada.
Na empresa: mais uma vaga aberta.
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