Por mais que Guilhermina tentasse, não conseguia saber de onde exatamente conhecia aquele rosto.
— Não. — respondeu Cris, seca, sem qualquer hesitação.
— Tem certeza? Seu rosto é tão familiar... — insistiu Guilhermina, franzindo o cenho, inclinando levemente a cabeça.
— Tenho, senhorita. Eu não me esqueço de um rosto... E agora me dê licença, a diretora me espera — falou, saindo sem pressa, mas com passos firmes.
Guilhermina ficou pensativa, mas, sem lembrar exatamente de onde se lembrava, então achou melhor esquecer.
Já na sua sala, a fofoca invadia as conversas dos adolescentes.
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— Dizem que a nova diretora é o cão... Tipo aquele filme que assistimos quando criança, o da Matilda — falou Dani, uma adolescente de 16 anos, boa aluna, mas de língua comprida, gesticulando como quem quer chamar atenção.
— Isso é papo pra nos assustar. Toda direção eles falam isso — disse Ítalo, rindo com desdém.
— Eu teria mais medo da inspetora. Falam que ela luta cinco modalidades de luta — comentou Gregório, aumentando o tom para causar efeito, fazendo alguns arregalarem os olhos.
— Isso é conversa — tentou rebater Fernando, mas foi interrompido por Guilhermina.
— Ei, lindinhos, posso saber esse disse-me-disse aí? — perguntou, com sobrancelhas arqueadas e tom controlado.
— A gente só estava falando da nova diretora... — respondeu Dani, com um sorriso de canto.
— Hum... E qual era mais ou menos o assunto? Porque aqui não quero ver vocês espalhando boatos e fofoquinhas. Isso pode prejudicar tanto o alvo da fofoca quanto vocês — disse ela, séria, olhando um por um nos olhos.
Guilhermina era professora e Coordenadora, mas, pela falta de professores, estava substituindo as aulas de Português de todos os professores da mesma matéria, em dois horários. Dava aula para pelo menos metade da escola, embora não em todas as salas. E a turma que ela amava era o 2º ano B — com eles conseguia realizar atividades fora da escola. Não por escolha, mas porque as outras turmas eram muito difíceis para tentar algo tão diferente.
Enquanto ela escrevia na lousa, a diretora entrou junto com Cris.
Os alunos e Guilhermina pararam o que estavam fazendo para olhar.
A diretora apresentou Cris aos alunos.
Na mesma hora, começaram a circular recados em pedaços de papel sobre a nova diretora e a inspetora:
"Você viu? A diretora é uma gata. Só perde pra tia Gui. Agora essa inspetora... não assusta nem meu irmão de 7 anos."
"Amei o look da diretora, ela é chique. Que cara de azeda essa inspetora. Não tenho medo de cara feia. Essa não me engana. Deve ter mais medo da gente do que a gente dela."
Embora todos fizessem isso de forma discreta, Cris observava tudo. Sabia quem havia escrito, por quais mãos o bilhete passou. Não disse nada, mas registrou mentalmente — típico dela.
Quando a porta se fechou, eles esperaram alguns minutos e a sala caiu na gargalhada.
Guilhermina ficou sem entender.
— Por que estão rindo? — perguntou, olhando ao redor.
— Aí, professora, estamos rindo da escola tentando nos assustar, falando que a nova direção iria trazer um bicho-papão... E o que vejo? Uma baixinha com cara de azeda — disse Dani, arrancando risos de todos.
— Eu derrubo ela com uma voadora — disse Ítalo, fazendo gestos exagerados.
— Gente, para. Isso não é brincadeira — falou a professora, séria, cruzando os braços.
Enquanto isso, Alana conversava com Cris:
— Seu trabalho é reorganizar essa bagunça. Nada de pessoas gritando, saindo fora de aula... Mas o mais importante: quero que eles entendam que tudo mudou. As velhas práticas da escola não valem mais. Com a gente no comando, eles têm que andar em linha reta.
— Certo. — respondeu Cris, sem expressão.
— Vamos ter trabalho. Essa escola está assim, acabada há tempos... E sabe o que eu e você faremos?
Cris ficou em silêncio, não por não saber, mas porque sabia o que teria que fazer.
— Isso mesmo que está pensando. Quero todos submissos a mim, incluindo professores metidos a ativistas. Está de acordo?
— Sim. Sempre.
— E eu não gostei dessa tal Guilhermina. Muito boazinha com esses aprendizes de delinquentes. Quero você de olho nela — disse Alana, estreitando os olhos.
Cris não gostou da ordem. Não queria estar perto de Guilhermina, mas seria inevitável: teriam que se cruzar nos corredores e na sala dos professores.
— Tudo bem. Farei isso.
— E está autorizada a usar seus métodos... mas use discretamente — disse Alana, com um sorriso rápido antes de sair da sala.
Cris sentiu um certo poder nas mãos.
Enquanto pensava nas novas ordens da diretora, alguns alunos passaram em horário de aula e foram para o banheiro. Demoraram mais que o normal, até que veio outro aluno.
Ela balançou a cabeça:
"Hora do showzinho."
Entrou no banheiro masculino. Os meninos estavam entregando bombinhas — a ideia era colocar em pontos estratégicos na hora da saída, como “presente” para o primeiro dia de aula da diretoria.
— Esse é o banheiro masculino — disse um garoto alto, com as mãos para trás, tentando impor presença. Ele era o único maior de idade na escola.
— Me entreguem o que vocês têm nas mãos — disse Cris, seca, olhando fixamente para o grupo.
— Vai à merda, sua vadia. Posso quebrar sua cara com um soco — respondeu o garoto alto, se inclinando para frente.
— Me deem o que têm agora.
— Ih, qual é, baixinha? Acha mesmo que temos medo de cara feia? — debochou o mais gordinho do grupo.
— Eu só vou falar mais uma vez, porque na terceira, pego à força — disse ela, sem elevar o tom.
— A Rambo feminina! — riu um deles.
— Um... dois... — começou a contar, de forma pausada.
O mais alto se irritou e foi dar um soco nela.
— Olha o três na sua cara, sua... — tentou dizer, mas Cris se moveu rápido, desviou e encostou o taser nele.
O garoto caiu para trás, assustado, recuando.
— Você me deu choque, filha da pu...
— Olha o linguajar comigo. Esse ainda é dos mais fracos — cortou ela, sem alterar a expressão.
— Você jogou sujo.
— Sim. Não espere que eu lute de igual para igual com você. Afinal, teria desvantagens. Mas pode ter certeza: conheço várias técnicas para fazer vocês pedirem para a mãezinha de vocês virem te buscar. Agora, me deem as malditas bombinhas e se apresentem na sala da direção. E, se falarem que usei taser em vocês, vão passar a vida toda tendo pesadelos. Porque uma coisa que eu sei fazer bem... é invadir sonhos — disse ela, com a voz seca e curta.
Um a um, foram entregando as bombinhas.
Só que um dos alunos foi pedir ajuda para Guilhermina.
— O que houve, André? O que faz fora da sua sala? — perguntou ela, estranhando.
— Eu fiz besteiras... Mas a nova inspetora deu choque no Erick.
— O quê? Tá fazendo pegadinha comigo?
— Eu juro que vi com esses olhos aqui — disse ele, com expressão assustada.
— Onde ele está?
— Na sala da diretora.
— Se isso for verdade, essa mulher tem que ser demitida. — respondeu Guilhermina, sentindo o sangue subir
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Atualizado até capítulo 33
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