A luz nunca se apagava em Tliwni.
No céu sem estrelas, um sol imóvel escaldava as dunas douradas e os palácios de arenito. Havia algo de eterno naquela luminosidade estéril – como se o tempo não ousasse avançar sob os olhos abertos dos Deuses de Aurora. Era ali, entre colunas esculpidas com oferendas e tapeçarias tecidas com areia viva, que Elian Noctaris retornava para casa.
Aurora, capital do reino solar Tliwni, se ergueu diante dele como uma miragem sólida. As torres laranjadas e os telhados rubros pareciam flamejar sob o calor imóvel do céu. O cheiro do incenso de resina seca queimava nos templos, e tambores soavam em ritmos circulares, como corações batendo ao avesso.
A procissão de boas-vindas o aguardava no pátio superior do Palácio Solar, onde os nobres e a sacerdotisa, adornada com joias de obsidiana e um véu translúcido, já ocupavam suas posições cerimoniais. Mas não era a pompa nem os tapetes de areia azul que lhe causavam desconforto. Era o povo.
Milhares de olhos o fitavam das arquibancadas de pedra, sob véus ralos ou peles expostas. O povo de Tliwni era como o próprio deserto: resistente, orgulhoso, esculpido pela adversidade e, às vezes, cruel na sua adoração. Olhavam para Elian com uma mistura de reverência, dúvida e desejo.
Ele os conhecia bem demais para se sentir lisonjeado.
Elian desceu da carruagem-dragomel com passos precisos. Seu corpo era esguio como as serpentes solares dos mares de sal, com uma postura naturalmente altiva, mesmo sem o desejar. A pele, de um dourado pálido e rarefeito, refletia a luz como uma pérola ressecada. Seus cabelos eram longos e escuros, quase prateados sob o brilho constante do sol, e caíam sobre os ombros como véus sombrios em contraste com sua túnica auroral de corte imperial.
Mas era em seus olhos que o sangue noturno se revelava: um violeta profundo, quase indecente, herança da linhagem materna – os Lunari Muitos o consideravam uma aberração mística. Outros, um milagre.
— Ele voltou mais belo do que quando partiu — murmurou uma cortesã no fundo da multidão.
— Ou mais perigoso — respondeu um velho general, com amargura na voz.
Elian ergueu os olhos para o topo da escadaria cerimonial. O trono de areia petrificada ainda estava ali. Vazio. Ausente de seu pai, o rei, que havia falecido. Como previsto.
Mas quem estava presente era Caelen D’Varien, o Dracanthe de sangue ancestral, em posição cerimonial à direita do trono. Imóvel como uma estátua viva, Caelen sustentava sua armadura ritual feita de escamas negras e vermelho-telha com uma imponência quase sagrada. A pele alva, fria como calcário, contrastava com os olhos âmbar incandescentes que o fitavam com algo entre julgamento e contenção.
Elian desviou o olhar rapidamente.
“Você não vai me encarar? Com certeza é mais um dos que duvidam de mim?” pensou. “Mesmo de tanto tempo ele ainda me desafia?”
Ao alcançar o centro do pátio, os sinos solares soaram e as vozes se calaram. O povo de Aurora esperava.
Um servo se aproximou, oferecendo a ele um cálice de vidro de névoa com o vinho cerimonial. Elian ergueu-o com solenidade, um sorriso contido nos lábios. Sorveu uma única gota e, com elegância, entregou o cálice ao arauto.
Então, deu um passo à frente e, com a voz firme e melodiosa que aprendera a controlar na instituição de Alese, começou seu discurso:
— Filhos e filhas do deserto que canta, habitantes de Aurora, servidores da luz eterna... Voltei.
Um murmúrio de assombro suave correu entre os presentes, não pelo conteúdo, mas pelo tom.
— Durante anos, estive ausente, estudando sob os preceitos de Alese, muito além dos portais do outro lado das Montanhas Gritantes, entre o sagrado e o proibido. E agora, trago comigo não apenas o conhecimento que me foi concedido, mas perguntas que talvez nunca tenham sido feitas em voz alta neste trono.
Pausou. Observou os rostos: sacerdotisa franzindo o cenho, generais se entreolhando com desconforto.
— Aprendi que a luz pode cegar tanto quanto iluminar. Que fé cega não é obediência, é prisão. E que o sol que nunca se põe também nunca permite o descanso. Pergunto a vocês: quem somos, se não nos permitimos sonhar no escuro?
Alguns engoliram em seco. Outros o admiravam em silêncio.
— Não retorno para destruir tradições, mas para lembrar que elas foram criadas por mãos humanas, não por deuses de pedra. Honremos os Krophegar’s com sabedoria, não com medo. Que sejamos um povo capaz de mudar sem quebrar.
Caelen o observava com o maxilar tenso. Seus punhos estavam cerrados, os olhos âmbar faiscavam com algo que Elian conhecia bem: desconfiança.
— E que a aurora de nossa era... seja uma que brilhe para todos. Não apenas para os poucos que já nasceram sob ela.
Silêncio.
Depois, um aplauso tímido. Em seguida, muitos. E por fim, uma onda de aplausos, forte, tumultuada, acompanhada de gritos de esperança e confusão.
Enquanto o som se misturava à poeira alaranjada do deserto, Elian deu um passo para trás e permitiu-se respirar. Seu coração estava acelerado, não pela exposição, mas pela certeza de que Caelen o ouvira. Ele sempre ouvia.
Seus olhos se cruzaram brevemente.
Flash.
Um fragmento de memória o assaltou: ele e Caelen ainda meninos, correndo entre os pilares de pedra do antigo jardim real, com as roupas manchadas de suco de tamar e areia. Caelen era mais forte, mas Elian era mais rápido.
— Um dia, vou ser rei! — gritou Elian com a arrogância inocente dos sete anos. — E vou mandar você dormir do lado de fora dos portões!
— Mas você ainda vai continuar a ser um chorarão em toda a tempestade de areia — respondeu Caelen, empurrando-o na areia com um riso leve.
— Não! Porque eu serei o rei mais poderoso de todos!
— Você nem sabe escalar uma duna...
Elian, na época, odiava perder. Mas ele se lembrava do rosto de Caelen naquela hora — suado, risonho, os olhos âmbar cheios de vida. Havia algo ali que o fez desejar ser rei, não pelo trono... mas para tê-lo sempre ao seu lado.
Agora, tantos anos depois, aquele mesmo rosto estava ali, mas inexpressivo. Esculpido em gelo.
“Você cresceu tanto quanto eu. Ou se fechou.”
Elian foi escoltado para o interior do palácio, onde os corredores exalavam lavanda seca e ferro quente. As paredes pulsavam com inscrições mágicas que vibravam com sua presença. Sentia-se um estranho em sua própria casa.
Nas grandes tapeçarias que narravam as vitórias de artigos reis, Elian via mais do que feitos: via silêncios. As ausências de sua mãe, as guerras contra os subterrâneos, os massacres apagados da história. Tliwni se achava glorioso... mas havia sangue demais sob suas pedras para se considerar puro.
— Senhor? — um criado murmurou. — Deseja se preparar para o banquete?
Elian assentiu.
— Tragam minhas roupas.
O salão do banquete tinha sido adornado como se fosse receber um deus — ou pior, como se esperassem que ele se tornasse um. As cortinas de linho solar, bordadas com fios de ouro velho, dançavam ao som das brisas que escapavam por janelas arqueadas. O chão era de mármore cor de âmbar, brilhando como se luz líquida tivesse sido derramada sobre ele. Acima, o teto em cúpula exibia afrescos dos quatro deuses Krophegar’s em glória, sempre vigiando.
Elian caminhava lentamente entre as colunas que ladeavam a nave central do salão. Seus olhos não fixavam ninguém em especial, mas todos sentiam que estavam sendo observados. Seus cabelos negros, soltos sobre os ombros, contrastavam com a túnica de rubro profundo. No peito, o broche de Aurora cintilava como se pulsasse.
A mesa principal se estendia como um rio diante dele. Os nobres do círculo interno já estavam acomodados — e entre eles, Caelen D’Varien, o rival de juventude, sentado com a compostura que só alguém forjado pela honra e pelo protocolo poderia ostentar. Seus olhos dourado-âmbar estavam voltados para Elian como os de um animal vigilante, não com saudade ou boas-vindas, mas com algo mais frio: avaliação.
Caelen não se levantou. Apenas ofereceu uma leve inclinação de cabeça, formal, cortante. Era o suficiente para quem servia à coroa, não ao príncipe.
— Vejo que mesmo após tantos anos, certas criaturas ainda não piscam — sussurrou Elian, passando por trás de um arranjo de flores murchas demais para o calor do deserto. Seus olhos encontraram os de Caelen por uma fração de segundo, e algo dentro dele se remexeu — orgulho ou desprezo, ele não sabia.
Ao seu lado, uma cadeira foi arrastada com entusiasmo. O primo — o único filho de seu tio Lorde Varkas Noctaris, Thalion — exibia seu eterno sorriso juvenil, grande demais para o rosto estreito. O cabelo alourado, quase branco, reluzia sob as luminárias suspensas. Vestia um traje exagerado, com ombreiras largas e botas que estalavam no piso.
— Elian! — ele sussurrou alto demais. — É verdade que em Alese as camas flutuam com vapor quente? Ouvi dizer que o sabão canta ao ser esfregado!
Elian sorriu de canto. Havia um brilho sincero nos olhos do primo, um fascínio infantil que tornava quase impossível levá-lo a sério. Ele era como uma brisa fresca em meio ao ar seco da corte.
— Não canta. Mas choraminga, se você esfregar com muita força.
O primo gargalhou, empolgado.
— Eu sabia! Isso não está nos códices! Por desuses, você precisa me contar tudo. Todos os detalhes. Até os proibidos.
O banquete havia começado, e as travessas desfilavam por entre os criados como miragens. Frutas esculpidas em formas de feras solares, carnes temperadas com incenso, e taças transbordando um licor que queimava a língua antes de adoçar a garganta. Mas Elian comia pouco. Seu apetite não acompanhava sua curiosidade.
A sacerdotisa ocupava um dos assentos mais próximos ao trono. Seu manto cerimonial, feito de tecidos dourados e brancos, parecia menos uma vestimenta e mais uma armadura de tradições. Seu olhar seguia Elian como uma sombra pregada ao corpo. Ela mantinha os dedos cruzados, como se fosse prender a língua, temendo que qualquer palavra lançada naquele salão pudesse incendiar gerações de dogmas.
— O templo o esperava para orações antes do banquete — ela disse, numa pausa das conversas. Sua voz era calma, mas cortante. — Há deveres que precedem festas.
— O templo me terá amanhã, como prometido — respondeu Elian, erguendo a taça em um gesto polido. — A fé é uma semente que floresce melhor na terra da lucidez. Hoje, ainda estou sob o perfume da areia.
Silêncio. O salão engoliu a fala como se fosse indecorosa.
O tio, sentado ao lado não reagiu. Mas seus olhos, escuros como betume, cravaram-se em Elian com intensidade dissimulada. Seu rosto era uma escultura de nobreza: barba desenhada, queixo rígido, e expressão forjada ao longo dos anos para esconder intenções. Elian sabia que por trás daquele rosto repousava um homem que jamais desistiu do que julgava seu por direito. Ele o tolerava por política. E Elian, a ele, por vigilância.
“Ele esperava que eu não voltasse”, pensou. “Ou que eu voltasse domesticado.”
Uma gargalhada interrompeu os pensamentos. O primo, encharcado de vinho e entusiasmo, contava a um grupo de jovens cortesãos a história do primeiro beijo de Elian — com detalhes que só podiam ter sido inventados.
— Era com uma filha da serva do jardim! Tinha cheiro de hortelã. Não negue, Príncipe. Confessem logo!
Elian lançou uma uva na direção do primo, arrancando risos. Mas dentro dele, o coração era uma ânfora rachada. Os risos da corte eram como sinos de cristal: belos, frágeis, e facilmente despedaçados por qualquer verdade inconveniente.
Seus olhos cruzaram os de Caelen novamente. O outro continuava impassível, mastigando com lentidão, como se deliberasse cada fibra da carne em seu prato. Havia um ar de superioridade na sua postura — não arrogância, mas certeza. Como um soldado que viu a verdade do mundo e escolheu segui-la com disciplina cega?
O clima mudava sutilmente, como o calor que anuncia uma tempestade no deserto. Os criados trocavam olhares, atentos às variações de tom. O vinho já não era apenas uma bebida, mas um lubrificante para palavras veladas.
A sacerdotisa murmurou algo para Caelen, que assentiu. Elian percebeu. Aquela aliança entre os dois era uma muralha antiga, construída para contê-lo. Ambos acreditavam proteger o reino da ruína. Mal sabiam que protegiam apenas os próprios temores.
— Vossa alteza, se me permite — disse Caelen, em voz audível para os mais próximos — gostaria de saber qual será seu primeiro ato como herdeiro retornado. O povo espera algo mais que palavras belas e sorrisos de volta.
A provocação foi suave, mas afiada.
Elian se ergueu com lentidão. Todos se calaram. Os olhos do salão se voltaram para ele como lâminas voltadas para um só pescoço.
— Meu primeiro ato? — ele repetiu. — Será simples. Visitar a *Torre do Horizonte. Quero ver com os meus próprios olhos o que nos mantêm fortes... e o que nos enfraquece.
Um murmúrio percorreu o salão. A torre é um local selado, um tabu. O lugar onde o povo Lunari desapareceu desde a “batalha sem sangue”. O antigo local onde era aberto o portal para Alese, porém foi selado a muitas eras atrás. O local, após ser abandonado, virou área de muitas feras, é onde a areia queima os pés e a luz não chega com clemência. Era uma escolha simbólica — e perigosa.
Caelen não respondeu. Apenas observou. E naquele olhar, Elian leu um aviso:
“Se for mexer nas fundações, certifique-se de que pode sustentá-las depois.”
O primo, porém, aplaudiu sozinho, batendo palmas com entusiasmo.
— Maravilhoso! Um príncipe entre a brasa! Eu quero ir também! Acho que me serve usar uma roupa de ferreiro com proteção contra o calor de lá... já pensei em algo com mangas largas e cinto de couro, ah.
O salão riu. E por um momento, o peso político se dissolveu no ridículo. Mas não por muito tempo.
Enquanto a música retornava e os criados serviam um último prato de tâmaras glacê, Elian se afastou discretamente da mesa, os olhos fixos em um vitral do lado oposto. A figura da deusa Krophegar o fitava com olhos vazados pela luz do sol eterno.
E foi ali, à sombra daquele vitral, que ele sentiu — não ouviu — um movimento.
O tio estava de pé, fingindo examinar um pergaminho de vinhos com um conselheiro. Mas seus lábios se moviam em sussurros, e seus olhos — por uma fração de segundo — não estavam voltados para Elian, mas para Caelen.
Elian apertou a taça até ouvir o vidro ranger sob seus dedos. Sentiu a areia do destino se movendo, grão por grão, sob seus pés.
E mesmo sem a noite... havia sombras por toda parte.
Dia Seguinte...
O aroma do mel especiado se espalhava pelos corredores e arcadas enquanto as portas do salão se abriam por completo. Os músicos recuaram para o mezanino, onde seus instrumentos reluziam como escamas de serpente sob as lamparinas solares, e os criados surgiam como sombras dançantes com bandejas nas mãos. Elian caminhava entre os convidados com a mesma calma que se atravessa um campo minado. Seu manto escorregava pelas costas, e a coroa lateral, herança do clã materno, brilhava com humildade, como uma heresia sussurrada entre os adornos da corte solar.
A grande mesa circular já estava posta. Pratos de obsidiana forravam as superfícies douradas e entre cada assento havia uma pequena chama azul dançando dentro de um globo de cristal — a tradição dos Krophegar’s para proteger os comensais dos maus presságios da noite, mesmo que esta nunca chegasse.
O tio de Elian, já estava sentado à cabeceira, como era de se esperar. Seu olhar cintilava por trás do vinho solar, e o sorriso afiado cortava mais que qualquer espada dos Dracanthe. Era dele que partiam as ordens enquanto o trono era vago. E, como Elian bem sabia, havia pouco espaço para partilhas no coração de um homem que governava Tliwni como se a luz do sol o obedecesse.
Ao lado dele, seu primo batia os dedos com impaciência, mal contendo a excitação por tantas curiosidade sobre as coisas vividas por Elian longe da dunas de areia familiares.
— Então é verdade? — sussurrou Thalion, inclinando-se com os olhos brilhando mais cheio de curiosidade que ontem — Eles tinham janelas de água em Alese? E livros que se movem? E... e aquelas frutas que brilham no escuro?
Elian sorriu de lado. Era impossível não sentir ternura por Thalion. Havia algo de profundamente doce, quase deslocado, no modo como ele via o mundo — como se ainda acreditasse em milagres ou na presença dos deuses.
— Sim. E havia também neve líquida que esfriava os pés. Eles chamavam de "geada de névoa". É como se o céu chorasse pelo chão.
Thalion soltou um suspiro maravilhado, completamente alheio à tensão ao redor. Mesmo sabendo que o pai o queria longe de Elian, sempre dava um jeito de se aproximar, como se o seu coração seguisse um roteiro distinto, que não sabia obedecer ordens.
— Um dia vou ver isso também. Você me levaria?
Elian quis prometer. Quis tocar-lhe a mão e dizer que sim, que o levaria para além do sol e mostraria cada sombra gentil. Mas seu olhar cruzou, mais uma vez, com o de Caelen, e o momento se quebrou como um espelho rachado.
O comandante do exército real mantinha a sua expressão severa enquanto ouvia a sacerdotisa do templo dos Krophegar’s falar ao seu lado. Caelen mantinha a compostura como se fosse esculpido em pedra vulcânica. Nem mesmo quando o nome de Elian foi citado, ao centro de um brinde conduzido por Varkas, ele desviou os olhos. Apenas ergueu o cálice e tornou a pousá-lo na mesa com precisão militar.
“Essa indiferença é uma armadura”, pensou Elian. “E eu fui a lâmina que ele aprendeu a temer.”
A sacerdotisa, com seus véus de cristal e anéis que pareciam presas de serpente, discursava sobre a importância da tradição. Que a volta de Elian devia ser celebrada com reverência, mas jamais com mudança.
— Os Krophegar’s não nos abandonaram. A luz que nunca se põe é o selo da sua bênção — dizia ela. — O trono não deve dobrar-se às sombras de Aurora.
Elian apertou os dedos sob a mesa. A leve insinuação ao clã da sua mãe sempre surgia com desdém, como se tivesse vergonha estampada nas vogais.
Varkas pigarreou, com um sorriso de quem saboreava cada tensão.
— Minha cara sacerdotisa, creio que o nosso herdeiro voltou com ideias um tanto... novas. E cabe a nós, os anciãos, guiá-lo para que não se perca no luxo das nuvens noturnas.
Elian levantou-se, com a taça ainda em mãos, e os murmúrios cessaram como uma maré puxada para trás.
— Não há perigo algum em conhecer o céu — disse ele, erguendo o cálice. — O perigo está em negá-lo. Quem nunca se afastou do deserto não sabe a extensão do nosso reino.
As palavras provocaram mais do que surpresa. O som abafado de alguém largando os talheres ecoaram pelo salão. Foi Thalion. Ele parecia dividir-se entre orgulho e temor.
Caelen fitou Elian diretamente, pela primeira vez naquela noite. Havia algo nos olhos dele... não era raiva. Era dúvida. Como se estivesse buscando traços de um menino que, anos antes, havia-lhe dito com orgulho:
"Um dia, vou ser rei. E você vai ter que me obedecer."
Tinha sido num dos jardins altos, quando ambos ainda usavam as túnicas infantis. Elian apertou os punhos para parecer mais forte, fingindo que não se importava com o nariz sangrando após uma queda. Caelen, mesmo então, não demonstrava tanta emoção — apenas limpou o sangue do rival e virou as costas com a arrogância silenciosa que carregava até hoje.
Aquele menino... havia desaparecido? Ou ainda espreitava sob a pele?
O banquete continuava, mas Elian não se sentia mais ali. Cada palavra que dizia era calculada, cada movimento, um passo em corda bamba sobre o abismo entre o passado e o presente.
Mais tarde, ao se retirar pelos corredores longos do palácio, ladeado por colunas douradas e sombras lilases, Elian sentiu a pressão de um sussurro não dito. O palácio estava em silêncio, mas o calor dos olhos de Caelen parecia ainda grudado às suas costas.
No fundo, algo lhe dizia que o maior perigo de Tliwni não estava nas terras subterrâneas ou nas lendas sobre os Lunari. Estava ali mesmo, entre os próprios salões da coroa. E que o trono, outrora símbolo de poder, estava se tornando um alvo — para muitos.
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Atualizado até capítulo 51
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