Do Lado Errado da História de Amor
Clara sorriu para o reflexo no espelho enquanto ajeitava os brincos de pérola. O vestido vermelho de seda abraçava suas curvas com a delicadeza de um elogio não dito. O cabelo estava solto, com ondas suaves que ela mesma havia feito naquela manhã. Tudo para ele.
Era sempre por ele.
Eduardo Vasconcellos. Seu marido. Seu grande amor. O homem que ela passou metade da vida tentando conquistar.
Eles estavam casados há quase três anos, e Clara ainda sentia aquele frio na barriga toda vez que ele chegava em casa, com o terno impecável e o perfume amadeirado que ela aprendera a associar com desejo e segurança. O mesmo frio na barriga que ela sentia desde a época em que ele mal sabia seu nome.
Enquanto passava um último batom, Clara olhou para o celular. Nenhuma mensagem dele desde o final da tarde.
"Deve estar atolado de trabalho", sussurrou para si mesma, ignorando o pequeno incômodo que começava a crescer no fundo do estômago.
Desceu as escadas da casa com leveza, quase flutuando, como se o simples ato de estar arrumada para ele fosse uma vitória. Na sala, a mesa estava posta, com a comida que ela mesma havia preparado — lasanha de camarão, o prato preferido de Eduardo. Velas acesas, vinho respirando na taça, música instrumental suave ao fundo.
Ela queria surpreendê-lo. Queria que aquela noite fosse um respiro no meio da rotina estressante dele. Nos últimos meses, ele andava mais ausente, mais frio… mas Clara se recusava a ver aquilo como um sinal de que algo estava errado. Para ela, era só mais uma fase. Como tantas outras que eles já tinham superado.
O relógio marcou oito da noite. Depois, oito e meia. Nove.
Clara mandou uma mensagem.
— “Amor, está tudo bem? Estou te esperando.”
Sem resposta.
Ligou. Caixa postal.
A mão dela começou a tremer. Ela respirou fundo e se forçou a manter a calma. Levantou da mesa, pegou o celular e foi até a varanda. O ar fresco da noite parecia mais frio do que o normal.
— Ele vai chegar. Sempre chega. — tentou convencer a si mesma, como fazia sempre.
Mas no fundo, uma voz insistente e amarga começou a sussurrar: "Ele não vai chegar. Não dessa vez."
Foi quando, quase por instinto, Clara entrou no Instagram.
A primeira coisa que apareceu foi um story de uma conhecida do círculo social deles. Uma foto mal focada… mas clara o suficiente para que ela reconhecesse o ambiente: o restaurante mais sofisticado da cidade. O mesmo restaurante onde Eduardo a levou para jantar na noite em que a pediu em casamento.
Só que, dessa vez… ele não estava com ela.
Clara ampliou a imagem. O coração disparou.
Lá estava Eduardo. Terno azul-marinho, camisa branca, o sorriso de sempre… olhando de forma cúmplice para a mulher à sua frente. Uma morena de cabelos longos, rosto delicado, usando um vestido preto justo demais para ser só uma amiga.
A foto era de minutos atrás.
Clara congelou. Por um instante, o mundo pareceu girar ao contrário. As mãos suaram, as pernas ameaçaram ceder. Mas em vez de chorar, ela se moveu.
Entrou em casa, pegou a bolsa, as chaves do carro… e dirigiu.
O caminho até o restaurante foi um borrão. As luzes da cidade passavam como vultos pela janela. Ela mal sentia as mãos no volante. Só uma certeza pulsava dentro dela: ela precisava ver com os próprios olhos.
Precisava ter certeza.
O restaurante estava lotado. Muita gente bonita, flashes de celulares, taças de cristal. O tipo de lugar onde ela e Eduardo costumavam ser o casal modelo.
Ela entrou com passos firmes, como se fosse uma cliente qualquer, fingindo naturalidade, como se o coração não estivesse prestes a explodir dentro do peito.
E então viu.
Lá estava ele. Eduardo. Rindo, com o olhar cheio de algo que ela não via há meses. Um brilho que antes era dela.
A mulher à sua frente segurava a mão dele sobre a mesa. O garçom servia vinho. As velas iluminavam o rosto dele como numa cena de cinema.
Clara parou a poucos metros de distância. Ficou ali, parada. Invisível. Como tantas vezes na vida.
Eduardo virou o rosto, como se sentisse um arrepio. E então, os olhos dele encontraram os dela.
O sorriso dele morreu no mesmo instante.
O rosto da outra mulher ficou pálido.
Por um segundo, o salão inteiro pareceu em silêncio.
Clara respirou fundo. Sentiu o gosto amargo da decepção subindo pela garganta. Não havia lágrimas nos olhos dela. Não ainda.
Ela apenas sorriu. Um sorriso amargo, dolorido… e virou as costas.
Saiu do restaurante sem dizer uma palavra. Porque, naquele momento… ela sabia que o silêncio doía mais do que qualquer grito.
E Eduardo… soube também.
Ao entrar no carro, Clara fechou os olhos. As mãos tremiam, o coração parecia dilacerado. Mas entre os estilhaços, algo diferente começou a nascer.
Uma decisão.
Ela não sabia o que viria depois. Mas uma coisa era certa:
A mulher que passou a vida inteira correndo atrás de Eduardo Vasconcellos… Morreu naquela noite.
Clara entrou em casa com o coração ainda acelerado e as mãos trêmulas. A porta da frente bateu atrás de si com um estrondo seco, ecoando pela sala silenciosa.
O cheiro da lasanha que ela havia preparado mais cedo ainda pairava no ar, misturado ao aroma adocicado das velas que agora queimavam até o fim, com as pontas quase virando fumaça.
Ela parou no meio da sala de estar, olhando para tudo ao redor como se fosse uma intrusa na própria vida.
A mesa do jantar ainda estava posta.
O vinho respirando na taça.
Os talheres arrumados com perfeição, como se aquilo fosse uma noite qualquer. Como se ela ainda fosse a esposa que ele merecia.
Só que não era.
Clara respirou fundo, tentando engolir o nó na garganta. Caminhou até o barzinho da sala, serviu-se de uma dose generosa de whisky — mesmo sem gostar da bebida — e tomou tudo de uma vez. A garganta ardeu, mas a dor foi bem-vinda. Pelo menos, era uma dor que ela podia controlar.
O relógio marcava quase meia-noite quando ouviu o som da fechadura girando.
O corpo dela enrijeceu. O barulho da porta sendo aberta, os passos entrando… E então, como se nada tivesse acontecido, Eduardo apareceu.
Casaco nos ombros, cabelo bagunçado, o cheiro familiar de perfume misturado com um aroma feminino que não era dela.
Ele parou ao vê-la ali, no meio da sala, ainda com o vestido vermelho e os olhos inchados.
Por um instante, a expressão dele foi de puro espanto. Mas logo se recompôs.
— Clara… — A voz dele saiu baixa, quase ensaiada. — Eu posso explicar.
Ela riu. Baixo, amargo.
Passou a mão pelo cabelo, sem saber se explodia ou se ria mais ainda da cara de pau dele.
— Explicar? — Ela cruzou os braços, encarando-o. — Vai dizer que não era você no restaurante? Que eu imaginei tudo? Que aquela mulher de vestido preto não estava segurando sua mão? Vai mesmo me tratar como idiota até o fim?
Eduardo respirou fundo, passando a mão pelo rosto. Caminhou em direção a ela, mas Clara recuou um passo.
— Não é o que você está pensando. — Ele tentou.
Ela bufou, incrédula.
— Jura? Então me conta… o que é? Um jantar de negócios… com direito a olhares apaixonados e mãos entrelaçadas?
Ele se calou por alguns segundos. Depois, suspirou, como se estivesse cansado demais para sustentar a mentira.
— Clara… eu não queria que fosse assim. Não queria que você soubesse… desse jeito.
Ela piscou, desacreditada.
— Ah, então o problema não é a traição… é o jeito que eu descobri?
Eduardo caminhou até o bar, pegou uma dose de whisky para si, como se aquele fosse só mais um dia difícil no escritório.
— Eu só… eu não sei mais como continuar do jeito que tá. — Ele encarou o copo por alguns segundos antes de olhar para ela. — A gente briga por tudo, você tá sempre em cima de mim, controlando cada passo. Não era pra ser assim, Clara. Eu preciso de espaço.
Ela sentiu o sangue ferver.
— Espaço? Você quer espaço? Pois devia ter pedido antes de enfiar outra mulher no meio do nosso casamento!
O silêncio que se seguiu foi pesado.
Então, com a calma de quem nunca precisou lidar com as consequências de seus atos, Eduardo soltou a frase que mudaria tudo:
— Talvez o que a gente precise seja… um casamento aberto.
O mundo parou.
Clara piscou várias vezes, achando que tinha ouvido errado.
— O quê?
— Isso mesmo que você ouviu. — Ele deu de ombros, como se falasse de um detalhe trivial. — Eu não quero te magoar, Clara… mas acho que a gente pode encontrar uma nova forma de fazer isso funcionar. Você tem a sua vida… eu tenho a minha… e a gente mantém as aparências. Todo mundo ganha.
Clara o encarou por longos segundos.
Ele realmente achava que ela ia aceitar aquilo. Que ela ia se contentar com migalhas. Que ia continuar sendo a esposa submissa, que finge que não vê.
Ela sentiu o coração partir… mas, junto com a dor, veio algo novo.
Uma raiva fria. Um orgulho que ela nem sabia que ainda tinha.
Clara respirou fundo, ergueu o queixo… e sorriu. Um sorriso que ele nunca tinha visto antes. Um sorriso perigoso.
— Tá bom, Eduardo.
Se é isso que você quer…
É isso que vai ter.
Ela subiu as escadas para o quarto com passos firmes, deixando ele parado na sala, segurando o copo de whisky e com a expressão confusa de quem não sabia que, naquela noite… havia perdido mais do que a confiança dela.
Havia perdido… ela.
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Atualizado até capítulo 46
Comments
Lucia Carla
coloca foto autora
2025-06-24
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Dulce Gama
começando mais uma história dessa autora linda maravilhosa pelo que já li o primeiro capítulo está ótima parabéns 👍👍👍👍👍♥️♥️♥️♥️♥️🎁🎁🎁🎁🎁🌹🌹🌹🌹🌹🌟🌟🌟🌟🌟
2025-06-19
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