Desconexão
Noticiário da manhã voz firme e séria
A tecnologia revolucionária lançada há apenas dois anos o EVO-R tem gerado polêmicas em todo o mundo.
Enquanto especialistas elogiam os avanços em imersão emocional milhares de relatos preocupantes surgem sobre usuários que não conseguem mais distinguir a ficção da realidade ou que simplesmente não querem mais viver no mundo real...
A imagem na tela mostrava pessoas desconectadas com olhares vazios segurando os óculos ultrarrealistas apertados contra o peito como se aquilo fosse a única âncora de seus sentimentos.
Apesar do sucesso comercial e dos elogios quanto à tecnologia imersiva os óculos ultrarrealistas EVO-R também levantaram sérias preocupações.
A plataforma permite aos usuários vivenciar experiências completas nos mais variados gêneros desde romances emocionantes até guerras sangrentas...distopias.... jogos de sobrevivência.... terror psicológico e realidades alternativas.
A linha entre o que é jogo e o que é vida real se tornou perigosamente tênue.
A imagem trocava para jovens em hospitais idosos em clínicas de repouso adultos perdendo seus empregos todos com um padrão em comum passavam mais tempo conectados ao EVO-R do que vivendo fora dele.
Muitos se recusam a sair dos mundos criados.
Alguns sequer lembram quem eram antes.
A questão agora não é mais o que a tecnologia pode nos dar mas o que ela pode nos tirar.
A imagem do noticiário mudou para uma praça pública onde um grupo protestava com cartazes.
VIVER É ESCOLHER...REALIDADE É O QUE VOCÊ SENTE.
A repórter apareceu no centro da tela o microfone em mãos
As opiniões estão divididas.
De um lado defensores do EVO-R alegam que a tecnologia oferece liberdade emocional e uma vida alternativa para quem não se encaixa no mundo real.
De outro especialistas e familiares preocupados denunciam os riscos de dependência isolamento e fuga total da realidade.
Voz de uma defensora emocionada
Dentro daquele mundo eu não sou limitada pelas dores que tenho aqui.
Posso andar correr amar. Pela primeira vez me sinto viva
Corte para um neurologista em um congresso
O cérebro humano não foi feito para viver uma realidade programada.
Há danos cognitivos emocionais e sociais. Precisamos discutir os limites éticos dessa tecnologia
A matéria segue com dados alarmantes.
Mais de 28% dos usuários frequentes demonstram sinais de dissociação parcial da realidade. 12% já abandonaram suas carreiras. 8% recusam qualquer contato com o mundo real.
Mas também mostrou conquistas inesperadas.
Pessoas com depressão severa relatando alívio.
Pacientes terminais tendo a chance de viver plenamente por mais alguns anos ainda que simulados.
Histórias de amor reencontros fictícios com entes perdidos segundas chances… tudo dentro do EVO-R.
Noah observava tudo em silêncio.
Ele se enxergava em ambos os lados. Ele fugiu sim. Mas também viveu algo intenso e verdadeiro. Algo que talvez nunca pudesse ter aqui fora.
O noticiário encerrava a matéria com a seguinte frase no rodapé da tela.
“Tecnologia de imersão emocional: avanço ou armadilha?”
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