Ele se sentou na areia, deixando o corpo relaxar como se o mar tivesse puxado toda a tensão. Ficou até o céu abrir de vez.
O sol já tinha subido quando Kael apareceu no quiosque da orla, o da esquina norte - onde as pranchas de surfe costumavam ficar enfileiradas e o cheiro de tapioca era constante.
Lá estavam elas.
As irmãs Solano.
Naia, sentada de lado no banco de madeira, mexia num caderno.
Kaena, de riso fácil, conversava com um rapaz da vila.
Ayla,distraída com os pés na areia e o olhar distante no mar.
O povo de Maralara as chamava de sereias. Não só pela beleza mas pela presença. Elas pertenciam ao mar, como se tivessem saído dele. Ninguém duvidava.
Kael ficou observando de longe, encostado numa pilastra de madeira. Não tinha coragem de se aproximar. Ainda não. A visão delas juntas era quase sagrada.
As sereias ainda estão aqui. E eu... talvez nunca tenha deixado de ser um náufrago
Kael empurrou a porta devagar, e o rangido familiar ecoou pela casa como um sussurro antigo. A luz do fim da tarde se infiltrava pelas frestas das janelas, dourando a poeira no ar. Ele deu o primeiro passo, sentindo o chão ranger sob os pés o mesmo som de quando corria ali quando criança, fugindo das broncas da mãe.
O silêncio o envolveu como um cobertor pesado. Na sala, os móveis estavam cobertos com lençóis brancos, parecendo fantasmas dormindo em pé. E mesmo assim, tudo parecia intacto. Como se ela fosse aparecer a qualquer momento, com o avental amarrado na cintura, chamando por ele com a voz firme e doce.
Seus olhos encontraram o pequeno porta-retrato na estante, empoeirado, mas ainda em pé. A mãe sorria na foto, com o cabelo preso e aquele olhar que enxergava mais do que dizia. Kael engoliu seco.
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