O som... não existia.
Neko abriu os olhos devagar, sentindo a cabeça latejar como se tivesse sido arrancado da realidade à força. Não havia teto. Não havia céu. Somente um vazio branco, eterno, onde o chão parecia feito de água, mas firme o suficiente para sustentar seu corpo.
Ele se apoiou com dificuldade, a mão afundando levemente naquela superfície líquida-luminosa. Um arrepio percorreu sua espinha. Não era frio — era medo.
Um medo antigo.
Instintivo.
Algo estava errado.
Ele tentou se levantar, mas seu corpo parecia mais pesado ali. Os movimentos estavam lentos, como se o próprio ar fosse denso. Manteve a cabeça baixa, os cabelos cobrindo parte do rosto, enquanto respirava fundo tentando entender onde estava.
E foi então que algo surgiu.
Na sua frente, o espaço se distorceu como um tecido sendo rasgado. Um ser começou a se formar — branco e preto, oscilando como fumaça sólida, sem forma definida. Suas bordas se quebravam como vidro, refazendo-se logo em seguida. Um rosto... ou o que parecia ser um rosto, girava em ângulos errados.
Neko congelou.
Tentou recuar, mas seus pés afundaram levemente no chão líquido, como se algo o estivesse segurando.
Tentou puxar, tentou gritar. Nada.
Seu braço direito começou a tremer e, diante de seus olhos aterrorizados, uma das mãos se deformou, tornando-se translúcida por um instante, como se estivesse sumindo da existência.
Neko — O... o que é você...? — disse ele com a voz embargada, tentando manter o controle.
A entidade não respondeu.
Apenas levantou uma das mãos, onde um buraco negro se formou, girando devagar.
A cada passo que dava, o mundo ao redor invertia de cor: o branco virava negro, o negro voltava a ser branco, como se a realidade estivesse sendo reescrita atrás de seus passos.
A criatura se aproximava.
Neko puxava o pé com desespero, mas o chão — ou água — o prendia como um imã arcano.
Ele sentia a pressão no peito crescer.
E então, o ser parou.
O buraco negro sumiu.
Seu corpo disforme se estabilizou por um instante, revelando dois olhos vazios e uma boca que não se movia, mas sussurrava direto dentro da mente de Neko, como uma presença invadindo seus pensamentos:
??? — Cadeado: liberado.
??? — Sistema: sincronizado.
??? — Confirmação de origem... aceita.
A voz continuava, sem emoção, profunda e dissonante:
??? — Você nasceu sem um Dom, Neko. Não por erro. Mas por proteção.
??? — Seu corpo... sua alma... não eram compatíveis com a Energia Primária deste mundo.
A criatura pairava à sua frente, a luz e sombra vibrando em sua pele:
??? — Em vez disso, você foi selado. Um cadeado ancestral te protegeu.
??? — Pois dentro de você, adormecia algo que nenhum dom poderia conter:
O Sistema de Crescimento Infinito.
As palavras ecoaram como um trovão no fundo da mente de Neko.
??? — Crescimento... infinito...? — sussurrou ele, incrédulo.
??? — Seu potencial não tem forma. Não tem limite.
??? — Por isso foi escondido.
??? — Por isso foi temido.
A entidade ergueu novamente a mão.
Um holograma surgiu no ar — linhas, números, símbolos desconhecidos — girando ao redor de Neko.
[ SISTEMA ATIVADO ]
[ NIVEL: 0 ]
[ STATUS: DESCONHECIDO ]
[ POTENCIAL: ??? ]
Neko engoliu seco, sem saber o que aquilo significava.
??? — Você é o primeiro de sua espécie, Neko.
??? — Um corpo sem dom... mas com acesso ao Código Base.
??? — A partir de agora... você não crescerá por talento. Crescerá por escolha.
A entidade então começou a se dissolver.
??? — Prepare-se. O Teste Inicial começará.
??? — Se sobreviver... o crescimento será seu.
??? — Se falhar... voltará ao esquecimento.
O mundo estremeceu.
O chão sob seus pés se fragmentou, revelando um abismo escuro.
E Neko caiu.
Ou pensou que caiu — já não sabia distinguir o que era físico e o que era mental.
Quando abriu os olhos novamente, estava deitado num chão áspero e rachado. O céu acima era de um tom escuro e apodrecido, coberto por nuvens pesadas que se moviam como se estivessem vivas. A névoa ao redor era espessa, sufocante. Tudo parecia... errado.
Ele se levantou devagar, olhando ao redor. Ruas quebradas, prédios derretidos pelo tempo, postes inclinados como se tivessem sido arrancados e replantados ao contrário. As cores do mundo estavam mortas — era como viver dentro de uma fotografia queimada.
"Estou de volta?" — pensou. Mas não sentia o cheiro do vento, nem o som familiar da cidade.
As vozes começaram.
Sussurros. Gritos abafados. Risadas distorcidas.
Eram como memórias quebradas, ecoando diretamente em sua mente.
Sem saber para onde ir, ele começou a andar. Cada passo produzia um som seco, como se pisasse em ossos. O caminho à frente parecia não ter fim, até que... ele viu.
O restaurante da sua família.
Ou o que sobrou dele.
Metade do prédio estava destruída, a outra pegava fogo lentamente, como se as chamas não tivessem pressa. As janelas estavam estilhaçadas, as portas pendendo das dobradiças.
Um sentimento quente explodiu dentro dele: esperança misturada com pânico.
Neko — Pai? Mãe? Jorin?! Nayel?! Lysa?! — gritou correndo em direção ao prédio em chamas.
A emoção falou mais alto que o medo.
Ao atravessar os escombros, tossindo com a fumaça, ele parou de repente.
Eles estavam ali.
Sentados à mesa como se nada tivesse acontecido: Jorin, Nayel e Lysa.
Neko — Vocês... estão bem! Que alívio... — disse Neko, com os olhos marejados.
Mas... algo não estava certo.
Quando ele se aproximou, as silhuetas se tornaram mais claras.
Os rostos estavam distorcidos.
Olhos demais. Sorrisos largos demais. Pele que parecia... derreter.
Eles se viraram em sincronia, encarando Neko com rostos que eram quase humanos, mas não o suficiente. Havia algo... monstruoso ali.
Algo profundamente errado.
Jorin — Neko... — disse Jorin com uma voz que reverberava em camadas — …você finalmente está crescendo?
Lysa — Veio se juntar a nós...? — sussurrou Lysa, com a cabeça inclinada em um ângulo impossível.
Nayel — Você nunca pertenceu à nossa família... — completou Nayel, abrindo lentamente um sorriso que se rasgava até as orelhas.
Neko recuou, o coração disparado.
O restaurante começou a se desfazer ao redor deles. As paredes choravam sangue escuro. O chão se partia como vidro rachado.
Ele caiu de joelhos, tomado por um pânico que há muito havia enterrado.
Neko — N-não... isso não é real... isso não pode ser...
[ ALERTA: DESAFIO INICIAL EM PROGRESSO ]
[ TESTE DE IDENTIDADE: "ENFRENTAR A RAIZ DO MEDO" ]
[ OBJETIVO: REJEITE A FALSIDADE. ACEITE SUA ESSÊNCIA. ]
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Atualizado até capítulo 34
Comments
Silva Everton
Mn, tá me prendendo, quebrando clichês e interessante demais. Continua!
2025-04-23
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