No morro, eu respiro

25 de abril — 21:10 | Comunidade do Cerro Azul, Zona Sul do RJ.

O som do batidão já dava pra ouvir da entrada da comunidade. Era funk no talo, grave tremendo o chão de terra batida, gente subindo e descendo, vendinha aberta, churrasquinho na brasa, cerveja gelada no isopor, e o cheiro da noite misturado com liberdade. Era ali que eu me sentia viva.

Eu e a Vick chegamos de Uber até a entrada e subimos a pé. Shortinho, top colado, maquiagem feita à pressa — tudo na vibe. A Vick? Já tava empolgada rindo e jogando o cabelo.

Vick: — Mano, cê tem certeza que vai conseguir disfarçar essa cara de noiva revoltada? 

Juju (rindo forçada): — Só preciso de umas doses e esqueço até meu sobrenome.

Chegamos no baile. O clima era outro. A favela vibrava, cheia de vida, cheia de gente com brilho no olhar — diferente daquela casa fria no Leblon. Larissa veio pulando no meio da galera.

Larissa: — Minhas criaaaaa! Até que enfim!

 

Juju: — Tu só me mete em furada, hein... 

Larissa: — Ah, para... essa furada vai ser a melhor da tua vida.

Ela puxou a gente pra parte mais animada do baile. A galera dançava sem vergonha, sem pressão, sem pose. E foi ali que vi ele: **LK**, o dono da quebrada, subindo de XT, todo no estilo. Camisa de marca, cordão pesando no pescoço, olhar cortante.

Larissa (no meu ouvido): — Avisa que é ela, hein... o LK já viu. 

Juju (rindo): — Tá maluca? Meu pai ia ter um treco se soubesse que eu tô no baile do cara mais falado da Rocinha.

Vick: — Isso é que é currículo bom!

A música mudou, e quando dei por mim, já tava dançando com a Vick. Rindo, bebendo, esquecendo da merda toda. A noite era nossa.

Eu já tinha ido em muita festa, mas nenhuma era como essa no alto da comunidade. Tinha algo no ar... a batida da música, a fumaça que dançava no ar, o jeito como as pessoas se olhavam — ali tudo era intenso. Verdadeiro. Quente.

Larissa: — Amiga, tu tá parecendo perdidona — disse me entregando um copo.

Juju: — Tô só observando — falei, encarando o movimento com um meio sorriso.

Ela olhou por cima do ombro e deu aquele sorrisinho safado.

Larissa: — Ó, tá vindo aí o LK.

Juju: — E o que tem?

Larissa: — O cara manda aqui. Literalmente. Dono da boca. E, dizem, dono dos corações das quengas também — ela soltou uma risadinha.

Antes de eu retrucar, ele já tava ali. Alto, presença forte, olhar direto. Usava um cordão grosso, camisa aberta e aquele ar de quem não precisa dizer muito pra ser respeitado. Os olhos dele pararam nos meus, como se tivessem me estudando.

LK: — Tu não é daqui, né? — ele soltou, num tom mais observador do que simpático.

Juju: — Perceptivo você, hein. — rebati, cruzando os braços.

LK: — Playboyzona… perdida ou curiosa?

Juju: — Nem uma coisa, nem outra. Só vim respirar um pouco de realidade.

Ele riu, mas não foi de deboche. Foi tipo quem se surpreendeu.

LK: — Tem coragem, isso eu reconheço. Mas aqui, coragem de mais pode virar problema.

Juju: — E você, é problema?

LK: — Eu sou o aviso.

A troca de olhares foi mais longa que deveria. Ele deu um passo pra perto. O clima esquentou — não de carinho, mas de provocação. Desafio. Vontade. Era como se a tensão entre a gente puxasse o ar.

Larissa percebeu o clima e desapareceu em meio a multidão.

Sem pedir licença, ele me puxou pela cintura. E antes que eu pensasse, ele colou os lábios nos meus.

Não teve romance, nem carinho. Teve intensidade. Desejo. Uma mistura de arrogância com vontade. Um beijo que mais parecia uma guerra de quem mandava mais. Ele queria mostrar domínio, e eu não ia ficar por baixo.

Quando nos afastamos, ele lambeu os lábios e soltou:

LK: — Gostei de você.

Juju: — Não se acostuma. Eu não sou de ninguém.

Ele sorriu, daquele jeito torto e perigoso.

LK: — Por isso mesmo, Juju. Por isso mesmo.

Ficamos em silêncio por alguns segundos. Ele me analisava. Parecia que via mais do que eu deixava mostrar.

LK: — Tá fugindo de quê, hein? — ele soltou, direto.

Juju: — De uma prisão. De um casamento arranjado com um otário mimado. Meus pais querem me vender como se eu fosse um objeto.

Ele acenou devagar, com aquele olhar de quem já tinha visto muita coisa.

LK: — Então por que não foge de verdade?

Juju: — Como assim?

LK: — Tô falando sério. Se tu quiser sumir por uns tempos… eu consigo.

Eu ri, meio nervosa.

Juju: — Vai me esconder no morro?

LK: — No morro, fora do morro, onde precisar. Gente como você, com coragem de falar na cara... merece pelo menos uma chance.

Juju: — E qual o seu interesse nisso?

LK: — Não gosto de gente presa. E... você me intriga. Pode ser útil. Pode ser perigosa. Pode ser as duas coisas.

Ele soltou um sorriso de canto e se afastou, deixando no ar aquele convite silencioso. Não era só fuga. Era o começo de algo maior.

E eu, pela primeira vez em muito tempo… fiquei tentada a aceitar.

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Comments

Claudia

Claudia

aceita sim!!! seria o que a maioria de nós faria se pudesse!!!...

2025-04-25

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