03

3—capítulo: Dois loucos 

O motor da moto tossiu uma última vez antes de se calar, deixando Jaque sozinha no silêncio da estrada deserta. Ela olhou para o painel e bufou ao confirmar o que já sabia: o tanque estava completamente vazio.

— Ah, vai se foder! — reclamou, chutando o descanso da moto e descendo dela com irritação.

O cenário ao redor era desolado, campos secos e árvores retorcidas se estendendo até onde a vista alcançava. Mas algo chamou sua atenção. Mais adiante, um prédio pequeno e velho surgia como uma miragem. Uma placa balançava precariamente com o vento, o letreiro quase apagado revelando: "Oficina do Won".

Jaque suspirou.

— Ótimo. Só espero que não seja um daqueles caipiras malucos.

Ela começou a caminhar em direção à oficina, os coturnos levantando poeira no chão seco. Ao se aproximar, percebeu que o lugar era tão caótico quanto parecia de longe. Ferramentas espalhadas pelo chão, pedaços de motor enferrujados empilhados de qualquer jeito e um cheiro de óleo impregnado no ar.

Quando entrou, o som de uma música animada tocando em um rádio velho a surpreendeu. Ela mal teve tempo de registrar os detalhes quando ouviu uma voz cantarolando junto com a música, mas de um jeito tão desafinado que a fez franzir a testa.

— Então, garota, você acha que vai fugir? Porque o Won vai te ajudar, mas primeiro vou te fazer rir! — A voz vinha do fundo da oficina, seguida de uma risada alta.

Jaque cruzou os braços, incrédula.

— Que porra é essa?

De trás de um carro desmontado, apareceu ele: um homem alto, vestindo um macacão de mecânico sujo de graxa. Ele usava um boné torto na cabeça, de onde escapavam fios de cabelo bagunçados. Seus olhos brilhavam com um misto de diversão e despreocupação, e o sorriso largo no rosto era tão sincero que parecia deslocado naquele lugar.

— Opa! — disse ele, limpando as mãos em um pano que estava pendurado no bolso do macacão. — Cliente nova? Ou só alguém perdida no meio do nada?

Jaque o encarou, tentando entender se ele estava falando sério ou só tirando sarro.

— Minha moto tá sem gasolina. Você tem ou tá só fazendo show?

Ele fingiu pensar, coçando o queixo com exagero.

— Hmm... gasolina eu tenho. Mas depende. Você sabe como funciona aqui na Oficina do Won?

— Não, e sinceramente, não tô com paciência pra descobrir. — Jaque respondeu, seca.

Ele ignorou o tom dela e abriu um sorriso ainda maior, estendendo as mãos teatralmente.

— Então deixa eu te explicar! Primeiro, você sorri. Porque ninguém entra na oficina do Won com essa cara de quem tá prestes a matar alguém. — Ele deu uma risada. — Mas pelo jeito, você já matou, né?

Jaque revirou os olhos, cruzando os braços.

— Olha, palhaço, eu só preciso de gasolina. Pode parar de enrolar.

Won deu uma gargalhada alta, inclinando-se para trás como se ela tivesse contado a melhor piada do dia.

— Ah, você é daquelas duronas, né? Beleza, beleza. Eu vou te ajudar... depois que você responder uma pergunta.

Ela suspirou, já sem paciência.

— Que pergunta?

Ele apontou para a moto parada lá fora, e depois para ela.

— Como é que uma garota tão pequena consegue andar numa moto dessas sem parecer uma formiguinha?

Jaque ficou em silêncio por alguns segundos, a boca entreaberta. Ela não sabia se ficava irritada ou se ria da audácia dele.

— Você é sempre assim ou só tá tentando me tirar do sério?

Won deu de ombros, ainda rindo.

— Um pouco dos dois. Mas sério, sua moto é incrível. Vou te ajudar, relaxa. Só tô tentando deixar o clima mais leve, porque, sabe como é, você parece uma tempestade ambulante.

Ele voltou para o balcão, pegou uma lata de gasolina e começou a balançá-la de forma exagerada, como se quisesse provocá-la.

— Prontinho, minha cliente especial! Vamos encher o tanque dessa fera.

Jaque o seguiu até a moto, ainda tentando entender o que estava acontecendo. Won falava sem parar, fazendo piadas sobre tudo ao redor: a moto, o tempo, até mesmo sobre como ele era o "mecânico mais bonito da região" e, claro, o único.

Ela observou enquanto ele enchia o tanque, percebendo que, por trás do jeito brincalhão, havia uma calma genuína nele. Won parecia não levar nada muito a sério, o que a irritava e, ao mesmo tempo, a intrigava.

— Prontinho! Agora só falta você me pagar. — Ele disse, piscando.

Jaque arqueou uma sobrancelha.

— E quanto custa?

Won deu de ombros, sorrindo de novo.

— Ah, só promete que vai voltar. Porque, sinceramente, acho que nunca vi alguém tão rabugenta e interessante ao mesmo tempo.

Jaque deu uma risada curta, sacudindo a cabeça.

— Você é um idiota.

— Idiota? Talvez. Mas aposto que tô te fazendo sorrir.

Ela não respondeu, mas havia um pequeno sorriso no canto dos lábios enquanto subia na moto. Won acenou para ela, ainda com o mesmo olhar brincalhão.

— Vai com cuidado, tempestade! A estrada pode ser traiçoeira, mas aposto que você é pior!

Jaque acelerou, deixando para trás a oficina e o mecânico mais estranho que já conhecera. Mas, enquanto atravessava a estrada, ela percebeu que aquele encontro inesperado ficaria marcado na sua mente mais do que ela gostaria de admitir.

Jaque acelerava pela estrada, o som do motor ecoando no vazio. Mas então, no horizonte, ela viu algo que fez seus olhos estreitarem: várias caminhonetes e carros vinham em sua direção. Ela percebeu, mesmo à distância, o brilho ameaçador de armas sendo preparadas.  

— Filhos da puta... — murmurou, cerrando os dentes.  

Ela imediatamente freou, girando a moto em um movimento ágil e acelerando de volta para a oficina de Won.  

Ao chegar, parou bruscamente e gritou:  

— Ei, mecânico! Você tem companhia.  

Won apareceu na porta, ainda com o mesmo sorriso brincalhão, mas arqueou uma sobrancelha ao ver o comboio de carros se aproximando.  

— Caramba, garota, você atrai problemas como ninguém, hein?  

— Não é problema meu, é deles. — Jaque respondeu, descendo da moto e entrando na oficina.  

Os carros pararam a poucos metros da entrada, e os homens começaram a descer, armados até os dentes. Sem perder tempo, eles abriram fogo, o som dos tiros explodindo no ar.  

Jaque se abaixou atrás de uma bancada, xingando.  

— Você não tem um porão ou algo do tipo? — gritou para Won, que estava atrás do balcão.  

Ele, em vez de responder, começou a rir.  

— Um porão? Isso seria muito clichê.  

Antes que ela pudesse xingá-lo de novo, Won puxou uma alavanca atrás do balcão, e uma pequena parede deslizou, revelando um arsenal escondido. Ele pegou uma submetralhadora e a jogou para Jaque.  

— Toma aí, durona! Vamos ver se você sabe usar.  

Jaque pegou a arma no ar, verificou o carregador e ergueu uma sobrancelha para ele.  

— Faz sentido agora. Uma oficina no meio do nada.  

Won piscou para ela, pegando uma MP5 para si mesmo.  

— Surpresa! Faz tempo que eu não brinco.  

Ele deu um salto por cima do balcão e, sem hesitar, começou a atirar pelos buracos da janela. Os tiros de sua MP5 ecoavam pela oficina, enquanto ele ria como se estivesse se divertindo no meio do caos.  

— Você é maluco. — Jaque murmurou, mas havia um pequeno sorriso em seu rosto.  

Ela se levantou da cobertura e abriu fogo, acertando um dos homens que tentava se aproximar.  

— Ah, você também sabe brincar! — Won gritou, rindo alto enquanto recarregava.  

— Cala a boca e atira! — Jaque respondeu, disparando mais uma rajada.  

Os homens do lado de fora continuavam avançando, mas cada vez que tentavam se aproximar, eram recebidos por uma chuva de balas vindas da dupla.  

— Então, garota, qual é a sua história? Por que tá sendo perseguida? — Won perguntou, atirando sem nem olhar para o alvo.  

— Eu queimei a porra da casa da minha família. — Jaque respondeu, recarregando a submetralhadora.  

Won soltou uma gargalhada tão alta que os homens do lado de fora podiam ouvir.  

— Que mulher incrível! Tá vendo? Eu sabia que você era especial.  

Jaque revirou os olhos, mas continuou atirando.  

Os homens começaram a recuar, percebendo que a dupla não era tão fácil de derrubar quanto pareciam. Won aproveitou o momento para sair correndo pela lateral da oficina, atirando e gritando:  

— Venham pegar o tio Won, seus desgraçados!  

Jaque, por um momento, pensou que ele era completamente insano. Mas, enquanto atirava, ela percebeu que nunca se divertiu tanto em uma batalha.  

— Você é o idiota mais sortudo que eu já conheci! — ela gritou, correndo atrás dele.  

Won deu uma piscada para ela, enquanto a dupla continuava a transformar o cenário em um verdadeiro campo de batalha.  

Os tiros continuavam a ecoar pela oficina, e o cheiro de pólvora misturava-se ao óleo queimado no ar. Jaque e Won disparavam com tudo o que tinham, mas os homens armados começaram a avançar em maior número. Eles quebraram as janelas e empurraram a porta, entrando com determinação, atirando contra qualquer coisa que se movesse.

Won, ainda com seu sorriso despreocupado, terminou de recarregar a MP5 e gritou para Jaque:

— Tá na hora de sermos espertos, durona! Essa briga não vai durar muito pra gente!

Jaque, de trás de uma bancada, gritou de volta:

— Não me diga o óbvio, gênio! Cadê o plano brilhante?

Ele soltou uma gargalhada, jogou uma granada de fumaça no meio do grupo que invadia a oficina e puxou Jaque pela mão.

— Confia no tio Won! Eu tenho uma saída secreta!

— Você é maluco. — ela disse, mas deixou-se ser puxada.

Os dois correram para os fundos da oficina, enquanto a granada soltava uma fumaça densa, atrapalhando a visão dos invasores. Won chutou uma porta metálica que dava para uma trilha escondida atrás do prédio.

— Vamos lá, garota! Fuga estilosa pelos campos!

— Campos? — Jaque repetiu, mas ao atravessar a porta, viu um caminho de terra cercado por flores selvagens, com o sol da manhã iluminando tudo.

Eles começaram a correr pelo campo, ouvindo os gritos dos homens armados tentando encontrá-los. Won ainda segurava sua MP5, mas olhou para Jaque com um sorriso animado.

— Tá sentindo? — ele perguntou, ofegante, enquanto corriam.

— Sentindo o quê? O cansaço? — ela respondeu, tentando ignorar o som de passos e tiros ao longe.

— A adrenalina diferente! Isso aqui não é só mais um tiroteio, é uma aventura, garota! — Ele riu alto, desviando de uma pedra e quase tropeçando.

Jaque olhou para ele, incrédula, mas não conseguiu evitar um sorriso. Havia algo no jeito despreocupado dele, misturado ao perigo ao redor, que fazia o sangue dela correr mais rápido.

— Você é o cara mais idiota e irritante que eu já conheci. — disse, ofegante, mas com um brilho diferente nos olhos.

Won piscou para ela.

— E você é a mulher mais incrível e assustadora que eu já vi! Um ótimo time, né?

Ela revirou os olhos, mas sua risada escapou antes que pudesse contê-la. Correndo entre as flores, sentindo o vento contra o rosto e o perigo logo atrás, Jaque sentiu algo que há muito não experimentava: liberdade.

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Comments

Rachel Vic

Rachel Vic

Ai ai esses jovens amam uma MP5, na minha epoca adolescente só podia ter no maximo um MP3

2025-02-12

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