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Giro, com muito estilo, bem educado, era os comentários que eu estava habituado a ouvir por onde quer que eu passasse, não que eu gostasse de os ouvir, porque na realidade esses comentários só me faziam lembrar que no passado eu tinha sido o patinho feio da turma. Todos tinham pena de mim, eu andava sempre sozinho e ficava feliz por qualquer migalha que me dessem, era assim a minha vida naquela altura, por isso quando Nani me pediu o meu contacto no final da festa eu senti um gosto agridoce na minha boca.

- Correu bem.- disse-me Mike ao final da noite\, estávamos os dois sentados cá fora nos degraus da entrada da minha casa com uma lata de cerveja na mão.

- Sim\, melhor do que o esperado. Ele pensa que eu ainda sou o mesmo.- comentei com ele\, soltei uma gargalhada e ele esboçou um sorriso.

- No final disto tudo como vai ser?

- Como assim?- bebi mais um gole de cerveja.

- Quem é que vai apanhar os cacos?

- Não sei\, acho que deviam estar mais preocupados com isso antes\, agora é tarde\, mas porquê? Preocupado?

- Não. Eu estou a pensar levar a tua mãe embora\, já falei com ela sobre isso\, mas ela diz que eu tenho de aqui estar para te ajudar\, por isso despacha isto Sky\, não suporto que ela esteja perto dele...

Olhei para ele, eu sabia que ele gostava da minha mãe, por isso ele fazia sempre tudo o que ela lhe pedia, talvez com ele ela conseguisse ser feliz, mas não era ele que ia conseguir apagar anos de maus tratos sofridos ás mãos do meu pai.

- Dá-me duas semanas Mike\, ou menos. Eu só tenho de fazer com que ele confie em mim!

Ele acenou com a cabeça e continuou a beber a cerveja, eu entrei dentro de casa, precisava de descansar, no dia seguinte eu ia aparecer na empresa onde Nani trabalhava, ele ia pensar que tinha sido uma coincidência, mas na realidade eu sabia tudo sobre ele.

Deitei-me na cama, mas tive medo de voltar a adormecer e sonhar com eles. Nos últimos tempos desde que eu tinha marcado a minha viagem de volta a casa que tinha todos os dias os mesmos pesadelos e isso fazia com que eu não conseguisse dormir. Agora, depois de encontrar Nani eu sabia que ia ser mais do mesmo, que com certeza ia sonhar com ele e eu não queria isso, mas o cansaço da viagem, da cerimónia, tudo estava a abater-se sobre mim e acabei por adormecer.

Eu estava de volta á piscina.

O pior é que eu via-me como se estivesse fora do meu corpo: um miúdo que era o meu eu mais jovem estava a ser arrastado pelos amigos do Nani, eles eram os séniores do nosso curso. Como todos os dias eles tinham-me pedido o meu dinheiro do almoço, mas eu disse que não, eles não estavam habituados a ouvir a palavra não. Quando dei por mim estavam eles a levar-me pelos cabelos de rastos pelo chão até á zona das piscinas, o Nani estava ali com eles, eu vi na cara dele que até para ele eles estavam a exagerar, mas mesmo assim ele não fez nada para me ajudar.

Quis gritar quando vi pela milionésima vez eles enfiarem a minha cabeça dentro da piscina, mas eu não tinha boca, a minha boca tinha desaparecido, e quando tentei correr as minhas pernas não se moveram, os meus pés estavam presos ao chão.

Vi mais uma vez o meu corpo começar a perder forças e um deles a atirar-me para a piscina e Nani sair dali a correr. Afundei-me na piscina, gritei, chorei, mas os meus pés não se mexiam e a minha boca continuava sem existir. Foi quando vi os miúdos novatos que sofriam tanto nas mãos deles como eu socorrerem-me, eu devia a minha vida a eles. Acordei lavado em suor, olhei á minha volta, era ainda de madrugada. Fui á casa de banho e passei o meu rosto por água, vi o meu reflexo no espelho. Eu só tinha de aguentar mais um pouco para sentir-me vingado, apenas isso.

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