Asa narrando:
Eu estava acordada, pesando na minha vida.
O cheiro do desinfetante e o som suave dos equipamentos médicos ao meu redor me lembravam que ainda estava em um hospital. Mas, dessa vez, o que me aguardava era diferente: a fisioterapia.
Ainda me sentindo um pouco perdida, olhei para o relógio na parede. Era hora de conhecer meu fisioterapeuta. Uma parte de mim estava apreensiva, não apenas pelo desafio físico que eu teria que enfrentar, mas também pela ideia de interagir com outra pessoa. Meu coração ainda estava frágil, um vidro quebrado que eu temia que qualquer movimento brusco pudesse estilhaçar novamente.
Quando ele entrou na sala, meu mundo interior deu um solavanco. Era como se o tempo tivesse parado por um instante. Ele era alto, com cabelos castanho-escuros que caíam de maneira despretensiosa sobre a testa. Seu sorriso era caloroso, e seus olhos, um tom profundo que parecia entender mais do que eu estava disposta a revelar. Havia algo estranhamente atraente nele, algo que me fez sentir um misto de curiosidade e pavor. Eu me lembrei das promessas que fiz a mim mesma: não me envolver, não me abrir para mais dor.
— Oi, Asa. Meu nome é Luke, e eu serei seu fisioterapeuta. — disse ele, estendendo a mão. Sua voz era suave e encorajadora, mas ao mesmo tempo havia uma firmeza que me fazia sentir que eu estava em boas mãos.
— Oi. — respondi, tentando esconder a inquietação que começava a borbulhar dentro de mim. Apertei sua mão, e a conexão foi instantânea, como se um fio invisível nos ligasse. Mas eu não podia me permitir pensar nisso. — Só quero me recuperar... — murmurei, desviando o olhar.
— É exatamente por isso que estou aqui. Vamos trabalhar juntos para fazer isso acontecer. Está pronta para começar? — Ele sorriu, e por um momento, vi um vislumbre de esperança. Mas logo a doutrinação interna veio à tona: eu não precisava de nada além da minha recuperação.
Enquanto ele me ajudava a mover os membros, a realidade do meu corpo inerte se tornava cada vez mais evidente. A fraqueza era esmagadora, e a frustração se acumulava em meu peito. Mas Luke estava lá, sempre encorajando cada pequeno progresso.
— Você está indo muito bem, Asa. Um passo de cada vez. — ele dizia, e eu tentava acreditar naquilo.
A cada sessão, eu me sentia mais à vontade com ele, embora uma parte de mim ainda estivesse em guarda. O jeito como ele me olhava, como se visse não apenas o meu corpo, mas também a minha alma, me deixava confusa. Eu não queria me abrir para ele, não queria arriscar me machucar novamente. Mais uma traição, mais uma desilusão, e eu não teria forças para me levantar.
— Vamos tentar mais uma vez. — ele sugeriu, enquanto eu tentava mover a perna. O suor escorria pela minha testa, e eu sentia a pressão crescendo no meu peito.
— Só mais uma vez. — repeti para mim mesma, enquanto fechava os olhos. E, apesar do medo, eu sabia que precisava continuar. Não por ele, mas por mim.
E assim, com cada movimento, eu estava não apenas reconstruindo meu corpo, mas também tentando juntar os pedaços do meu coração. Um dia de cada vez, eu dizia a mim mesma. Mas, enquanto a sessão terminava e Luke me ajudava a me erguer, uma pergunta ecoava na minha mente: até onde eu estaria disposta a ir para proteger o que ainda restava de mim?
[...]
Duas semanas. Para alguns, pode parecer um período curto, mas para mim, foram dias intermináveis de redescoberta e luta. Acordar do coma foi como abrir os olhos para um mundo em que eu não pertencia mais. Tudo estava diferente, as paredes do hospital, os rostos das pessoas que me cercavam, até mesmo o meu próprio corpo. Eu era uma estranha em minha própria vida.
Nos primeiros dias, tudo parecia um borrão. Lembro-me de flashes de luz, vozes distantes e a sensação de flutuar entre o sonho e a realidade.
Passei dias cercada por médicos, enfermeiros e, claro, Luke. Ele se tornou uma âncora em meio à tempestade. A cada sessão de fisioterapia, ele me guiava com paciência e firmeza, como se soubesse que eu precisava de mais do que apenas cuidados físicos... eu precisava de esperança.
As primeiras tentativas de me mover foram dolorosas. Meu corpo estava fraco, como se eu estivesse tentando levantar um peso inimaginável. Mas Luke estava sempre lá, incentivando-me a não desistir. "Um passo de cada vez, Asa. Você vai conseguir", ele dizia, e essas palavras ecoavam em minha mente, mesmo nos momentos em que eu sentia que nunca conseguiria avançar.
Eu me lembro de um dia específico, quando consegui mover a perna pela primeira vez. A sensação de conquista foi avassaladora. Eu ri e chorei ao mesmo tempo, e Luke sorriu para mim com orgulho. Naquele momento, percebi que estava começando a recuperar não apenas a força do meu corpo, mas também uma parte de mim mesma que estava destroçada, meu coração estava voltando a bater forte por alguém... eu deveria me preocupar.
Agora, enquanto me preparava para deixar o hospital, sentia um misto de alívio e ansiedade. No dia seguinte, eu teria alta médica, e a ideia de continuar as sessões de fisioterapia em casa era ao mesmo tempo reconfortante e assustadora. O hospital se tornara uma espécie de refúgio, uma bolha segura onde eu poderia me concentrar na minha recuperação. Mas a vida fora dessas paredes era um mistério, e eu me perguntava como seria enfrentar o mundo novamente.
A enfermeira entrou no meu quarto, interrompendo meus pensamentos.
— Asa, você recebe alta amanhã. Está feliz? — diz ela, meu coração disparou no peito.
Eu estava pronta? Eu não tinha certeza. Havia ainda tantas dúvidas pairando em minha mente.
— Sim, eu estou. — respondi, tentando soar confiante. Mas a verdade é que estava apreensiva. O que aconteceria quando eu deixasse o hospital? E quanto às sessões de fisioterapia em casa? Eu teria a mesma determinação que tinha quando estava sob a supervisão de Luke?
Ainda por cima, eu veria Alma e, até possivelmente, Max. Eu ainda, infelizmente, sabia que não estava pronta.
Naquela última noite, enquanto tentava dormir, minha mente estava agitada. Pensei em tudo o que tinha passado. As memórias do coma, a dificuldade de reconhecer meu próprio corpo, a luta para me levantar. Mas também pensei em Luke e em como ele havia sido uma luz em meio à escuridão. Ele não apenas me ajudou fisicamente, mas também me mostrou que eu ainda era capaz de lutar, de vencer.
Fechei os olhos, fazendo uma promessa silenciosa a mim mesma: eu não deixaria que o medo me paralisasse. Eu enfrentaria cada desafio de frente, um dia de cada vez. Amanhã seria um novo começo, e eu estava determinada a transformar essa nova fase em uma jornada de autodescoberta e cura.
Quando finalmente adormeci, uma leve sensação de esperança me envolveu. Eu estava prestes a deixar o hospital, mas isso não significava que eu estava sozinha. Havia uma vida pela frente, e eu estava prestes a descobrir como seria viver novamente.
[...]
A porta do hospital se fechou atrás de mim, e, pela primeira vez em dois anos, respirei o ar fresco da liberdade. A luz do sol brilhava intensamente, e eu senti cada raio como uma promessa de novos começos. Mas, ao mesmo tempo, um nó de ansiedade se formava no meu estômago. Eu não sabia exatamente o que me aguardava em casa.
O carro da minha mãe me levou até a casa onde cresci, e, à medida que nos aproximávamos, um turbilhão de emoções tomou conta de mim. Havia uma mistura de nostalgia e medo. Quando pisei na porta de casa com uma moleta em uma das mãos me ajudando a manter o equilíbrio, senti minha mãe segurar minha mão firmemente. Ela estava radiante, mas eu não conseguia retribuir da mesma forma. Havia algo sufocante na felicidade dela, algo que me fazia querer recuar.
Assim que entrei, minha irmã apareceu.
— Oi, Asa! Estou tão feliz que você está em casa! — ela exclamou, mas eu não consegui responder. Em vez disso, meu olhar se desviou para o sofá, onde eu vislumbrei meu ex-namorado, Max.
O mundo ao meu redor desabou.
Os fragmentos de memórias de quando ele ainda era meu começaram a se agitar na minha mente. E agora, aqui estava ele, ao lado da minha irmã, e um filho deles estava prestes a entrar em nossas vidas. O nó em meu estômago se transformou em um peso esmagador. Eu precisava sair dali.
— Eu... preciso de um momento. — murmurei, enquanto subia as escadas com pressa, mas com um pouco de dificuldade. Meu coração batia descompassado. Cheguei ao meu quarto e fechei a porta atrás de mim. O cheiro familiar trouxe uma onda de nostalgia, mas não era suficiente para me acalmar. Eu estava em um lugar que deveria ser seguro, mas, na verdade, me sentia mais vulnerável do que nunca.
Desesperada, desci novamente passando por Alma e Max, que estavam sentados no sofá e fui até minha mãe, que estava na cozinha.
— Mãe, eu não posso ficar aqui. — disse, minha voz tremendo. Ela me olhou, confusa.
— O que você quer dizer, Asa? Você acabou de voltar para casa! Estamos tão felizes em tê-la de volta. — ela respondeu, tentando me envolver em seu entusiasmo.
— Não! Você não entende. Eu preciso de distância deles. Isso... tudo isso é demais para mim. — A frustração se acumulava, e eu podia sentir as lágrimas se formando. — Eu vou me mudar para o apartamento do papai. Ele deixou para mim quando morreu, e eu preciso de um espaço só meu.
Meu pai era divorciado da minha mãe, morreu quando eu e Alma tínhamos apenas oito anos. Ele deixou diversas propriedades e dinheiro para mim e Alma. Eu herdei seu apartamento no centro da cidade, minha irmã outro apartamento em outro bairro.
Minha mãe hesitou, seu olhar passando de surpresa a preocupação.
— Asa, você realmente acha que isso é o que você precisa agora? Não seria melhor ficarmos juntas? Você não precisa enfrentar isso sozinha.
— Eu não posso ficar aqui e ver o que vocês se tornaram. Eu não posso lidar com isso agora. — A última frase saiu como um sussurro, mas tinha um peso colossal. Eu precisava de um lugar onde pudesse me reconstruir, onde as lembranças do meu passado não fossem sufocantes.
Ela suspirou, e eu vi a tristeza em seus olhos. Mas não havia como voltar atrás.
— Se é isso que você realmente quer, eu não posso impedir. Mas Asa, você ainda é parte da nossa família, não importa o que aconteceu.
— Eu sei, mãe. Mas preciso de tempo. Preciso de espaço. — Com isso, me virei e fui em direção ao meu quarto para arrumar minha mala.
Algum tempo depois eu ja estava pronta para ir embora. Enquanto eu fechava a porta atrás de mim, uma parte de mim desejava que tudo fosse diferente. Mas, por outro lado, sabia que precisava enfrentar meus demônios sozinha. O caminho à frente seria difícil, mas era o único que eu podia percorrer.
[...]
Depois de dois anos em coma, cada pequeno movimento ainda era um desafio. Levantei-me da poltrona, minhas pernas tremiam levemente enquanto eu tentava caminhar até a janela. O reflexo no vidro mostrava uma versão de mim que parecia estranha: um corpo que eu conhecia, mas que não respondia como eu esperava. A dor e a rigidez ainda eram companheiras constantes, mas a sensação de estar viva, de ter a chance de me mover novamente, era uma vitória.
Enquanto esperava Luke, respirei fundo e tentei focar. Ele sempre dizia que a mente precisava estar em sintonia com o corpo. Nunca pensei que reabilitar-me seria tão difícil, e o que antes era rotina agora parecia uma jornada épica. Naquele momento, eu só queria que ele chegasse logo.
Quando ouvi o toque da campainha, meu coração acelerou. Levantei-me, um pouco hesitante, e fui até a porta. Ao abri-la, Luke estava lá, com sua habitual expressão animada e uma bolsa cheia de equipamentos. Ele era uma presença reconfortante, sempre encorajando-me a dar mais um passo.
— Pronta para mais um dia de desafios? — ele brincou, entrando e colocando a bolsa no sofá.
— Sempre. — respondi, forçando um sorriso, mas havia um peso no meu peito que eu não conseguia ignorar.
Começamos a sessão, e eu me concentrei em cada movimento, cada alongamento, tentando afastar os pensamentos que me atormentavam. Mas Luke, sempre perceptivo, logo percebeu que algo não estava certo.
— Asa, você parece distante hoje. O que está acontecendo? — ele perguntou, enquanto me ajudava a equilibrar.
Eu hesitei. O que eu poderia dizer? Que a minha vida havia mudado drasticamente, que a pessoa que eu amava agora estava esperando um filho com a minha irmã? A ideia de abrir meu coração para ele era assustadora, mas ao mesmo tempo, havia algo reconfortante em sua presença.
— É só... — comecei, engolindo em seco. — Eu não sabia que ia ser tão difícil.
Luke me olhou com empatia.
— Você está fazendo progresso, Asa. Isso é o que importa. Mas eu sei que, além do corpo, a mente também precisa de um espaço para se curar.
Senti uma onda de vulnerabilidade. Decidi que talvez fosse hora de falar.
— O meu namorado, ex-namorado... ele ficou com a minha irmã. E agora... eles vão ter um filho. — A última palavra saiu como um sussurro, e a tristeza que eu tentava esconder se revelou em minha voz.
Luke parou por um momento, e a expressão em seu rosto era de compaixão.
— Isso é muito para lidar. Como você está se sentindo em relação a tudo isso?
Fechei os olhos por um instante, sentindo as lágrimas ameaçarem escapar.
— Eu me sinto traída, confusa... com medo de encarar a realidade.
Ele assentiu, compreendendo.
— É normal sentir-se assim. Você passou por uma experiência traumática, e agora, ao tentar se recuperar, tem que lidar com isso também. Não é justo.
As palavras dele ressoaram dentro de mim. Era verdade, não era justo. Mas, ao mesmo tempo, havia um certo alívio em compartilhar minha dor. Com Luke ali, eu me sentia um pouco mais forte, um pouco menos sozinha.
— Eu não sei como seguir em frente, — confessei.
— Um passo de cada vez, — ele disse, colocando a mão no meu ombro. — E lembre-se: você não precisa passar por isso sozinha. Estou aqui para ajudar em tudo que você precisar.
Aos poucos, eu começava a entender que a recuperação não era apenas física. Eu precisava curar meu coração também.
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Comments
Vania Benicio
Ainda bem que ela encontrou Luke,pois é uma pessoa muito determinada, alto astral, para que ela possa se restabelecer!
2024-12-19
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Fabiana Soares
esse Max ainda vai causar problemas
2024-12-18
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