O tempo parecia passar de maneira diferente à medida que os dias se arrastavam. Isabela se via cada vez mais dividida entre o que sentia por Ricardo e o medo do que essa sensação poderia se tornar. Ela havia se entregue a ele, ou ao menos em parte, e estava começando a perceber que as barreiras que ela tinha construído para se proteger de seus próprios sentimentos estavam desmoronando lentamente. Mas, por mais que o atrativo de sua presença fosse irresistível, uma sombra pairava sobre ela, algo que ela não conseguia identificar, mas que a fazia hesitar.
O vento da praia parecia mais forte do que o normal naquele dia, como se o próprio mar estivesse tentando sussurrar algo a ela. Isabela caminhava pela areia, sentindo a textura fina sob seus pés descalços, mas seus pensamentos estavam em outro lugar, longe daquele cenário que deveria ser relaxante. A presença de Ricardo, por mais reconfortante que fosse, ainda a deixava inquieta. Ele parecia sempre tão calmo, tão seguro de si, enquanto ela se sentia fragmentada, como se não soubesse mais quem realmente era.
No fundo, algo lhe dizia que ele não era o problema. O problema estava dentro dela. O peso de um amor passado, que ainda a perseguia, que ainda a prendia.
Ela havia se entregado a um amor que a destruiu. A traição que sofrera, o abandono de quem ela acreditava ser a sua alma gêmea, o parceiro com quem planejava um futuro, tudo isso havia marcado sua alma de forma indelével. Ela carregava o estigma da dor e da perda, e agora, ao se aproximar de Ricardo, não sabia se estava buscando a cura ou apenas a repetição do erro.
E, ainda assim, quando ele estava por perto, algo mudava. O ar parecia mais denso, os batimentos do seu coração mais rápidos, e a sensação de estar viva, intensamente viva, a envolvia. Era algo confuso, algo que ela não podia classificar, mas que ela sabia que era real.
Ricardo, por sua vez, parecia compreender o dilema interno de Isabela, mesmo sem palavras. Ele a observava de longe, mas suas ações falavam mais alto do que qualquer conversa. Ele estava lá, ao lado dela, sem pressioná-la, oferecendo sua companhia sem exigir respostas. Ele não forçava nada, apenas estava presente, e isso a fazia sentir uma inexplicável paz. Mas, ao mesmo tempo, essa paz também a assustava.
Em uma tarde, eles se encontraram novamente à beira-mar. Era uma cena quase repetitiva, mas desta vez havia algo mais. O olhar de Ricardo era intenso, como se ele soubesse que o momento tinha chegado. Ele se aproximou de Isabela com uma suavidade que contrastava com a tempestade interna que ela estava vivendo.
— Isabela, você tem algo dentro de si que precisa ser liberado, — disse ele, com a voz calma, mas firme. — Eu posso te ajudar, mas você precisa estar disposta a enfrentar o que está em seu coração.
Ela olhou para ele, surpresa com a clareza daquelas palavras. Por um momento, o som das ondas, o cheiro do mar, desapareceram, e tudo o que ela conseguia ouvir era o som de sua própria respiração, acelerada. Ela queria negar. Queria dizer que não precisava de ajuda, que estava tudo bem. Mas havia algo em seu peito, uma dor oculta, que se recusava a ser ignorada.
— Eu não sei se posso enfrentar isso, Ricardo, — disse ela, a voz baixa, quase inaudível. — Eu tenho medo. Medo de que, ao olhar para o passado, eu acabe me perdendo de novo.
Ricardo olhou profundamente em seus olhos, como se estivesse tentando enxergar até o fundo de sua alma. Ele não disse nada por um longo momento, apenas a observou, com uma expressão que transmitia paciência e compreensão.
— O que você tem dentro de si não pode ser enterrado para sempre, Isabela. Você vai sentir o peso disso a cada dia, até que decida enfrentá-lo. Mas eu vou estar aqui. Não importa o que aconteça. Você não está sozinha.
Aquelas palavras fizeram com que uma onda de emoções invadisse o peito de Isabela. Era difícil acreditar que alguém, depois de tudo o que ela havia passado, estivesse disposto a ficar ao seu lado sem esperar nada em troca. Ricardo não era como os outros. Ele não a julgava, não a forçava a se abrir, mas oferecia algo que ela nunca tinha tido: espaço. Espaço para ser quem ela era, sem a pressão de precisar ser alguém diferente, de esconder o que sentia.
Isabela fechou os olhos por um momento, sentindo a brisa fria no rosto. Era como se o mar estivesse a chamando para mergulhar mais fundo em seus próprios sentimentos. Como se a paisagem fosse um reflexo da sua alma, agitada e incerta. Ela não sabia o que fazer, não sabia se estava pronta para enfrentar o que o passado ainda tinha a oferecer.
Quando ela finalmente falou, sua voz tremia, mas era mais forte do que ela esperava.
— Eu me apaixonei por alguém que me destruiu. Ele mentiu para mim, me traiu, e eu não percebi. A dor que isso causou… eu nunca soube como lidar. Eu vivi com a dúvida, com a sensação de que não sabia mais em quem confiar, nem mesmo em mim mesma. Eu perdi a fé no amor, Ricardo. E, agora, não sei se consigo amar de novo.
Ricardo a observava em silêncio, o olhar fixo nela, como se estivesse absorvendo cada palavra. Ele não parecia surpreso, como se já tivesse intuição do que ela estava passando. E, mais do que isso, ele parecia entender. Ele não a pressou a continuar, mas ela sentiu uma necessidade de se abrir. Algo nele a fazia confiar, algo que ela não conseguia explicar.
— O amor, Isabela, não é algo que se apaga com uma ferida, — disse ele suavemente. — O amor verdadeiro não desaparece, ele se transforma. O que você sente por essa pessoa do passado ainda está aí, mas não precisa definir sua vida. O que você viveu foi real, e a dor é válida. Mas agora, o que você sente por mim também é real. Não podemos viver apenas à sombra do que passou.
Isabela olhou para ele, seus olhos marejados, e, pela primeira vez em muito tempo, sentiu que talvez fosse possível deixar o passado para trás. Talvez fosse possível perdoar a si mesma, e talvez, apenas talvez, fosse possível abrir seu coração novamente.
— Você acha que eu posso, Ricardo? — Perguntou ela, com a voz quase inaudível. — Você acha que eu posso amar de novo?
Ricardo sorriu levemente, mas havia algo profundamente sincero em seu sorriso, algo que fez o coração de Isabela bater mais rápido.
— Eu não acho. Eu sei. O amor não é sobre perfeição, Isabela. Ele é sobre escolha, sobre se permitir viver novamente, se permitir confiar. E eu estou aqui para te ajudar a fazer essa escolha, passo a passo. Eu não vou forçar nada. Tudo tem seu tempo. Mas eu vou estar ao seu lado, esperando, se você me deixar.
Isabela sentiu uma leveza em seu peito, algo que ela não sentia há muito tempo. As palavras de Ricardo a tocaram de uma forma que ela não poderia explicar. Havia algo em sua voz, algo na forma como ele a tratava, que a fazia sentir que, talvez, fosse possível dar uma chance ao que estava por vir. O medo ainda estava lá, como uma sombra, mas ela sabia que, com ele, poderia aprender a caminhar para fora dessa sombra.
Ela olhou para o mar mais uma vez, sentindo a areia fria em seus pés, e sentiu que, talvez, o amor não fosse uma sentença de dor, mas uma oportunidade para recomeçar. Um recomeço que ela ainda não compreendia, mas que, com Ricardo ao seu lado, parecia mais possível.
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Atualizado até capítulo 100
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